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Ana Canosa

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Jovens voltam a casar mais cedo no Brasil. Estamos mais conservadores?

91% dos brasileiros entrevistados de até 26 anos acreditam em amor para a vida toda - Pollyana Ventura/Getty Images
91% dos brasileiros entrevistados de até 26 anos acreditam em amor para a vida toda Imagem: Pollyana Ventura/Getty Images

Colunista de Universa

04/05/2021 04h00

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O Brasil é o país onde as pessoas se casam mais cedo. E não são poucas, viu? Com um total de 56% dos noivos abaixo de 26 anos, em comparação com 15% em média dos demais países europeus, como França, Itália e Espanha."

Esses são dados de uma pesquisa com noivos de diferentes faixas etárias, feita pelo grupo The Knot WorldWide em seus principais mercados: Espanha, Itália, França, México e Brasil, apontou diferenças significativas entre os millenials, nascidos no começo da década de 1980 (atualmente com 35-40 anos) e a geração Z, que chega logo após, entre 1995 e 2015 (abaixo dos 24 anos).

Os brasileiros pesquisados têm um perfil mais conservador, ficam noivos mais cedo, não querem conviver antes do casamento e 11% deles se casam por motivos religiosos. 91% dos entrevistados de até 26 anos acreditam em amor para a vida toda, enquanto os millenials responderam mais o famoso: "Talvez, quem sabe".

Como a pesquisa não foi realizada com a população geral, mas com noivos que estão preparando suas festas de casamento, não é possível indicar que todos(as) os(as) jovens brasileiros(as) tenham esse perfil. Além disso, nós só podemos entender a juventude no plural: dentro de uma mesma geração estão múltiplas juventudes.

Mas em se tratando de comportamento afetivo-sexual, é interessante perceber que, independentemente da geração, os(as) jovens são aqueles(as) que respondem às crises do mundo adulto. Quando alguém faz uma reclamação sobre o comportamento sexual dos adolescentes e jovens - como se eles estivessem inventando a roda -, eu faço questão de afirmar que eles só estão tentando resolver dilemas da geração anterior.

Filhos de pais separados, eles deram outro sentido ao amor

Devemos considerar que os Millenials começaram a compreender as relações afetivas na transição de um século para outro, marcado pela desconstrução de crenças sobre o amor romântico. Muitos acompanharam de perto o divórcio dos pais e mães; muitos - motivados por desigualdade de gênero e infidelidade conjugal - testemunharam a saída do armário de parentes e amigos e a ascensão da autonomia feminina.

Portanto, valorizar o trabalho e não apostar todas as fichas na relação amorosa nem na maternidade é uma resposta aos dilemas que observaram nas suas famílias de origem.

Enquanto a geração anterior (X - a galera de 50), passou a questionar o casamento, os millenials concretizaram modelos de maior autonomia, começaram a experimentar o sexo casual e lançaram dúvidas sobre a monogamia, deixando um "legado" para a geração Z, que cresce num contexto de maior liberdade sexual, em que as relações casuais são a grande marca.

Esses nativos digitais (Z) chegam no mundo globalizado, com valores muito distintos e uma sensação de pertencimento social bastante fragilizada. Embora valorizem compartilhar o trabalho, têm pressa e dificuldade de lidar com críticas e hierarquia. Para essa geração, relações não-monogâmicas, identidades não-binárias, orientação sexual fluída, nada é tão constante que precise ser nomeado.

Dizem que é difícil escolher diante de muitas possibilidades, além do fato de que, enraizar-se em solo movediço, significa correr o risco de ser solitário.

Enquanto uma parte das nossas juventudes usufrui de um contexto mais livre, outra parte não dá conta disso sozinha. Se há os que sentem menor necessidade de comprometer-se com algo ou alguém, para outros, apoiar-se na construção amorosa com outra pessoa, já tão cedo na vida, pode fazer sentido.

Talvez esses dados possam ajudar a compreender, numa perspectiva mais ampla, o resultado da pesquisa da The Knot World Wide e, o mais importante, a não superestimá-lo.

Errata: este conteúdo foi atualizado

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL