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'Não Foi Minha Culpa': Carnaval e violência contra mulher são democráticos

"Não Foi Minha Culpa" expõe diferentes casos de violência contra mulheres - Divulgação/ Star+
'Não Foi Minha Culpa' expõe diferentes casos de violência contra mulheres Imagem: Divulgação/ Star+

De Splash, em São Paulo

18/08/2022 04h00

No Brasil, uma mulher é morta a cada sete horas, tornando alarmante a condição feminina no país. Com o objetivo de expor essa assustadora realidade, o Star+ lançou a versão brasileira de "Não Foi Minha Culpa", uma série antológica focada em denunciar diferentes formas de violências contra a mulher e que chegou à plataforma neste mês de agosto, quando a Lei Maria da Penha completa 16 anos.

Ao longo de dez episódios, a produção acompanha diferentes casos que têm em comum entre eles o abuso contra mulheres e uma festa de Carnaval na qual todas as personagens estiveram em algum momento de suas histórias. A roteirista Juliana Rosenthal explicou a Splash que este ponto partilhado entre as protagonistas existe também nas produções dos outros países.

"Havia um profissional que unia as personagens, fosse uma advogada que cuidava dos dez casos, ou uma investigadora responsável. No caso do Brasil, queriam algo original e que tivesse alguma ligação com a cultura. Eu propus o Carnaval, que é algo tão democrático quanto a violência contra a mulher: todos participam, de um jeito ou de outro."

Rosenthal, que assina o roteiro com Michelle Ferreira, explica que a série causa um desconforto proposital naqueles que a assistem, justamente por abordar fatos que diversas mulheres já vivenciaram ou conhecem alguém que passou por dramas parecidos. Para ela, o objetivo é mostrar a evolução do abuso e assédio, que se iniciam de maneira sutil e podem terminar em um feminicídio.

'Não Foi Minha Culpa' é uma série que existe também no México e na Colômbia - Divulgação/ Star+ - Divulgação/ Star+
'Não Foi Minha Culpa' é uma série que existe também no México e na Colômbia
Imagem: Divulgação/ Star+

"Quando a gente vê, todos os dias, notícias sobre violência contra mulheres, só sabemos da morte. A gente sabe o que acontece, mas a gente não vê como aquilo se deu. Essa era a nossa oportunidade de mostrar como se chega nesta violência extrema."

Precisamos conhecer o processo para conseguirmos identificar, alertar e promover alguma transformação.
Juliana Rosenthal

Humanização da produção

Abordar assuntos tão pesados e delicados não é uma tarefa fácil, principalmente por se tratar de um tipo de violência que vive tão próximo de nós. "Desde quando a gente começou a pesquisar, fomos arrebatados por muita emoção e muita revolta. Foi muito forte, tão doloroso quanto transformador e intenso", recorda a roteirista.

Já a diretora Suzanna Lira conta que as primeiras leituras do roteiro não foram fáceis e que, desde o início, houve uma preocupação de como os crimes seriam exibidos. "Ao mesmo tempo em que tentamos entender o processo de violência, eu tinha pavor de reproduzir qualquer signo que parecesse um desses programas vespertinos que mostram violência."

A gente queria trazer a humanização para a história das mulheres. Quem é essa mulher? O que a gente perde quando uma mulher dessa morre? O que os filhos perdem? O que a sociedade perde? Não dá mais para fazer disso apenas um número.
Suzanna Lira

Mesmo com a duração entre 30 e 50 minutos, Lira compara a produção de cada episódio com a de longa-metragens. "Cada mulher era um universo diferente um desafio estético, narrativo muito complexo um também um desafio ético muito complexo de como mostrar isso sem banalizar e naturalizar coisas que nós, mulheres, não queremos mais naquele lugar."

Para ajudar na humanização de "Não Foi Minha Culpa", a produção era majoritariamente composta por mulheres. Desta maneira, os membros da equipe foram sentindo, ao decorrer das filmagens, como aqueles assuntos os afetam. "Várias cenas tinham que parar para cuidar das pessoas em volta", conta Lira.

Personagens reais

Cada um dos episódios é baseado em histórias reais, tiradas de relatos e processos que realmente aconteceram. Ao longo dos dez episódios, acompanhamos uma atriz em ascensão que sofre com um marido abusivo e invejoso, até uma empresária que luta por justiça pela sua filha, encontrada morta em um porta-malas.

No primeiro episódio, intitulado "Carol e Priscila", somos apresentados a Carol e Fernando. Eles namoraram por alguns meses até que, no Carnaval, ele a agride. Carol sublima o acontecido, até que descobre que ele tem uma nova namorada, Priscila, que, com a pandemia do coronavírus, vai morar com ele.

Bianca Comparato vive Carol em 'Não é Minha Culpa', onde atua ao lado da irmã, Lorena - Divulgação/ Star+ - Divulgação/ Star+
Bianca Comparato vive Carol em 'Não é Minha Culpa', onde atua ao lado da irmã, Lorena
Imagem: Divulgação/ Star+

Carol e Priscila são interpretadas pelas irmãs Bianca e Lorena Comparato. Na série, elas não são parentes, mas, em entrevista a Splash, Bianca explica que a similaridade física ajuda a entender Fernando. "Isso mostra um padrão dele, que busca mulheres parecidas. Se ele mantém esse ciclo, também deve manter o de violência."

Interpretado por Armando Babaioff, o vilão Fernando é um jovem boa praça, querido por todos, mas que se transforma em um homem abusivo e violento em quatro paredes. "Quando escolho fazer um trabalho, eu escolho ser um veículo para comunicar a história. E é isso que eu dizia o tempo todo: 'me usem'."

A maneira de denunciar esse tipo de violência é através da maneira como esse cara vai se comportar dentro dessa relação.
Armando Babaioff

O abuso de Fernando cometido contra Priscila começa de maneira velada, nos nuances do relacionamento. Com o tempo e a convivência, tudo começa a escalonar. "Ela começa como uma violência que não aparenta ser tão séria", explica Lorena a Splash. "Mas, ela é séria. Esse episódio é muito forte justamente por mostrar essa ideia."

A série toda é um grito de socorro que se faz necessário.
Lorena Comparato