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Física na Veia

Nobel 2020: e se o Sol virasse um buraco negro? Na teoria, isso é possível

Ilustração de um buraco negro - Aurore Simonnet e Nasa
Ilustração de um buraco negro Imagem: Aurore Simonnet e Nasa

06/10/2020 18h30Atualizada em 07/10/2020 12h56

A Academia Real de Ciências da Suécia anunciou nesta terça-feira (6) os laureados com o Nobel de Física 2020. E os buracos negros estão no centro das atenções!

Veja, no vídeo abaixo, o anúncio oficial do Nobel 2020.

Metade do prêmio vai para o inglês Roger Penrose por "comprovar, de forma robusta, que a formação de buracos negros é uma previsão da teoria geral da relatividade". Penrose, a partir da Teoria da Relatividade Geral, mostrou em detalhes que buracos negros poderiam existir no Universo como previsão direta da Teoria da Relatividade Geral, algo que Albert Einstein, o pai da teoria, duvidava.

Mas buracos negros existem e um deles já foi registrado em imagem pelo projeto EHT (Event Horizon Telescope) em publicação de abril de 2019. Você deve ter visto o que muitos chamaram erroneamente de a primeira fotografia de um buraco negro, imagem obtida com uma técnica sofisticada e muito além de um mero registro fotográfico.

Andrea Ghez, americana, e Reinhard Genzel, alemão, dividem a outra metade, ficando com um quarto do prêmio cada um, pela "descoberta de um objeto compacto e supermassivo no centro de nossa galáxia".

Eles mediram o movimento de estrelas em torno de um ponto bem definido onde deveria haver muita massa para provocar tais órbitas tão evidentes. E concluíram que ali, no centro da Via Láctea, deve existir um corpo compacto e supermassivo, ou seja, um buraco negro.

Num mundo machista, e na Ciência infelizmente não é diferente, vale ressaltar que Andrea Ghez é apenas a quarta mulher a receber o Nobel de Física, prêmio concedido desde 1901. Que venham muitas outras!

Para saber mais detalhes do prêmio, leia matéria no Blog Espaço-Tempo do astrônomo Thiago Gonçalves.

O que é um buraco negro?

Um buraco negro é um objeto muito denso, ou seja, que tem muita massa concentrada em seu volume. Sendo assim, sua gravidade é tão intensa que nem mesmo a luz pode escapar.

Para você ter uma ideia, a velocidade que qualquer objeto tem que ter para escapar da gravidade de um corpo, a chamada velocidade de escape, Ve, é dada por:

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Imagem: Reprodução

onde G = 6,67.10-11 N.m²/kg² é a constante da gravitação universal, M é a massa do corpo e r o seu raio.

Se você fizer o cálculo para a Terra, para a massa aproximada de M = 6.10?24 (elevado a 24) kg e r = 6400 km = 6,4.10?6 (elevado a 6) m, vai encontrar cerca de 11 km/s. Esta é a velocidade de escape do nosso planeta, ou seja, a velocidade com que você tem que lançar um corpo para longe do planeta de tal forma que ele escape da atração gravitacional terrestre e não volte nunca mais, comprovando que nem tudo o que sobe, desce!

Num Buraco Negro a velocidade de escape Ve é a velocidade c da luz no vácuo, sendo c = 300.000 km/s = 3.10ˆ8 (elevado a 8) m/s (aproximadamente). Se colocarmos c no lugar de Ve na expressão acima, encontraremos

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Imagem: Reprodução

A expressão obtida acima é chamada de Raio de Schwarzschild em reconhecimento a Karl Schwarzschild que, em 1916, pela primeira vez, a obteve. O Raio de Schwarzschild, RS, define o horizonte de eventos do buraco negro, ou seja, o raio a que um corpo deve ser comprimido para tornar-se um buraco negro, ou seja, para que a sua velocidade de escape seja a própria velocidade c da luz no vácuo. Desta forma, nem mesmo a luz é capaz de escapar da atração do corpo.

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Raio de Schwarzschild
Imagem: Reprodução

Experimente calcular o Raio de Schwarzschild para a Terra. Use G e M já declarados acima. E vai descobrir que, para a Terra tornar-se um buraco negro, ela deve ser comprimida numa esfera de quase 9 mm. Dá para imaginar a densidade do astro!

E cai por terra, sem trocadilho algum, a ideia de que um buraco negro é um corpo enorme. Pode até ser, mas não é regra. O que tem que ser enorme é a densidade para provocar uma gravidade intensa a ponto de impedir a ejeção da própria luz. Dá para entender a ideia?

Que tal agora calcular o Raio de Schwarzschild para o Sol, a nossa estrela, astro muito mais massivo do que a Terra e com massa próxima de M = 2.10?30 (elevado a 30) kg? Mão na massa! E verá que o Raio de Schwarzschild para o Sol é de cerca de 3 km. Em outras palavras, se o Sol encolhesse e ficasse com toda sua massa concentrada em 3 km, se tornaria mais um buraco negro no Universo.

E, cá entre nós, ainda que 3 km seja bem maior do que 9 mm, não dá para dizer que seja um astro enorme. Concorda?

Buracos negros são, portanto, objetos muito densos e tal que a sua velocidade de escape mínima seja igual a c = 300.000 km/s, a velocidade da luz no vácuo. O que importa para um Buraco Negro não é o tamanho mas a massa concentrada a ponto de criar uma gravidade intensa. Deu para entender a ideia?

Portanto, buracos negros não saem por aí engolindo tudo de maneira voraz. Todos têm uma espécie de linha amarela, uma distância limite, o Raio de Schwarzschild, a partir da qual não tem mais volta. Tomando cuidado com este limite, dá até para tentar chegar perto de um buraco negro.

Você teria coragem de encarar uma aventura dessas? Neste caso, você experimentaria o tempo passando mais lentamente. Mas aí já é papo de Relatividade Geral que fica, quem sabe, para outro post.

Abraço do prof. Dulcidio. E Física na veia!

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que estava escrito no texto, os cálculos apontados eram M = 6.10 (elevado a 24) kg; 6,4.10 (elevado a 6) m; 3.10 (elevado a 8) m/s; e M = 2.10 (elevado a 30) kg. Por um erro técnico o valor de potência dos cálculos foi exibido erroneamente. O texto foi corrigido.