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Imortal? Empresa quer guardar o seu cérebro e fazer backup da mente

Empresa quer preservar o cérebro e convertê-lo em dados digitais  - Getty Images
Empresa quer preservar o cérebro e convertê-lo em dados digitais Imagem: Getty Images

Rodrigo Lara

Colaboração para o UOL

14/03/2018 15h09

Um dos eternos sonhos da humanidade é se aproximar ao máximo da vida eterna. Desconsiderando conceitos religiosos, o máximo que a ciência chegou perto disso foi ampliar o tempo de vida humana, por meio da medicina e outras disciplinas.

E se dissermos que, em breve, será possível preservar todo o conteúdo da sua mente, mesmo após a sua morte, em um arquivo de computador? E que isso poderia ser feito com mentes brilhantes da humanidade, como o físico Stephen Hawking, morto na noite da última terça-feira (13), de maneira a usar o seu conhecimento para permitir avanços científicos cada vez mais amplos e rápidos?

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A ideia parece maluca, mas é o principal negócio da Nectome, uma startup criada por Robert McIntyre e Michael McCanna, ambos formados no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em inteligência artificial e ciências da computação, respectivamente.

O intuito da empresa é preservar o cérebro de uma pessoa morta em níveis microscópicos, por meio de uma técnica de embalsamamento chamada de criopreservação estabilizada por aldeídos, que transforma o objeto preservado em uma estátua de vidro.

Dessa forma, a expectativa é que no futuro cientistas possam escanear o cérebro e transformar o seu conteúdo em uma simulação de computador - não seria exatamente a mesma pessoa, mas sim uma espécie de "clone mental".

Em outras palavras, é como se fosse feito um backup de sua mente.

Como funciona

Isso, porém, tem um lado negativo: a técnica de preservação exige um cérebro "fresco", ou seja, de uma pessoa que ainda está viva. E ele é irreversível, já que causa a morte da pessoa e, por isso, a empresa diz que o plano é que ele seja feito com pessoas que tenham doenças em estado terminal.

Nessa condição e após anestesia geral, o corpo seria ligado a um aparelho de circulação artificial que injetaria nas artérias carótidas as substâncias químicas de embalsamamento desenvolvidas pela Nectome. O processo leva em torno de seis horas.

Por ser um procedimento fatal, a Nectome consultou advogados que acompanham o programa californiano de morte assistida, criado há dois anos para pacientes terminais. De acordo com a empresa, ela acredita que o procedimento seria totalmente legal.

A ideia em si não é nova, tanto que há empresas nos Estados Unidos especializadas em técnicas de criogenia para armazenamento de corpos de pessoas mortas. A questão é que há controvérsias sobre a capacidade da técnica utilizada atualmente, de fato, preservar o cérebro.

McIntyre, porém, desenvolveu uma técnica que combina criogenia e embalsamamento em 2015, provada efetiva para a preservação do cérebro em nível microscópico, incluindo os conectomas - os conjuntos de ligações entre os neurônios. O desafio é enorme, uma vez que um simples nervo cerebral pode estar conectado com outros 8 mil e há milhões de células no cérebro.

Uma vez passado pelo processo, o cérebro fica congelado. Caso a tecnologia de "leitura" cerebral esteja disponível no futuro, basta descongelar o órgão, que terá se tornado uma espécie de modelo de plástico, não mais uma substância biológica.

Teste bem-sucedido

A Nectome ganhou um prêmio de US$ 80 mil após apresentar um cérebro de porco preservado usando a técnica. O órgão manteve cada sinapse, o que pode ser visto usando um microscópio de elétrons.

Já em janeiro deste ano, a empresa conseguiu comprar um corpo de uma senhora em Portland (EUA) por meio de uma outra companhia, que faz os trâmites necessários para quem deseja doar seu corpo para a ciência após a morte.

A técnica da Nectome foi aplicada fora das condições ideais - a pessoa havia morrido há duas horas e meia -, mas ainda assim o resultado apresentou um cérebro preservado com poucos danos. Por ser um caso experimental, o cérebro da idosa foi cortado em fatias da espessura de um papel, de modo a ser analisado por um microscópio de elétrons para provar a eficácia do método.

Apesar de não haver qualquer garantia que esses cérebros sejam úteis futuramente, há ao menos 25 pessoas interessadas em passar pelo procedimento no fim de suas vidas. Para isso, a Nectome cobra um depósito de US$ 10 mil como garantia de interesse, valor que pode ser devolvido caso a pessoa mude de ideia.

A iniciativa já atraiu mais de US$ 1 milhão em fundos, além de ganhar um prêmio de US$ 960 mil do Instituto Norte-Americano de Saúde Mental. Cerca de um terço dos fundos obtidos em um laboratório do MIT, que desenvolve uma técnica de microscopia capaz de inchar o tecido cerebral, de forma que ele fique entre 10 e 20 vezes maior do que o normal, o que ajudaria em sua observação.

Por hora ainda não há data para o procedimento se tornar comercial, tampouco o quanto seria cobrado para ele ser feito.