Poliamor pode virar união estável? Entidades divergem sobre tema na Justiça
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Entidades ligadas ao direito da família disputam na Justiça se cartórios podem ou não realizar contratos de união estável para famílias poliafetivas, com relacionamento entre três ou mais pessoas.
O assunto começou a ser votado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no dia 24 de abril. O debate, interrompido por um pedido de vista do Ministério Público, será retomado na próxima terça (8). Assim como fora do júri, a votação expôs diferentes visões sobre o conceito de família.
Contrária à união estável de poliafetivos, a Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), formada por advogados e juristas e autora do pedido ao tribunal, usou como base três uniões poliafetivas formalizadas entre 2012 e 2017 no Rio de Janeiro e em São Paulo.
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Entre os argumentos, os membros da associação dizem que a união entre casais poliafetivos seria inconstitucional, uma vez que a Constituição ou Código Civil só entendem "união estável como casal aquele que é formado por homem e mulher e, desde a decisão do Supremo Tribunal Federal em 2011, entre pessoas do mesmo sexo. Além de possíveis problemas jurídicos e de bens, a ADFAS também acha que a poligamia vai contra os “bons costumes” da sociedade brasileira.
Em contrapartida, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), também formado por advogados de família, defende que o estado não deve intervir em relações afetivas entre indivíduos. Para a associação, a união estável seria uma maneira de reconhecer os direitos desse novo modelo familiar. O instituto também diz ter levado uma contra-argumentação ao CNJ em relação ao tema.
Representantes das instituições trocam acusações
Presidente nacional do IBDFAM, o doutor em Direito pela UFPR (Universidade Federal do Paraná) Rodrigo da Cunha Pereira avalia que a proibição parte de uma visão “ultraconservadora”. “A grande questão, que incomoda, é que a monogamia está em cheque. Por que o estado tem que interferir nisso? O Direito sempre foi dando legitimidade a relações que já existem, porque as escrituras não criam essa união, elas apenas dizem que elas existem”, diz.
Já a presidente da ADFAS, a doutora em Direito Civil pela USP Regina Beatriz Tavares da Silva afirma que a união poliafetiva, diferentemente da união homoafetiva, não é aceita na sociedade. “Os casais homoafetivos, dentro do princípio monogâmico, perante a legislação, entidades públicas e privadas, passaram a ser parte dos costumes”, defende. “O Direito tem que acompanhar os bons costumes.”
Segundo ela, a monogamia é a norma dos relacionamentos de países com altos índices de desenvolvimento. “Os piores índices de desenvolvimento humano estão onde há a poligamia”, citando tribos indígenas, países da África e do Oriente Médio. Segundo a advogada, os povos destas regiões não são desenvolvidos como os “Estados Unidos, Canadá, China e Rússia”, onde ela afirma ser norma a monogamia.
A presidente também expressou preocupação na partilha de pensões previdenciárias e divisão de contrato em associações. Já Rodrigo rebateu as afirmações, dizendo que a divisão de bens e direitos poderiam ser resolvidos com o auxílio de um advogado. “O instrumento [da união estável] é de inclusão”.
Um documento da IBDFAM, que será enviado ao CNJ a favor da firma da união poliafetiva, foi obtido com exclusividade por Universa. No texto, a associação conclui que a proibição a cartórios de realizarem reconhecimento jurídico de poliafetivos “afrontaria os princípios da liberdade, igualdade, não intervenção estatal na vida privada” e de “pluralidade das formas constituídas de família”.
Na votação da última terça (24), o Conselho Nacional de Justiça não chegou a um consenso. O debate ressoou o argumento das duas associações
Em nome do Ministério Público, o subprocurador-geral da República, Aurélio Virgílio, defendeu que os cartórios podem reconhecer a união poliafetiva, “desde que seja a vontade das pessoas”.
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Aurélio afirmou que o ‘'conceito de família evoluiu’, e que proibir o tabelião de firmar o contrato de união estável seria semelhante a recusa em aceitar casais homoafetivos no passado. “O poliamor não é novo na história, desde a antiguidade se pratica, talvez com bem menos dose de hipocrisia do que como se comenta hoje em dia”, afirmou.
O conselheiro João Otávio de Noronha, relator da matéria e corregedor-geral de Justiça, votou a favor do pedido feito pela Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), pedindo a proibição das uniões estáveis poliafetivas.
“O conceito constitucional de família, o conceito histórico e sociológico, sempre se deu com base na monogamia”, argumentou. O ministro também afirmou que “ninguém é obrigado a conviver com tolerância de atos cuja reprovação social é intensa”. “E aqui ainda há intenso juízo de reprovação social. Sem querer ser moralista, estou dizendo o que vejo na sociedade”, relatou. Após o voto, o representante do MP pediu vista e o julgamento foi interrompido.
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