Topo

Em meio à retomada da covid-19, França mantém fim do uso obrigatório de máscaras

As infecções voltaram a subir no país e esse crescimento deverá ser impulsionado pela liberação da proteção em quase todos os locais a partir do dia 14 - Gonzalo Fuentes/Reuters
As infecções voltaram a subir no país e esse crescimento deverá ser impulsionado pela liberação da proteção em quase todos os locais a partir do dia 14 Imagem: Gonzalo Fuentes/Reuters

Taíssa Stivanin

da RFI

11/03/2022 11h14

As infecções voltaram a subir no país e a retomada epidêmica deve se confirmar nas próximas semanas. Esse crescimento, alerta Jérôme Marty, presidente do sindicato UFMLS (União Francesa para a Medicina Livre), será impulsionado pelo fim do uso obrigatório da máscara em quase todos os locais fechados na França, na próxima segunda-feira (14), incluindo escolas e empresas.

A guerra na Ucrânia invadiu o noticiário no final de fevereiro e a pandemia ficou em segundo plano, mas a covid-19 está ensaiando seu retorno à cena. Nesta quarta-feira (9) pela primeira vez desde janeiro, foram registradas 56.251 infecções na França, uma alta de cerca de 20% em relação à semana passada.

O aumento das contaminações já oscila entre 30 e 40% no norte do país entre os menores de 10 anos, onde a volta às aulas ocorreu em 21 de fevereiro (as datas diferem em função das regiões).

Nesse contexto, a subvariante BA.2 da ômicron já é dominante, desde o início do ano, em Toulouse, no sul, e tem potencial "driblar" os anticorpos de pessoas recentemente infectadas. Ela deve se espalhar pelo território e será, provavelmente, o motor da retomada epidêmica das próximas semanas, acredita o clínico geral francês.

De gravidade aparentemente similar à ômicron, a BA.2 é, por outro lado, mais contagiosa. "Essa dinâmica já é conhecida. Nada foi feito para frear as infecções e elas vão recomeçar a subir, ainda mais com o relaxamento total das restrições no dia 14", alertou Marty em entrevista à RFI.

Após o tsunami provocado pela chegada da ômicron à França e a explosão de casos entre dezembro e janeiro, a quinta onda parecia ter chegado ao fim em fevereiro, após quase dois anos de epidemia. A menos de um mês das eleições presidenciais, em 10 de abril, todas as restrições sanitárias serão extintas a partir de segunda: a máscara só será obrigatória nos transportes e centros de saúde.

"A retirada da máscara poderia ser uma opção se uma verdadeira política em relação à qualidade do ar interior tivesse sido adotada. Mas nada foi feito", denuncia o médico francês, em referência, por exemplo, à instalação generalizada sensores de CO2 em espaços fechados, que medem o nível de partículas e indicam a necessidade de arejar o ambiente. O objetivo é dispersar o aerossol e as possíveis gotículas virais contaminantes.

Segundo ele, o fim do distanciamento social passa obrigatoriamente pelo controle da qualidade do ar interno, atrelado a uma política governamental que garanta sua aplicação por leis. "O controle da qualidade do ar é fundamental para evitar a contaminação das pessoas de maneira massiva, quando estão próximas e em locais fechados", insiste.

Jérôme Marty ressalta que a alta taxa de vacinação do país (cerca de 78% dos franceses têm um esquema completo) torna a situação mais gerenciável em relação aos dois primeiros anos de epidemia, mas ele lembra que a proteção contra a transmissão, gerada pela injeção ou pela infecção, diminui após poucos meses.

Pesquisas mostram que ela é efetiva apenas cerca de 10 semanas — felizmente vacinados e curados continuam protegidos de desenvolver formas graves da doença por um longo tempo.

"O tempo em relação à última dose vai aumentar e muita gente não tomou a dose de reforço, ou tomou faz tempo", explica Marty, ressaltando que isso contribuirá para a alta das contaminações. "Além disso, há muitas pessoas que ainda não se vacinaram", lembra. Cerca de 6 milhões de franceses ainda não receberam nenhuma dose da vacina - um número suficiente para desencadear uma nova onda de infecções.

Fim do passaporte vacinal

O presidente francês, Emmanuel Macron, candidato à reeleição, que em determinado momento declarou que queria "infernizar os franceses não vacinados", também cedeu: a obrigatoriedade do passaporte vacinal, que exigia a imunização para frequentar certos locais, como bares e restaurantes, será extinta a partir de segunda-feira.

"A política de vacinação deixou de ser um tema no debate público, de maneira geral, com a invasão russa, o que é compreensível. A epidemia virou um tema secundário. Mas deveríamos ter aprendido a reagir a um vírus que fará parte das nossas vidas por muito tempo", diz Jérôme Marty. "O vírus não faz política, seu único objetivo é se multiplicar", alfineta o clínico-geral francês.

O fim das restrições, frisa, às vésperas das eleições presidenciais de abril, é uma decisão que leva pouco em conta a questão sanitária. Nesta quarta-feira (9), a OMS lembrou, aliás, que a epidemia não tinha terminado, e muitos países têm uma taxa de vacinação insuficiente, favorecendo o aparecimento de novas variantes.

O representante do sindicato francês diz que é impossível prever a evolução do vírus, mas, nos centros de saúde onde ele atua, e nos consultórios, a alta é visível. "Temos casos positivos todos os dias", declara.

Ele recomenda, em um contexto de retomada epidêmica, a utilização das máscaras FFP2 (ou N95) em lugares fechados, que protegem o usuário. O clínico-geral francês lembra que o uso da máscara cirúrgica é inútil em espaços fechados se as outras pessoas em torno não a utilizam corretamente.

"O que me preocupa é que hoje ninguém pode afirmar com certeza quais serão as sequelas, a longo prazo, de uma infecção pela covid-19. Qual será o impacto nas pessoas que serão contaminadas 4, 5 ou 6 vezes? Não sabemos. Estamos brincando com a saúde da população inteira. Isso é uma loucura", resume.