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Haters e dinheiro: Por que famosos evitam se posicionar politicamente?

Deolane Bezerra é uma das influenciadoras que dizem ter sido prejudicadas por declarar apoio - Reprodução
Deolane Bezerra é uma das influenciadoras que dizem ter sido prejudicadas por declarar apoio Imagem: Reprodução

Lilian Cunha

Colaboração para Splash, em São Paulo

25/07/2022 04h00

No relacionamento entre marcas e celebridades, não há nada mais polêmico do que falar em política. Várias assessorias de imprensa de famosos simplesmente se recusaram a tocar no tema com a reportagem de Splash. Outras deram respostas genéricas, como: "o posicionamento das marcas e das celebridades deve ser fiel à sua essência, sua personalidade, valores e ações".

Mas esse mar de pretensa neutralidade virou uma tempestade há algumas semanas, quando a advogada e influenciadora digital Deolane Bezerra e a cantora Luísa Sonza denunciaram nas redes sociais que artistas e influenciadores digitais que se posicionam sobre as eleições de 2022 estão sofrendo boicote de marcas. Deolane e Sonza apoiam a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência.

"É ano de eleição. Não tem como não se posicionar. E por se posicionar não é só dizer em quem vota, mas discutir política. Nós, jovens, precisamos discutir política. Bloquear ou dificultar essa discussão é um desacato à sociedade", disse Luísa em entrevista à Folha de S.Paulo.

Especialistas em marketing digital ouvidos por Splash avaliam que o dilema surge de uma diferença entre as expectativas das empresas anunciantes a respeito dos influenciadores e o que eles de fato são.

As marcas enxergam estas celebridades como empresas, mas, no fim do dia, são pessoas com preferências e posicionamentos individuais, vistas pelos fãs também dessa forma.

"As marcas esquecem que a celebridade é um CPF, é um eleitor. Tratam os criadores de conteúdo como se fossem um CNPJ, uma empresa estática. Mas são pessoas. E pessoas tomam posição numa época como a que estamos vivendo", avalia Thais Mara, diretora de influência na agência Mutato.

De um lado, celebridades são pressionadas pelos próprios admiradores a se posicionarem desta ou daquela maneira. Hoje no centro do debate por também apoiar Lula, Anitta foi muito criticada há quatro anos por evitar se posicionar antes das últimas eleições.

De outro lado, ser "isentão" pode ser a melhor forma de manter negócios publicitários, como aponta Gabriel Borges, sócio-fundador da agência de publicidade Ampfy. "Tem marca que quer evitar crise e acaba se afastando de certos nomes", diz. Os especialistas apontam que as marcas sabem que hoje são cobradas a se posicionar, mas que preferem entrar em assuntos mais consensuais, como a beleza dos diferentes tipos de corpo e a preservação ambiental.

Entre a cruz e a espada

Não é só a reação das marcas que os criadores de conteúdo temem. Com a polarização na seara eleitoral, os artistas sabem que podem perder parte dos seguidores caso optem por esse ou por aquele caminho.

"Os criadores morrem de medo de se posicionar e, assim, perder seguidores e deixar de ganhar dinheiro com as marcas", diz Ana Paula Passarelli, dona da agência Brunch, que representa nomes como Nath Finanças e a Blogueira de Baixa Renda.

Ao se posicionar, tanto Luísa Sonza quanto Deolane entraram na mira dos "haters" de plantão da internet. Quando a advogada divulgou um vídeo junto com Lula, alguns internautas reagiram mal: "Essa eleição vai mostrar o que o brasileiro merece. Olha bem o tipo de pessoas que eles endeusam", disse um deles.

Já cantora Naiara Azevedo, por exemplo, foi alvo de críticas dos próprios fãs em 2021, ao comparecer a um almoço com o presidente Jair Bolsonaro (PL). Um ano depois, participando do BBB 22, ela se justificou por ter encontrado Bolsonaro, dizendo ter ido em nome dos profissionais da cultura. "Eu fui [ao evento] em busca de apoio como cidadã e parte interessada."

Para Gabriel Borges, da Ampfy, as marcas não precisam temer o "cancelamento". O especialista acredita que as polêmicas envolvendo o voto dos artistas têm vida curta.

"Nenhuma marca quer passar por isso. Acontece aquela chuva de comentários: 'nunca mais vou comprar isso' ou 'vou deixar de comprar tal produto'", diz Borges. "Mas, na realidade, é importante lembrar que essas crises geralmente não dão em nada. Elas não afetam efetivamente o consumo da marca", diz.

Além dos milhões de seguidores

Certo é que as maiores agências que lidam com influenciadores estão decididas a não impedir seus clientes de se posicionarem. Vão deixar a decisão, e os efeitos dela, na mão dos contratados.

"Se a celebridade torce por algum candidato, ela tem total liberdade para falar. A Mynd jamais cercearia a liberdade de qualquer influenciador", diz Fátima Pissara, presidente da Mynd, que atende nomes como Sonza, Pabllo Vittar e o ex-BBB Gil do Vigor.

É o que também diz Ivan Neves, sócio da Gain Agenciamento, que empresaria atores como Rafael Cardoso, Thiago Lacerda e Armando Babaioff. "Cada ator é dono de sua carreira e tem total liberdade de se posicionar de acordo com o que acha, pensa. Eles são formadores de opinião e devem agir conforme pensam. Nós como empresários não temos que interferir", declara

Para os agentes, um fator importante dessa equação é que as empresas saibam mais sobre os influenciadores que estão contratando, para além de qual é a quantidade de seguidores do perfil desta celebridade nas redes sociais. Os especialistas afirmam que muitas das crises acontecem após a empresa se assustar com posicionamentos que os contratados sempre tiveram.

"Na verdade, é um erro de posicionamento estratégico. Elas deveriam ter pesquisado antes quem é a celebridade que elas estão patrocinando", diz a diretora de influência Thais Mara, da Mutato. "Quem conhece a Anitta, já esperava por isso. Ela sempre brigou com Bolsonaro, sempre teve essa linha mais combativa de uma posição bem clara", diz Ana, da Brunch.

A ex-BBB e influenciadora digital Lumena Aleluia não teme se dizer de esquerda - Divulgação - Divulgação
A ex-BBB e influenciadora digital Lumena Aleluia não teme se dizer de esquerda
Imagem: Divulgação

Esse é o segredo de artistas que conciliam uma agenda de publicidade com postagens engajadas, como a ex-BBB Lumena Aleluia. A Splash, a empresária Aline Gabriel, que atende a influenciadora, afirma que a melhor saída é deixar esse ponto esclarecido no início da parceria.

"Como é algo que faz parte da personalidade da Lumena, as marcas já sabem desse posicionamento. Então não tem surpresa", diz Aline. Antes do BBB, Lumena era amiga de Marielle Franco (PSOL), vereadora carioca assassinada no Rio de Janeiro em 14 de março de 2018. "Então não é uma coisa que ela começou a fazer agora", explica a empresária.

  • Assista ao Splash Show e veja comentários sobre o posicionamento político dos famosos: