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Dez anos após 'estourar', Keirrison supera tragédia pessoal e tem novo recomeço com o Londrina na Série B

27/04/2018 15h22

Disputar a Série B do Campeonato Brasileiro pode parecer pouco para quem já integrou o elenco de um dos maiores clubes do mundo - o Barcelona (ESP). Mas não para Keirrison. Com a humildade de quem diz se divertir jogando futebol, o atacante comemora a chance de atuar na competição pelo Londrina, time do norte do Paraná, que tenta o acesso à elite do futebol brasileiro. É lá onde o atacante busca recomeçar mais uma vez após rodar o mundo, superar lesões e, o pior de tudo, perder de um filho de dois anos, vítima de uma virose.

O futebol brasileiro que teve em Keirrison uma das grandes promessas da história recente. Depois de ter sido o artilheiro do Brasileirão de 2008, o menino de apenas 19 anos que defendia as cores do Coritiba foi negociado com o Palmeiras e não se intimidou com o peso da nova camisa - chegou marcando logo dois gols na partida de estreia, contra o Mogi Mirim (3 a 0).

O sucesso meteórico fez com que o Barcelona fizesse uma proposta ao Palmeiras e, poucos meses depois, levasse o atacante para integrar o elenco mais badalado do mundo.

- Não creio que tenha sido rápido demais - diz K9 em uma entrevista exclusiva para o programa FOME DE BOLA, uma parceria do LANCE! no YouTube.

- Quando eu cheguei para jogar no Coritiba nós criamos uma meta e o Barcelona era o clube da meta. E em dois anos eu consegui - completou.

As acusações de parte da torcida palmeirense de que ele foi mercenário não o abalam.

- Eu não passei por cima de ninguém, eu sempre respeitei quem está acima de mim, foi essa a educação que tive dentro de casa. O Palmeiras aceitou primeiro, e por último eu tomei a decisão de seguir meu caminho. Não foram só questões financeiras, foi realizar um sonho também - afirmou o jogador.

A demissão do técnico Vanderlei Luxemburgo, que reclamou publicamente da transferência do atleta, também é um assunto indigesto com o qual K9 lida bem.

- No momento eu não concordei com a atitude. Eu entendo o lado dele, respeito, porque pra mim foi um dos melhores treinadores com quem já trabalhei na parte profissional. Eu fui a última palavra pra determinar se eu iria ou não para o Barcelona. Foi aí que eu decidi junto com o clube e com as pessoas que cuidavam da minha carreira - declarou.

No Barcelona, Keirrison não foi aproveitado. O grande número de estrangeiros na equipe fez com que o jovem brasileiro não tivesse espaço. Mas isso não o impediu de aprender com o treinador da época, Pep Guardiola.

- Eu tive a oportunidade de vê-lo no dia a dia, de ele pegar individualmente cada atleta e melhorar a performance. Os treinadores têm que ver isso. O Guardiola fazia isso com os 30 atletas. Eu via que muitas vezes a imprensa e as pessoas não acreditavam mais no atleta, mas ele conseguia tirar o que o jogador tinha de bom, porque ele acredita nisso, ele transmite isso. Tá na hora dos treinadores transmitirem isso, não só ser aquele treinador de bonezinho que fica rodando 'apitinho' na beira do campo - afirmou.

Apesar desse convívio, sem chances, Keirrison foi para o Benfica de Portugal, onde acreditou que jogaria. Mas chegando lá encontrou outros atacantes no grupo, todos lutando por uma vaga no time.

- Não tenho vergonha de falar que foi um erro de escolha. Porque você chega em um clube com oito atacantes, nove comigo, e existem as pessoas que estão na fila, que estão ali trabalhando, e esperar sua oportunidade leva um tempo. E demorou muito.

Na Fiorentina, com o técnico Cesare Prandelli, teve mais oportunidades de jogar.

- Na Itália melhorei muito meu jogo. O professor teve muita paciência comigo e sempre agradeço ao Prandelli porque realmente ele foi muito parecido com o Guardiola, tentou tirar de mim o melhor sem tirar minha característica.

DOR MAIOR QUE AS LESÕES

De volta ao Brasil, Keirrison jogou no Santos, Cruzeiro, Coritiba, Londrina, passou rapidamente pelo Arouca de Portugal, e voltou ao futebol paranaense. Nesses anos todos, teve dificuldade de repetir as boas atuações e não teve sequência graças a uma grande quantidade de lesões e cirurgias nos dois joelhos. Ele achava que a dor, quase insuportável, era o pior que a vida reservava. Mas estava enganado. Quando estava no Coritiba, casado e tentando recomeçar a carreira na clube que o revelou, Keirrison teve que lidar com a perda de um filho, de apenas dois anos de idade. O pequeno Henry morreu repentinamente, vítima de uma virose.

- A cura é contínua. Eu não posso dizer pra vocês que é fácil, eu estaria mentindo, mas Deus trabalha continuamente para que a gente possa entender porquê houve isso. Eu tive a oportunidade de encontrar várias famílias que perderam seus filhos e ainda estão nessa prisão. Eu considero isso uma prisão, porque é um sentimento muito forte o de enterrar seu filho. É um processo inverso - disse Keirrison, com a maturidade de quem teve que aprender a superar a tragédia pessoal.

- Trazendo pra minha vida hoje, como propósito, eu passei por isso pra que nós possamos compartilhar e testemunhar o que Deus é capaz de fazer. Eu e minha família não seríamos capazes sozinhos, vou ser bem sincero, nós teríamos nos enterrado junto com nosso filho. O que fez nós não descermos naquele lugar foi que Deus estava conosco, a todo momento. Hoje nós continuamos de pé, felizes, alegres, porque nós sabemos que nosso filho está ao lado de Deus.

2018, UM ANO DE OPORTUNIDADES

O novo contrato com o Londrina veio junto com a nova gravidez da esposa, Hevelin. Joaquim nascerá no próximo domingo (29/04).

- Estamos muito felizes porque é realmente um presente de Deus pras nossas vidas. Já estamos comemorando muito antes a chegada dele e vamos comemorar muito mais. Estamos felizes porque é o irmãozinho do Henry que está chegando e vamos amar como a gente amou o Henry. Deus renova, ele é perfeito, ele sabe o tempo de todas as coisas.

Aos 29 anos, K9 não faz muitos planos para o futuro nos gramados. Com o jeito sereno que fez dele um goleador, vive o presente no Londrina sem pensar em quanto tempo ainda terá de carreira. Os maiores planos estão fora das quatro linhas. E incluem fraldas, mamadeiras, muito amor e humildade para recomeçar sempre.