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TST pode reconhecer vínculo de emprego de motorista de Uber; o que muda?

Motoristas da Uber rejeitam vínculo, diz pesquisa - Jackson David/Pixabay
Motoristas da Uber rejeitam vínculo, diz pesquisa Imagem: Jackson David/Pixabay

Abinoan Santiago

Colaboração para Tilt, em Florianópolis

17/12/2021 14h22Atualizada em 17/12/2021 16h25

A terceira turma do TST (Tribunal Superior do Trabalho) está avançado no processo de reconhecer vínculo empregatício entre motoristas e a Uber. Ela tem dois dos três votos favoráveis a essa validação, formando assim a maioria.

O julgamento, contudo, foi paralisado na quarta-feira (15) após o ministro Alexandre Belmonte pedir vista, ou seja, mais prazo para dar o seu posicionamento. Caso se confirme, será a primeira turma do TST que vota para que motoristas sejam considerados funcionários da Uber.

Mas o que mudaria na prática?

A discussão sobre o tema não é de hoje. Processos na Justiça brasileira ainda possuem percepções diferentes sobre reconhecer ou não o vínculo empregatício dos condutores.

Os motoristas são considerados pela Uber (e outras plataformas do setor) como profissionais parceiros e autônomos. Neste caso, eles podem escolher o horário de trabalho e se desejam aceitar as viagens pelo aplicativo.

Uma vez que a relação de trabalho aconteça, os condutores passariam a ter acesso a benefícios trabalhistas e direitos, como férias, décimo terceiro salário, auxílio doença e INSS.

Em abril deste ano, por exemplo, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, em Campinas, acolheu um parecer do MPT (Ministério Público do Trabalho) e reconheceu a relação trabalhista de um motorista com a Uber.

No caso, o condutor prestou serviços por meio do aplicativo durante mais de um ano. Em resposta, a Uber afirmou que iria recorrer da decisão.

Um mês antes, porém, a 17ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, sediado em São Paulo, derrubou uma sentença que havia condenado a Uber a pagar indenização de R$ 14 mil a um motorista, que solicitou o vínculo de emprego e o pagamento de verbas rescisórias, horas extras e recolhimentos previdenciários.

Sobre posicionamento parcial do TST, a Uber diz que "irá aguardar o voto do ministro Alexandre Belmonte para se manifestar, mas no momento esclarece que os votos proferidos pelos ministros Mauricio Godinho e Alberto Bresciani, da 3ª Turma do TST, representam entendimento isolado e contrário ao de todos os cinco processos julgados no próprio Tribunal —o mais recente deles no mês passado".

"Nos votos, aparentemente, as provas produzidas no processo foram desconsideradas e os ministros basearam as decisões exclusivamente em concepções ideológicas sobre o modelo de funcionamento da Uber e sobre a atividade exercida pelos motoristas parceiros no Brasil", considera.

E o que os motoristas gostariam?

Uma pesquisa encomendada pela Uber e realizada pelo pelo Datafolha nesta semana indica que alguns motoristas não desejam ser reconhecidos como funcionários da empresa. Contudo, eles gostariam de ter mais direitos trabalhistas.

62% dos condutores cadastrados na plataforma não querem o registro formal na Uber, frente aos 27% favoráveis ao vínculo. Já 11% não soube responder a essa pergunta.

Os dados são resultantes de 2.431 entrevistas realizadas entre 13 de agosto a 20 de setembro de 2021, sendo 1.583 com motoristas (65%) e 848 com entregadores (35%).

Por que eles rejeitam o registro formal?

Menos burocracia, autonomia de horário e dispensa de responder a um chefe são os principais motivos, segundo o estudo do Datafolha.

  • 87% justificam o fácil acesso ao trabalho, podendo apenas se cadastrar no app;
  • 81% apontam a possibilidade de flexibilidade no horário;
  • 81% dos motoristas dizem que sempre há corrida disponível;
  • 79% gostam de "ser o próprio chefe".

Apesar desses números, 62% consideram que aceitariam um emprego fixo, porém, condicionado ao rendimento maior ao que recebe como colaborador na Uber. Os motoristas apontam que seria necessário o novo trabalho possibilitar uma renda 40% maior, enquanto os entregadores apontam 50%.

A faixa de renda mensal atual mais citada pelos motoristas é de R$ 3.301 a R$ 5.500, com 25%. Por outro lado, 27% dos entregadores apontaram entre R$ 2.201 a R$ 3.300 como a principal no fim do mês.

Trabalhadores querem mais direitos

Ao mesmo tempo, os motoristas e entregadores apontam na pesquisa a necessidade de ter mais direitos, como cobertura da Previdência Social. 43% dos entrevistados dizem não contribuir com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), mesmo com a possibilidade através do MEI (Micro Empreendedor Individual) ou por contribuição individual mensal.

Segundo o Datafolha, 77% concordam que deveriam contribuir para a previdência para acessar benefícios, como auxílio doença. Além disso, 63% manifestam interesse de pagar 5% dos seus ganhos, enquanto 78% apenas 2,5%.

Já 75% dos entrevistados dizem que seria mais fácil fazer a contribuição se a plataforma já recolhesse o percentual automaticamente para dar mais segurança em imprevistos, pois 71% temem ficar sem qualquer auxílio em caso de doença, por exemplo.

Sobre este item da pesquisa, o diretor de políticas públicas da Uber no Brasil, Ricardo Leite Ribeiro, comenta, em nota, que a Previdência Social precisa criar mecanismos específicos para o trabalhador que usa algum aplicativo para tirar seus ganhos.

O trabalho através das plataformas é considerado um caminho sem volta, pois 9 em cada 10 motoristas e entregadores querem continuar atuando no ramo mesmo após a pandemia.

"Como parte do ecossistema, as plataformas podem desempenhar um papel importante. De um lado, disponibilizando a tecnologia para facilitar a inscrição e as contribuições desses trabalhadores e, de outro, pagando elas mesmas uma contribuição à Previdência, para complementar e reduzir o valor desembolsado pelos trabalhadores", afirma.

"É hora do poder público, sociedade, empresas e trabalhadores priorizarem essa agenda para darmos passos concretos e atualizarmos a legislação previdenciária à realidade das novas formas de trabalho", completou.

Quem é o trabalhador da Uber?

No geral, quanto à escolaridade, 46% responderam ter ensino superior, enquanto 40% o médio e apenas 5% o fundamental, de acordo com o Datafolha.

A maioria é composta do sexo masculino (92%). Quanto à faixa etária, a maior parte, 34%, estava entre 30 e 39 anos e 56% residia no Sudeste.

O Datafolha não informou sobre gênero, raça dos entrevistados, nem condições de trabalho.

Motorista

  • Sexo: homens (93%) e mulheres (7%);
  • Escolaridade: 51% tem ensino superior;
  • Idade: 35% entre 30 a 39 anos;
  • Região: 53% estão no Sudeste.

Motorista

  • Entregadores
  • Sexo: homens (92%) e mulheres (8%)
  • Escolaridade: 49% possui ensino médio;
  • Idade: 49% entre 18 e 29 anos
  • Região: 62% moram no Sudeste.

Em relação à situação familiar, 62% dos motoristas são responsáveis por cuidar do cônjuge, 59% dos filhos e 13% dos pais. Quanto aos entregadores, a ordem é a mesma: cônjuge (54%), filhos (47%) e pais (21%).