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Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

'Burras', não! Vítimas de 'golpista do Tinder' são, na verdade, corajosas

"O Golpista do Tinder": documentário sobre os crimes de Shimon Hayut estreia na Netflix - Divulgação
'O Golpista do Tinder': documentário sobre os crimes de Shimon Hayut estreia na Netflix Imagem: Divulgação

Colunista de Universa

04/02/2022 04h00

Elas são inteligentes, lindas e corajosas. E caíram em um golpe de um homem que dedica a vida a roubar mulheres e as explorar aplicando o chamado "golpe do amor", o crime cruel que consiste em fazer uma mulher se apaixonar e depois roubá-la.

A história chocante do golpista Shimon Hayut é contada no documentário "O golpista do Tinder", que estreou essa semana na Netflix e nos deixa sem piscar e aflitas até o final.

Muita coisa ali assusta. Como um homem, pode viver como um playboy milionário com o dinheiro de mulheres em quem dá golpe e nem se sentir culpado por isso? Como um homem consegue aplicar golpes com tantos detalhes e tão convincentes? E, claro, como mulheres inteligentes caem nisso?

Essas perguntas não são respondidas no filme, mas algumas pistas estão lá.

Shimon Hayut, que se apresentava como um milionário russo chamado "Simon Liev", dava um golpe sempre parecido. Aparecia para mulheres que conhecia no Tinder como um milionário e um cara interessante, amoroso. E provava isso. Ele, por exemplo, aparecia do nada na sua cidade só para jantar com você no melhor hotel. Ou te convidava para uma viagem de jatinho, onde era tratado como um rei. E, claro, se declarava todos os dias e convencia as mulheres de que realmente estava apaixonado por elas.

Até que um dia mandava mensagens pedindo socorro, dizia estar sendo perseguido por inimigos e falava que seus cartões estavam bloqueados. A partir daí, passava a extorqui-las. Elas acreditavam, afinal, tinham visto que ele era muito rico.

Resultado: as mulheres que corajosamente falam sobre o caso no filme não só gastam todo o limite de seus cartões, como fazem empréstimos. Uma delas diz ter feito uma dívida de 250 mil dólares. Outra, todas as economias que tinha para comprar uma casa.

Mas como?

Não, elas não são bobas. Elas checaram toda a história que ele contava no Google, pesquisaram e se prepararam para os encontros. O sujeito que é um criminoso profissional, capaz de criar planos perfeitos. Em uma das histórias, ele apresenta a ex e mãe de sua filha para a nova vítima. A criança está presente e ele se mostra ser um ótimo pai. A suposta mãe da criança confirma que ele é ótimo. Como desconfiar?

O cara é tão profissional no banditismo que pensa até nesses detalhes. Sim, se uma ex falar que um cara com quem estamos saindo é um bom pai, vamos acreditar que ele é um cara legal. Por que não acreditaríamos?

Vítimas desse tipo de golpe são comumente vistas como bobas, carentes, fáceis de enganar. Bem, isso seria o mesmo que chamar o responsável pela segurança de um banco de burro porque ele não conseguiu impedir que o banco fosse roubado.

Os caras são profissionais, bandidos perigosos. As mulheres são vítimas deles e não devem, além de tudo que já passaram, serem culpabilizadas pelo crime que sofreram.

No documentário, três vítimas mostram a cara e contam suas histórias com franqueza e coragem. Uma delas chega a comentar que quando as primeiras matérias sobre o caso saíram, ela foi detonada e chamada de burra e de interesseira, Epa, o interesseiro é o homem que roubou mais de 10 milhões de mulheres!

É preciso coragem para denunciar um criminoso desses. E mais ainda para se unir com outras para tentar desmascará-lo e assim evitar que outras mulheres sejam vítimas do mesmo golpe.

A união de mulheres realmente gera coisas incríveis. O filme mostra isso e também ajuda a deixar claro que mulheres que caem no golpe do amor não são culpadas (sim, é assim que elas são tratadas) mas VÍTIMAS de criminosos perigosos.

Qualquer uma de nós poderia ser vítima também.

E isso o que torna o filme ainda mais assustador.