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Curving é o novo ghosting. Entenda essa tendência lixo da paquera digital

Colunista do UOL

19/10/2020 04h00

Como vocês analisariam a seguinte situação: meu celular apita. É uma mensagem de um boy com quem eu tenho falado há meses e já saí uma vez. Tinha mandado uma mensagem para ele NOVE DIAS ANTES propondo um jantarzito aqui em casa (iludida que sou, já tinha até comprado um peixe que obviamente apodreceu porque eu, trouxa, não quis fazer pra mim achando que ele ia aparecer a tempo). Ele pediu mil desculpas, disse que teve uns pepinos no trabalho, na família, mas que ama peixe e quer marcar dia desses. Nada de sugestão de datas, apenas um giphy fofinho pra finalizar a mensagem.

Se você é solteira otimista como eu vai pensar : "ah, tempos difíceis de isolamento social, tá todo mundo oscilando mesmo". Mas trago verdades duras: os tais papos rarefeitos não são efeitos colaterais dos nossos amores líquidos e gasosos, eles podem ser indícios do mais novo golpe da paquera contemporânea o CURVING. Pois é, essa é uma espécie de primo do ghosting, com toques de requinte, bom-mocismo e manipulação. Preparem-se.

Se você é solteiro, assim como eu, não existe a menor possibilidade de ter passado incólume pelo famoso ghosting. Já perdi as contas de quantas vezes achei que o papo estava bem engatado - daqueles que a pessoa já joga no ar a sugestão do bar que vocês podem ir juntos no fim de semana - e, de repente, o crush simplesmente desaparece na nuvem de fumaça. Não manda mais mensagem, visualiza e não responde e, em alguns casos, simplesmente dá unmatch no aplicativo, e bloqueia seu contato.

Dá raiva, mini vontade de fazer boneco de vudu, mas esse golpe é tão clássico que não perco mais minhas noites de sono pensando no motivo do cara ter desaparecido. Até porque a verdade é dura e simples: ele não quis mais sair comigo e ponto. Ok, vida que segue. Mas, e quando a pessoa se mantém presente numa frequência mais ou menos fixa, é minimamente fofa e não faz exatamente nenhum movimento pra te ver ou aproximar a relação? Bem-vindes ao curving!

Será que você é um "curver"?

Fiquei chocada quando descobri essa nova modalidade e mais chocada ainda por me descobrir uma "curver". Eu ali pesquisando comportamento e de repente a carapuça caiu como uma luva. Entrei pro rol das sub-modalidades de crush lixo. Será que você também tá nesse banco dos réus enroladores como eu ou tem sido enrolada achando que a falta de encontros é culpa de desencontro de agenda?

Catalogado pela primeira vez por Brittany Cox (amo que os gringos catalogam os golpes amorosos) podemos dizer que o curving é a cozinhada clássica institucionalizada:

1. Fuso horário desajustado

Os "curvers" são aqueles que até respondem suas mensagens, mas sempre com esse atraso de dias ou muitas, muitas horas. Nas respostas rola um misto de desculpinhas fofas justificando vagamente o longo silêncio por conta de "pepinos da vida", e respostas secas e objetivas para as perguntas que você fez na mensagem. Afinal, o curver é educado e não vai te deixar sem resposta jamais (olha eu já me defendendo...). Mas também não vai arriscar alongar muito o papinho.

2. Reativo sempre, proativo jamais

Se você abrir seu histórico de whatsapp das mensagens com o crush curver vai perceber que as conversas sempre são iniciadas por você. Os curvers raramente propõe papos novos ou fazem perguntas mais profundas ou complexas, até porque isso vai abrir espaço pra mais intimidade, mais aproximação e os curvers ainda não têm certeza se estão a fim disso ou não. Parece que rola uma matemática do mínimo esforço necessário, e eles (nós né, já que me incluo nessa turma) mandam mensagens apenas o suficiente para não deixar a história morrer, mas jamais o necessário para fazer ela engatar.

3. Vamos marcar de combinar

Se você manda uma mensagem à la "saudades de você" ou "topa um drink essa semana?" o curver jamais vai dizer que não pode ou que não quer. Ele é aquele que fala "claro, vamos combinar sim, saudades também". Mas dia, horário e local que é bom? Nada! E se você fizer o movimento propondo um bloqueio de agenda no google calendar ele vai mudar de assunto ou voltar ao ponto 1 e demorar seis dias pra te responder... Aí a data proposta já passou (o peixe na geladeira já fedeu) e recomeça a cozinhada.

Diz se o curving não é o retrato do combo da cordialidade com a malandragem e o fogo no rabo dos brasileiros? Pode ter sido uma americana que definiu o termo, mas me arrisco a dizer que devemos estar no topo da lista desses novos golpistas, não acham?

O medo do climão justifica o curving ou é desculpinha?

Comecei a reparar que faço muito curving nessas relações que ainda estão nesse começo meio enrolado num clima mais digital do que encontros reais. Parece que ainda não existe uma relação estabelecida para que role uma DR e confesso que também tenho medo de jogar a real de "não tá rolando" e gerar um climão pesado.

Sabe quando os papos dão uma acelerada, você se vê trocando mensagem quase todo dia com a pessoa e de repente rola um "hum, acho que não queria estar tão engatada assim" ou "ai, dei um tempo para ver se rolavam borboletas no estômago, mas até agora nada...". Nessas horas eu começo a demorar mais para responder, a encolher as linhas das mensagens, abandonar os áudios e banir os emojis pra ver se a pessoa saca que eu estou desacelerando e que isso é sinal de que estou menos interessada. O problema é que muitas vezes os caras não sacam isso e seguem mandando mensagens. E eu, mesmo que oito dias depois, sigo respondendo. Até hoje achava que eles não estavam querendo perceber o que estava rolando. Agora caiu a ficha: eu é que estava sendo golpista.

O apego à imagem de boa moça

Sou super partidária da responsabilidade afetiva e detesto quem some na nuvem de fumaça, mas a verdade é que rola uma vista grossa: a gente acha que se manter respondendo mensagens de quem a gente não está tão a fim nos torna educados e nos mantém no protocolo de pessoas legais. A verdade porém, é que sabemos que estamos alimentando falsas esperanças no outro através dessas portas abertas, quando no fundo só estamos querendo "guardar caixão", como diriam as brincadeiras infantis.

O tal "xixi no poste"

Como a gente não tem certeza de que quer dar um próximo passo com a pessoa, mas também não tem certeza de que não vale a pena tentar, ficamos mantendo esse jogo do mínimo contato necessário pra não sair perdendo. É como se a lógica do "antes um pássaro na mão do que dois voando" comandasse cada desculpinha que a gente manda por WhatsApp.

Só que a sacanagem é: como nunca fazemos o tal movimento de aproximação do crush que estamos enrolando, muito provavelmente essa história nunca vai vingar. Ou seja, estamos cozinhando a pessoa enquanto esperamos que apareça um próximo match incrível que nos dê frio na barriga e vontade de responder com audião em menos de 15 minutos depois de visualizar a mensagem. Estamos sendo sacanas. Sim ou com certeza?

Eu, que enchia a boca pra falar mal dos crushes lixos que fazem ghosting, agora me comprometo a rever essas minhas cozinhadas de curves e prometo jogar limpo e colocar pontos finais, mesmo nas relações líquidas.

É claro que seu crush pode estar muito ocupado com o trabalho, com a família ou com a faxina de casa pra conseguir parar 5 minutos e responder sua mensagem. Ou não né? Se você está na dúvida se esse golpe está sendo aplicado em você, abra o histórico do WhatsApp e faz um tira-teima. Em vez de se apegar ao fato da pessoa ainda estar respondendo, repara NO QUE ela está respondendo. Se ela não puxar papo nem propuser encontro de verdade, é golpe. Manda ela pro rehab dos curvers como eu e parte pra alguém que não demore nove dias pra te responder duas linhas. É o mínimo, não acha?

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