Evandro Santo: 'O Pânico exibir meu AVC por uso de drogas foi educativo'

Evandro Santo, 48, se tornou o "gay mais famoso do Brasil" em 2003, quando passou a integrar o elenco do Pânico na TV (RedeTV!). O programa foi sucesso de audiência no final dos anos 2000 e palco de muitos artistas que estão em evidência em outras emissoras, como Sabrina Sato, Eduardo Sterblitch e Nicole Bahls.

Não é o caso de Evandro, que na época incorporou o personagem Christian Pior, e hoje está longe da televisão, sem desistir da comédia.

Em entrevista a Splash no aniversário de 20 anos do Pânico, Evandro fala dos dias de glória no programa, a luta contra o vício em drogas, a politização recente do humorístico e mais:

"O Pânico era punk rock"

Evandro já era conhecido na cena da comédia em São Paulo quando foi convidado por Emílio Surita a integrar o elenco do "Pânico". Após uma entrevista ao programa de rádio, o apresentador pediu que o humorista criasse um personagem para a atração.

"A ideia veio toda do Emílio, eu só dei o nome. Ele queria um cara que comentasse a roupa das pessoas, tinha visto isso no formato gringo. [...] Eu dei o nome de Christian Pior, um trocadilho de Christian Dior [estilista]. Ele topou", conta.

A proposta foi feita numa sexta e, no dia seguinte, Evandro já estava gravando na porta do casamento de Wanessa Camargo com Sabrina, que já em destaque se dispôs a colaborar com o comediante, "humildemente, com seu jeito alegre e divertido", e atrair famosos para as entrevistas.

Foram 50 minutos de muita emoção. A ideia de mexer com os pobres foi minha. [...] Eu achava um absurdo as pessoas saírem da casa delas pra ver o casamento de alguém pra ver famoso. [...] Aí eu aproveitei aquela coisa, 'essa gente, essa ralé'. O Emílio gostou. O quadro entrou e já deu dois dígitos [de audiência]. Evandro Santo

A fama veio com tudo e, com ela, um sentimento de vitória. Evandro teve uma adolescência difícil em Minas Gerais: foi expulso de casa pela mãe por ser gay, enfrentou discriminação e preconceitos e chegou a se prostituir para se manter na capital paulista.

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"Quando o sucesso veio, foi: 'Eu sou o gay mais famoso do Brasil, caraca, venci'. F*da-se, Uberaba. Mamãe, veja, você me expulsou, mas eu sou o viado do Pânico. Vejam vocês que me desprezaram. Vem tudo isso. [...] Eu achei que viria com raiva, mas não. Me deu vontade de fazer as pazes e ajudar essas pessoas", conta.

Se o Pânico fosse uma banda, seria o Titãs. Era rebelde, inovador, punk rock. [...] Ali eu paguei a língua de muita gente. Esfreguei na cara meu talento. Curei feridas. Calei boca de inimigos. Fiz mais inimigos. Paguei muitas dívidas. Comprei meu apartamento. Ajudei muitas pessoas. Viajei muito. Fiquei mais esperto. Evandro Santo

"Fui acolhido pelo Pânico, era uma família"

O Pânico na TV era um programa direcionado ao sexo masculino. Isso estava expresso na bancada de apresentadores toda composta por homens, no tratamento e exposição do corpo das Panicats, no humor crasso, em tudo.

Na época, a homofobia não era uma questão para a comédia. Em um momento emblemático, Rodrigo Scarpa, o Vesgo, levou um soco de Netinho de Paula após perguntar (com duplo sentido) se o apresentador "estava abrindo seu canal para todo mundo". A cena ainda incluía um caso de blackface, com Viny Vieira "fantasiado" de Netinho, com a pele pintada simulando uma pele negra e uma peruca crespa. Evandro, no entanto, diz que era bem tratado pela maioria dos "machões" nos bastidores.

"Por exemplo, chamar de 'viado', eu sempre chamo as pessoas de 'viado', era zoeira. O dia que o Bola não me zoava, eu ficava chateado. É um cara que eu adoro, tão fofo. Quando o Carioca me ligava, eu já começava a rir. 'Viadinho! Puxa, deixa eu te contar uma coisa'", relembra.

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A gente sabe quando a gente é querido. Não é a palavra, é a ação. O Emílio chegava e falava assim: 'Viadex, tenho aqui pra você um seriado que você vai adorar.' Meu amor, isso é carinho. [...] Ele pedia: 'Quero você muito gay. Não peça desculpas por ser quem é'. Pedia mais gay, mais viado, mais fresco. Evandro Santo

Nos últimos anos, Evandro abriu ao público sua luta contra o vício em drogas, uma história que começou quando ainda fazia parte do programa. Ele conta que essa família o acolheu nesse momento de vulnerabilidade.

Uma série de problemas pessoais somadas a um passado difícil fizeram Evandro cair no vício. O que antes era um uso recreativo acabou virando algo para literalmente anestesiar a dor, já que Evandro usava cetamina — anestésico para cavalos.

Em meio à crise, Evandro pediu demissão, mas diz que Tutinha, ex-chefão da Jovem Pan, decidiu mantê-lo contratado.

"O Pânico me acolheu. Quando eu pedi demissão, [...] o Sr. Tutinha falou: 'Não vou te demitir'. Poderiam, mas não me demitiram. Arrumaram uma clínica. O Allan [Rapp, diretor] foi. Fui internado. Cuidaram de mim. Me pegaram de volta e fiquei até o fim. Me acolheram. Eles foram muito bacanas", afirma.

O Pânico é uma família. Cada um tem uma família de um jeito. Não existe família perfeita, mas é uma família. Mexe com alguém do Pânico. Mexe com o Emílio. É família. Evandro Santo

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"Exibir o AVC foi educativo"

Evandro já disse anteriormente que teve um princípio de AVC causado pelo uso de drogas durante uma gravação, enquanto entrevistava Faustão no casamento de Emerson Fittipaldi.

Nas cenas, o humorista tem dificuldade para articular as palavras e, depois, é mostrado no hospital. Segundo ele, Emílio e a produção decidiram exibir as cenas sabendo que o episódio havia sido causado pelas drogas. Para ele, televisionar as cenas foi algo "educativo".

"Eu chegava louco na rádio, e o Emílio falava: 'Você vai fazer louco mesmo assim, para você aprender'. [...] Então, eu acho legal. Achei que foi bacana, educativo. Cabe à gente, artista, entender que a arte é mais forte que a droga. Mesmo você estando uma merda, você estando ruim, você quer fazer a arte. Isso é muito profundo", afirma.

"Pânico era supermercado do humor"

Para Evandro, é difícil repetir a fórmula do Pânico, que ele define como um "supermercado do humor".

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"Tinha o humor hétero, tipo 'Vou, não Vou'. Tinha o Daniel Zukerman ["O Impostor"] fazendo um 'Missão Impossível'. A Sabrina fazia muito trabalho social. Tinha as provas, que eram engraçados. [...] É difícil você imitar isso, porque tinha rua, tinha estúdio, tinha muitas coisas. Era um programa muito completo, muito bem feito, muito bem pensado", avalia.

Sobre o recente viés político do programa, Evandro diz que o Pânico foi "corajoso" ao se posicionar.

"Foi rock'n'roll. Foi corajoso. Foi forte. Foi homem. É muito fácil eu, gay, ser Lula. Não, não concordo. Não sou obrigado. Bolsonaro sempre falou comigo, foi simpático. Sempre foi acessível. O Lula nunca falou comigo. [...] Eu acho que a Jovem Pan fez muito bem. Até porque assim você consegue definir o seu público", opina.

Questionado sobre o legado que o programa deixa para a televisão, Evandro cita a humanização das celebridades. "Você pega um Tony Ramos e faz uma pergunta que não tem a ver. Você desconstrói o Tony Ramos, humaniza ele. Porque o Tony Ramos é um ser humano. Essa foi a sacada", explica.

[O legado do Pânico é] que se a pessoa não consegue rir de si mesma, ela vai ser uma pessoa infeliz. Porque somos ridículos. Somos humanamente ridículos, frágeis. Somos inacabados. [...] Eu acho que nós temos que rir das nossas esquisitices. Temos que rir de nós mesmos. Evandro Santo

Hoje, Evandro Santo mantém um perfil nas redes sociais, onde faz publicidades, e se apresenta com seu show de humor "Evandro Nunca Fui Santo".

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