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Seu próximo celular virá da China; Huawei e Xiaomi avançam para o Ocidente

Mulher sorri para a tela de smartphone do lado de fora de uma loja da Huawei em Pequim, na China; fabricantes chineses viraram as maiores potências no mercado de celular - Wang Zhao/AFP
Mulher sorri para a tela de smartphone do lado de fora de uma loja da Huawei em Pequim, na China; fabricantes chineses viraram as maiores potências no mercado de celular Imagem: Wang Zhao/AFP

Helton Simões Gomes

Do UOL, em São Paulo

11/02/2019 04h00

Analistas consultados pela reportagem esperam que 2019 será o ano em que a Huawei passará a Apple definitivamente; e ela em breve deve chegar ao Brasil

Confesse, você já chamou um desses celulares de "xing ling". Talvez não tenha feito por mal, mas a realidade é que muita coisa mudou desde o tempo que smartphones chineses eram sinônimo de precariedade: hoje, fabricantes da China não só peitam em sua terra natal as gigantes dos celulares Apple e Samsung com estão prestes a dominar o Ocidente.

Huawei, Xiaomi e companhia já avançaram algumas casas no ano passado, quando fabricaram, pela primeira vez, mais da metade dos celulares vendidos no mundo --embora a maior parte das vendas tenha sido restrita ao gigantesco mercado chinês.

Mas a virada está marcada para este ano, segundo indicam analistas. E a conquista do lado de cá do meridiano, que fique claro, será feita com aparelhos de alta tecnologia, inovadores e que custam muito menos que celular top da concorrência.

Conquista da China

Antes de ganhar território mundo afora, as fabricantes chinesas tiveram que lutar pelo mercado interno. Até começarem a desenvolver seus próprios aparelhos, os chineses apenas montavam os de outras empresas, explica Tina Lu, analista de indústria móvel da consultoria Counterpoint. 

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Para atrair gigantes de fora, criaram megaestruturas com baixíssimo custo de produção. Isso produziu empreendimentos gigantescos como o da Foxconn, a maior fabricante de eletrônicos do mundo, que possui fábricas do tamanho de cidades na China e é a responsável pela montagem dos iPhones da Apple.

Só que os chineses não ficaram só nisso.

Muitos produtores de celulares surgiram, aproveitando a incipiente especialização em unir alguns componentes, conta Renato Meireles, analista da IDC. Em pouco tempo, essas fabriquetas viraram os reis do pedaço, ainda que seus dispositivos não fossem lá essas coisas. Quando exportados para fora da China, esses aparelhos alimentaram a péssima fama dos chinesas, a de experts em cópias e falsificações.

No Brasil, a percepção sobre os fabricantes chineses era de que faziam aparelhos de marca ruim, que quebrava fácil e era frágil

Renato Meireles

Mas o jogo virou. As fabricantes que hoje lideram o mercado chinês usaram a força que possuíam em outras áreas de negócio para tomar de assalto o mercado de smartphones e destronar os bam bam bans, diz Meireles.

A Xiaomi é tem uma grande linha de eletrônicos, que vai de mouses a máquinas de fazer pipoca e chapinhas para cabelo. Já a Huawei é líder mundial em serviços e produtos de telecomunicação.

Essas marcas chinesas se beneficiaram da expertise de fabricação e do custo baixo

Tina Lu

Além de usar as instalações que antes atendiam a demanda externa, essas empresas também criaram produtos que caíram nas graças do mercado local. O que não é pouco: um terço das vendas de smartphone do planeta ocorre na China. Como ela é o maior mercado desses aparelhos do mundo, quem vence por lá tem boas chances de dar de goleada em termos globais. 

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A primeira poderosa a sentir o chega pra lá das chinesas foi a Samsung, que, apesar de ser líder no mundo - e no Brasil - não está nem entre as top 10 do mercado chinês. (A próxima é a Apple, mas já já falamos disso) Com a casa dominada, as fabricantes chinesas passaram a expandir seus horizontes.

BOM, BARATO E EM TODO LUGAR

Essa expansão pode ser encarada de suas formas. Uma delas foi o esforço para afastar o carma do "produto chinês copiado" e transformar a qualidade e a inovação na nova cara dos smartphones chineses. 

Antes, a Apple ditava os rumos do mercado. O lançamento do iPhone era o que indicava borda infinita, os caminhos do processador, da memória. Hoje não. A gente vê os chineses vindo com especificação melhorada, em termos de processador, de inteligência artificial

Renato Meireles

Quer um exemplo? O Huawei Mate 20 e iPhone XR até possuem configurações similares. No processamento, a velocidade do chinês é de até 2,6 GHz e a do norte-americano, de 2,5 GHz. Em alguns pontos, no entanto, o Mate 20 supera o modelo da Apple. Veja só. 

A tela de 6,53 polegadas do Mate 20 tem resolução de 2.244 x 1.080 pixels, enquanto o celular da Apple tem display de 6,1 polegadas com resolução de 1.792 x 828 pixels.

A câmera traseira do celular da Huawei é tripla: 12 MP + 16 MP (grande angular) + 8 MP (telefoto). Já a frontal é de 24 MP. No iPhone XR, a câmera traseira é simples, de 12 MP, e a frontal, é de 7 MP.

Já a bateria do chinês é de 4.000 mAh, enquanto a do XR é de 2.942 mAh; e há memória interna a partir de 64 GB nos dois modelos.

É claro que isso são só as especificações e no uso uma ou outra coisa pode surpreender mesmo com números menos poderosos. Sabemos, por exemplo, que o iPhone XR é um dos melhores celulares, mas não dá para negar que a ficha técnica no chinês tem quesitos que saltam aos olhos.

O grande lance é que os chineses costumam superar não só nas "specs", como no preço.

Na China, o XR custa na China 6,5 mil yuans (R$ 3.510), enquanto o Mate 20 é bem mais barato: sai por 4 mil yuans (R$ 2.160), quase dois terços do valor do rival.

Os chineses vêm crescendo por causa disso: melhoria em especificações e preço acessível ao consumidor final

Renato Meireles

Como nem tudo dava para fazer em casa, criar aparelhos com esse nível de poder exigiu que os chineses recorressem aos mesmos fornecedores de seus concorrentes. Por isso, deixaram de lado os processadores da MediaTek e adotaram em peso os da Qualcomm.

A outra expansão é a territorial mesmo, para fora da China. Aqui é bom fazer uma distinção. Nem toda fabricante chinesa age da mesma forma. A consultoria Strategy Research as classifica de três formas, conforme a presença regional: 

  • Globais: apenas a Huawei está nessa categoria por estar presente em todo mundo. 
  • Focadas na Ásia e China: Xiaomi, OPPO e Vivo estão nessa categoria. 
  • Não concentradas na Ásia: Lenovo-Motorola, TCL-Alcatel, Transsion e Wiko. 

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DERRUBANDO GIGANTES

Dominar a China ao mesmo tempo - enquanto exploram outras regiões - com aparelhos cada vez mais competitivos e por preços acessível foi o que fez essas empresas responderem por 51% dos smartphones vendidos no mundo no ano passado, segundo dados tanto da Strategy quanto da Counterpoint. E olha que 2018 foi o primeiro ano em que a venda de celulares desacelerou.

Mesmo com o avanço chinês, as líderes do mercado ainda são a sul-coreana Samsung e a norte-americana Apple. Mas isso não deve durar muito. Analistas consultados pela reportagem esperam que 2019 será o ano em que a Huawei passará a Apple definitivamente.

Tanto Samsung quanto Apple podem perder sua posição dominante, da mesma forma como aconteceu com Nokia e Motorola anos atrás. A Apple provavelmente vai se tornar a terceira fabricante em volume de vendas ao ser ultrapassada pela Huawei em 2019. A Samsung, entretanto, continuará a líder o mercado por pouco mais de um ano.

Tina Su

COMO ELAS VÃO CONQUISTAR VOCÊ

Diante de tudo o que acontece no mundo, o Brasil representa um ponto fora da curva para as chinesas. A única que possui alguma relevância é a Motorola, comprada pela Lenovo, que preferiu manter por aqui a icônica marca devido ao carinho que os brasileiros têm por ela. Ela é a vice-líder no país, segundo a IDC:

  • Samsung - 54%
  • Motorola - 20%
  • Apple - 12%
  • LG - 8%
  • Outras: 6%

Fora isso, elas só colecionaram reveses até agora. A Xiaomi incluiu o Brasil na rota de sua expansão internacional em 2015, mas o passeio não durou muito. 

A Xiaomi entrou no mercado brasileiro, mas deram um tiro mal dado que atingiu o próprio pé: tentaram vir por conta própria, com um marketplace, um modelo que não tem tanta força aqui no Brasil

Renato Meireles

Resultado: desencorajou as outras que estavam interessadas no Brasil.

A Huawei vendeu durante um curto período aparelhos no país. No ano passado, ensaiou uma parceria com a Positivo Informática, mas o enlace foi desfeito antes que um Mate 20 sequer fosse colocado nas prateleiras das lojas brasileiras.

O analista da IDC, no entanto, aposta que as duas devem desembarcar no Brasil em 2019. Ele traça duas possíveis estratégias: produzindo localmente, seja em fábrica própria ou terceirizada; ou fechando um acordo com alguma produtora local, que já conheça a dinâmica do mercado interno brasileiro.

Tina Lu, da Counterpoint, concorda:

É só uma questão de tempo até que a Huawei que comece a operar no Brasil

Seja como for, dados da IDC mostram que este é o ano para elas fisgarem você. Xiaomi e Huawei apostam, sobretudo, naquele consumidor que já não usa um smartphone como um marinheiro de primeira viagem: ele manja de tecnologia o suficiente para ir além da marca e focar na capacidade do aparelho.

Fisgar um consumidor que já conhece os recursos do aparelho foi importante para a virada de chave em que Huawei e Xiaomi cresceram bastante

Renato Meireles

O cenário que as ajudou lá fora está montadinho no Brasil.

Segundo dados da IDC, 85% dos brasileiros possuíram mais de dois smartphones antes do que usam agora (olha aí a tal maturidade), o número de pessoas que comprou um aparelho no ano passado pela primeira vez é muito pequeno (são poucos os neófitos na pista) e as vendas foram fracas no passado porque muita gente postergou a compra (em breve, essas pessoas buscarão celulares pata repor os antigos). 

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