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Pedro Antunes

Foo Fighters está a um passo de virar uma banda de karaokê. E isso é ótimo

Por que o Foo Fighters não pode se divertir tocando Bee Gees?  - Divulgação / Montagem: Pedro Antunes
Por que o Foo Fighters não pode se divertir tocando Bee Gees? Imagem: Divulgação / Montagem: Pedro Antunes

Colunista do UOL

21/06/2021 14h52

Sem tempo?

  • Talvez você não saiba, mas o Foo Fighters vai mudar de nome.
  • Quer dizer, o grupo vai lançar um álbum de covers de Bee Gees e, para isso, assumirá outra alcunha.
  • Com isso, Dave Grohl e companhia se aproximam de se tornarem uma banda de karaokê que se diverte no palco.
  • Fazer cara de bravo e chifrinho com as mãos é tão anos 2000, não é?
  • A banda quer o contrário: quer que cada apresentação se torne uma experiência única, animada e festiva.
  • Isso não é inédito (alô, Alice Cooper e U2), mas abre um caminho interessante para o rock neste período pós-covid-19.

Roqueiros, via de regra, se levam a sério demais. Bandanas na cabeça, munhequeiras, camisetas pretas e calças meticulosamente rasgadas.

(Claro, este é um dos minutos clichês que giram em torno do estereótipo daqueles que curtem guitarras altíssimas.)

É preciso ter muita coragem para se desfazer de toda a seriedade e divertir-se, realmente, no palco. Sem pose, sem a validação de ninguém. Só pela diversão, mesmo.

O Foo Fighters é uma banda que nasceu do luto. Dave Grohl, devastado pela perda de Kurt Cobain e fim do Nirvana, reuniu músicas que tinha, gravou todos os instrumentos e criou a banda a partir disso.

Com o passar do tempo, o grupo atingiu status de maior banda de rock da época. Atualmente, toca em estádios e, indiretamente, costurou uma revolução estética ao repetir uma fórmula de músicas baseadas na construção "ponte crescente + parada + explosão do refrão", tão usada no rock de arena.

Nunca assisti a um show ruim do Foo Fighters desde que o grupo voltou a excursionar pelo Brasil, em 2012.

Dave Grohl é mais do que um showman, é um host. Toca, canta e faz o público cantar junto. Ri, chora, diverte-se. É realmente impressionante.

Mas o Foo Fighters ainda era "sério demais". Ao mesmo tempo, a inspiração rareava mais do que os cabelos no cocuruto dos roqueiros de 40 e tantos anos.

"Wasting Light", álbum de 2011 que venceu quatro prêmios Grammy, é um petardo e foi gravado todo ao vivo, um conceito que deu uma sacudida nos ânimos da turma (a essa altura, o Foo Fighters ainda era formado por cinco caras; atualmente são seis).

"Sonic Highways" veio na sequência como um projeto amplo e envolvia até a criação de uma série documental (antes do termo ser cool, é bom dizer). A banda passou por estúdios icônicos dos Estados Unidos e gravou uma música em cada um deles. Não é excelente, mas é uma jornada interessante.

"Concrete and Gold" (2017) representa a safra mais sem inspiração de Grohl em décadas (cite três músicas boas o bastante para merecer um lugar em um setlist já empanturrado setlist do grupo) e "Medicine at Midnight" (2021) tem umas maluquices, outras ideias batidas e é apenas mediano - se aparecer em listas de melhores álbuns do ano, será mais pela simpatia ao vocalista do que valor da obra.

Homenagem aos Bee Gees?

Chegamos, então, à notícia de que Foo Fighters vai "mudar" de nome. No mesmo ano em que lançou "Medicine at Midnight", o grupo se prepara para um novo álbum, desta vez de covers.

Dave Grohl e companhia vão tocar Bee Gees!

Não me leve a mal. Amo toda a estética disco music de Barry, Robin e Maurice Gibb. Mas eu não sou músico e nem faço um disco por causa do meu amor por hinos como "Stayn' Alive" e "How Deep Is Your Love".

O lançamento será para o Record Store Day, o dia em que as lojas de discos dos Estados Unidos colocam nas ruas uma pancada de discos especiais criados para comemorar a sua existência (ou seria persistência?).

O álbum, que levará o nome de "Hail Satin", terá a banda Dee Gees (nome adotado pelo Foo Figheres) tocando 10 músicas. Cinco delas serão dos Bee Gees ("You Should Be Dancing," Night Fever", "Tragedy", "More Than a Woman" e "Shadow Dancing", de Andy Gibb) e outras cinco serão versões ao vivo de faixas do "Medicine at Midnight" gravadas ao vivo.

Quer mais farofa do bem? Siga em frente.

Cover de Creep com humorista em volta à NY

Se você assistiu ao Fantástico ontem, viu que a cidade de Nova York está de volta à normalidade agora que a média de mortes por covid-19 está em 5 pessoas por dia. E além da felicidade exuberante do correspondente da Globo Jorge Pontual, o Foo Fighters também está a toda.

O grupo fez o primeiro show com capacidade total da icônica arena Madison Square Garden desde março de 2020 e, no meio da algazarra, Dave Grohl convidou o comediante Dave Chappelle para cantar uma versão de "Creep", do Radiohead.

Olha, Chappelle não decepcionou (aliás, a voz dele é bem interessante), e o resto do grupo pareceu se divertir durante a performance.

O show, elogiadíssimo pela Rolling Stone norte-americana também trouxe a versão da banda para "You Should Be Dancing", dos Bee Gees.

Sim, você verá Dave Grohl rebolando neste vídeo abaixo (é divertidíssimo) e ele tentando cantar nas notas agudas dos Bee Gees (não tão divertido assim).

E agora, Foo Fighters?

O Foo Fighters tem 12 prêmios Grammy, sendo quatro na categoria de melhor álbum de rock.

Fazer ou não mais um disco não vai afetar diretamente a quantidade de pessoas que Grohl e companhia arrastam para arenas ao redor do mundo - eles passaram desta fase.

Aliás, com 10 álbuns de inéditas, o Foo Fighters já sofre para não deixar nenhum hit de fora dos seus shows e, com isso, não decepcionar ninguém.

Não por acaso, as apresentações do grupo são cada vez maiores. Além de tocar as canções "obrigatórias", eles tentam se divertir com faixas novas e algumas covers.

Lançar um álbum com covers de Bee Gees, incluir mais versões de músicas adoradas nas apresentações e ter convidados sempre que possível integra um movimento de ressignificação do Foo Fighters.

O grupo está a um passo de se tornar uma banda de karaokê (basta ter mais um álbum de covers, pelas minhas contas) e isso é ótimo.

Depois de tanto se divertir em clipes engraçadinhos, a banda também quer farra no palco. Fazer cara de bravo e chifrinho com as mãos é tão anos 2000, não é? Músicas novas também não são tão necessárias assim, principalmente se ouvirmos a safra mais recente. Depois de se desapegar destas amarras todas, resta espaço até para sorrisos, diversão e brincadeiras.

Isso faz um bem danado para o rock em geral, principalmente para o rejuvenescimento do gênero.

Outros estilos de música já entenderam que uma apresentação não envolve só música (o que é uma pena, mas assim é a vida). Vivemos em um mundo de celulares, lives, stories, fotos, selfies.

O Rock in Rio, sempre criticado por puristas, entendeu isso muito bem: os Medina não vendem o RIR como um evento de música ao vivo e, sim, como um lugar para se ter uma experiência completa.

Isso não é novidade, é claro, porque Roger Waters cria um muro do "The Wall" em seus shows, David Bowie "matou" Ziggy Stardust no palco no show que eu daria um rim para ter assistido, Alice Cooper é rei das performances teatrais nas suas apresentações, o Slipknot tem as personalidades dos músicos escondidas por máscaras, o U2 criou um palco gigantesco em formato de aranha para uma turnê mundial... Mas nenhum deles é Dave Grohl.

Lembra que, lá em cima, chamei Dave Grohl de "host"? Incluir mais covers, novas formas de interagir com o público e trazendo celebridades locais para a performance transformam cada noite com o Foo Fighters em um programa de auditório com interação, momentos de nostalgia e tudo o que for possível trazer para o palco para criar uma experiência diferenciada.

Seria Dave Grohl um candidato para a vaga do Faustão? Eu gosto da ideia.