Topo

Arte de 'manicômio': a treta entre Lobato x Malfatti antes da Semana de 22

Monteiro Lobato criticou arte de Anita Malfatti antes da Semana de Arte Moderna de 1922 - Reprodução
Monteiro Lobato criticou arte de Anita Malfatti antes da Semana de Arte Moderna de 1922 Imagem: Reprodução

De Splash, em São Paulo

13/02/2022 04h00

A Semana de Arte Moderna de 1922, um dos marcos culturais da história do Brasil, começou há exatos 100 anos. E após um século, o atrito entre Monteiro Lobato e Anita Malfatti, dois dos principais artistas da época, ainda é lembrado por quem estuda o tema.

Autor de "Sítio do Picapau Amarelo", o escritor era famoso por fazer duras críticas em artigos publicados pela imprensa paulista.

Um deles analisou o trabalho de Anita em 1917, época em que a pintora fez a sua primeira exposição na Líbero Badaró, localizada no centro de São Paulo.

Arte de manicômios?

As pinturas de Anita tinham forte influência do expressionismo, movimento artístico que ainda era novo no Brasil. O desconhecimento sobre as técnicas também foi um dos motivos para comentários negativos dos críticos.

Em sua crítica publicada no jornal Folha de S. Paulo em 1917, Monteiro Lobato afirmou ser uma arte parecida com os "desenhos que ornam as paredes internas dos manicômios". Ele também se referiu ao trabalho da artista como "arte anormal".

O escritor também argumentou que a arte dos manicômios é "produto ilógico de cérebros transtornados pelas mais estranhas psicoses" ao se aprofundar na comparação.

Apesar de fazer críticas, Lobato reconheceu o "talento e originalidade" de Anita Malfatti, que trouxe referências internacionais após anos de estudos nos EUA e na Alemanha.

Seduzida pelas teorias do que ela chama arte moderna, penetrou nos domínios dum impressionismo discutibilíssimo, e põe todo o seu talento a serviço duma nova espécie de caricatura. Sejam sinceros: futurismo, cubismo, impressionismo e 'tutti quanti' não passam de ouros tantos ramos da arte caricatural. É extensão da caricatura a regiões onde não havia até agora penetrado.
Monteiro Lobato em 'A Propósito da Exposição Malfatti'

Segundo relato da revista "IstoÉ", Anita admitiu na década de 1950 que a publicação rendeu efeitos negativos imediatos. A artista conta que cinco telas compradas por apreciadores da exposição foram devolvidas.

"Havia tal ódio geral que um amigo de casa ameaçou meus quadros com a bengala, desejando destruí-los", contou ela ao admitir que se afastou das pinturas por um ano após a publicação da crítica.

O que aconteceu após as críticas?

O artigo afastou Monteiro Lobato dos artistas e aproximou Anita Malfatti das figuras que iniciaram o movimento modernista no Brasil. Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade e Pedro Alexandrino Borges estão entre os que se interessaram pela arte da pintora.

A união dos artistas, impulsionada por Mário de Andrade, serviu como base para o crescimento da arte no país. O movimento proporcionou a organização de uma semana de arte moderna em 1922 no Teatro Municipal de São Paulo.

A aproximação entre os pintores também beneficiou o trabalho de Anita Malfatti, que passou a trazer em suas obras referências do realismo e do naturalismo, outros dois movimentos artísticos que ganharam força no período do modernismo.

Pietro Maria Bardi, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti e o pintor Cassio M' Boy, durante exposição de Anita no Masp (Museu de Arte de São Paulo), em abril de 1955 - Folhapress - Folhapress
Pietro Maria Bardi, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti e o pintor Cassio M' Boy, durante exposição de Anita no Masp (Museu de Arte de São Paulo), em abril de 1955
Imagem: Folhapress