"Logo a gente te mata": as ameaças contra LGBTs ouvidas nessas eleições
Relatos de ameaças contra homossexuais têm circulado pelas redes sociais com força nos últimos dias. As vítimas indicam, em seus depoimentos, ligação entre as ofensas e o período das eleições.
O crime de ameaça tem pena prevista de um a seis meses de prisão. Quando há uma ofensa -- ou, na linguagem jurídica, injúria -- soma-se um a seis meses de detenção. E, caso seja considerada qualificada, quando ataca uma condição específica da pessoa, como ser homossexual, a pena sobe para um a três anos, segundo a advogada criminalista Priscila Pamela.
Leia, abaixo cinco depoimentos concedidos à Universa:
“Lésbica imunda, sua raça vai acabar”
A designer de animação Larissa Alveno, 24 anos, relata que, na segunda-feira (8), ao entrar no metrô, um homem parou na sua frente e gritou, apontando o dedo. “‘Lésbica imunda, sua raça vai acabar, vocês vão morrer’. Travei. Ainda eram 8h40, olhei para a cara dele, que terminou: ‘Bolsonaro presidente’. Algumas pessoas se aproximaram e começaram a questioná-lo, e ele foi embora. Ataques assim são comuns para nós LGBTs, mas, nos últimos dias, está pior.”
“Isso é adesivo de viado, a hora de vocês vai chegar, puta”
A antropóloga Luiza Lima, 29 anos, grudou dois adesivos em sua mochila: um deles com as cores do arco-íris, símbolo LGBT, para ir votar, no domingo (7). Um carro ao lado diminui a velocidade e começa a acompanhá-la. “O homem no carona disse: ‘Ei, isso é adesivo de viado, né? A hora de vocês vai chegar, puta'. Comecei a tremer. É uma ameaça real. Há uma certa satisfação por parte de eleitores em ver a expansão de discursos de ódio --como se a autorização à violência se confirmasse. É preocupante, mas espero que a visibilidade dessas agressões sensibilize as pessoas.”
“Olha o Bolsonaro aí, hein? Cuidado”
A profissional de educação física Mariana Batista, 27 anos, andava pela calçada quando notou dois homens encarando-a, na segunda-feira (8). “Quando passei por perto, disseram: ‘Olha o Bolsonaro aí, hein? Cuidado'. Começaram a rir. Foi muito simples, mas, na minha leitura, é assim que começa. Tenho medo disso se tornar rotineiro. Medo disso ser comum, de as pessoas realmente acharem que podem e devem fazer isso comigo ou com qualquer outra pessoa. Já tinha receio de andar com a minha noiva de mãos dadas, agora tenho mais. Parece que as pessoas estão sendo encorajadas a disseminar o que pensam, a fazerem o que acham que deve ser feito. Dizem que é brincadeira, mas não se brinca com a vida alheia.”
“Viado de merda, logo a gente pode te matar”
O terapeuta ocupacional Diego Celestino, 30 anos, andava pelas cercanias de uma avenida movimentada da zona oeste de São Paulo na segunda-feira (8) quando um homem trombou em seu ombro. “Ele disse: ‘Viado de merda! Logo a gente pode te matar’. Não tive reação. Já sinto medo há algum tempo, mas aumentou agora. Há uma sensação de insegurança e impotência."
“Lésbica safada, vai queimar na fogueira”
Há duas semanas, a arquiteta Mahayana Nava de Paiva, 32 anos, diz ter ouvido de dois homens dentro de um carro, que passaram por ela na rua: “Lésbica safada, quando Bolsonaro assumir vocês vão queimar na fogueira”. “Fiquei muito assustada, mas não tinha entendido que era para mim. Até perceber que só havia poucas pessoas perto, todos homens. Isso me causou espanto, revolta e medo. Sou heterossexual, mas essa nem é a questão. A questão é o medo.”
Pesquisa sobre homofobia
Para o antropólogo e doutorando da USP (Universidade de São Paulo), Lucas Bulgarelli, que tem uma pesquisa sobre a homofobia no Brasil, se um candidato à frente nas pesquisas apoia, ou apoiou, no passado, a homofobia em seu discurso, há eleitores que se sentem autorizados a fazerem o mesmo. “Colocar essa questão em termos eleitorais é criar legitimidade democrática. Dá até uma ideia de cidadania. Ofender um gay, para algumas pessoas, é uma efetivação da cidadania.”
Em sua pesquisa, Bulgarelli afirma que identificou basicamente dois tipos de ameaças. “A de matar gays para ‘limpar a sociedade’ e falas como ‘sua hora está chegando’”, afirma.
O candidato Jair Bolsonaro (PSL) disse, em 2011, em entrevista à revista “Playboy”: "Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí." No mesmo ano, afirmou, em entrevista a jornalistas na Câmara dos Deputados, que o PSOL era um partido de “pirocas”, que era “coisa de veados o que eles estavam fazendo”, e que “ninguém gosta de homossexual, a gente suporta”.
O candidato também já fez declarações afirmando não ser homofóbico. No sábado (6), véspera da eleição, em um vídeo ao vivo transmitido pelo Facebook, afirmou: “Vamos fazer um governo para todo mundo. Para os gays, e inclusive tem gay que é pai, tem gay que é mãe. É um trabalho para todos vocês".
Ele se pronunciou na terça (9) dizendo que lamenta as agressões. "Peço ao pessoal que não pratique isso", disse. "Mas não tenho controle sobre milhões de pessoas que me apoiam."
O que faço se for ameaçado?
Segundo a advogada criminalista Priscila Pamela, da Rede Feminista de Juristas, a orientação é de que, no momento da ameaça, a vítima peça ajuda a pessoas ao redor, para manter o agressor por perto, e ligue para o telefone de emergência da polícia do seu Estado (como 190, em São Paulo) afirmando que está sendo ameaçado. O encaminhamento será dado em uma delegacia. "É difícil, mas é a ação mais efetiva. Nessa situação, é possível acusar alguém diretamente pelo crime."
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