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Em 'fase light', Mano elege melhor do Brasil e vê seleção na rota do hexa

Mano Menezes, técnico do Inter, sorri durante treinamento do time - Ricardo Duarte/Inter
Mano Menezes, técnico do Inter, sorri durante treinamento do time Imagem: Ricardo Duarte/Inter

Marinho Saldanha

Do UOL, em Porto Alegre

09/09/2022 04h00

Classificação e Jogos

O tempo nos dá algumas coisas. Talvez a principal delas seja a sabedoria para lidar com qualquer tema de uma forma solta e ainda assim consciente. Este é o Mano Menezes de hoje em dia. Vivendo uma 'fase light', aos 60 anos ele não foge de qualquer assunto, ainda que evite polêmicas desnecessárias, como o debate entre treinadores brasileiros e estrangeiros no Brasil. Com um sorriso no rosto, o técnico lida com as mais diversas situações, como a pressão dos torcedores ávidos por vitórias.

"A gente vai fazendo aniversário. Este ano fiz 60 anos. São datas marcantes, quando se atinge essas datas redondas, invariavelmente as pessoas fazem um balanço, olham para trás, o caminho que já percorreu, já não tem mais tanta coisa para frente. E se passa a valorizar as coisas que são mais importantes", disse.

Em entrevista de quase 40 minutos ao UOL Esporte, o treinador do Internacional elegeu o Palmeiras como time de melhor futebol no país hoje em dia. Falou sobre sua fase e a reconstrução do Colorado, que entrou no Brasileiro temendo lutar apenas para evitar o rebaixamento e atualmente está firme nas primeiras posições. Ainda elogiou os treinadores do país e revelou uma pontinha de esperança em retornar à seleção no futuro. "Vamos fazer de tudo para conquistar títulos aqui no Inter e, então, quem sabe voltar a ser lembrado", disse.

Sobre a Copa do Mundo, competição que não teve a oportunidade de disputar quando comandou o Brasil, afirmou que vê o time de Tite como postulante ao hexa e reforçou que não guarda qualquer mágoa de ter sido alijado do processo antes da competição mais importante do futebol.

Confira a entrevista exclusiva de Mano Menezes ao UOL Esporte

Mano Menezes, técnico do Internacional, durante treinamento - Ricardo Duarte/Inter - Ricardo Duarte/Inter
Imagem: Ricardo Duarte/Inter

UOL: Observando você à distância, se nota que você parece muito feliz com o que está acontecendo. Com trabalho, com o clima, com o ambiente... É verdadeiro isso?
Mano:
A sequência e a evolução do trabalho deixam a gente mais confiante ou não. As coisas começaram a caminhar bem, as melhoras são significativas. Isso vai dando mais naturalidade. Eu sempre me dediquei muito ao dia a dia porque acredito muito nisso. Mas à medida que as coisas vão evoluindo aumenta a confiança interna em todos. Quando o grupo de jogadores está mais confiante, isso certamente influencia no bom andamento do trabalho da gente.

UOL: Essa relação com o clube, a torcida... Já se viu você conversando com o torcedor que fica perto do reservado durante os jogos, na última fila de cadeira, se percebe você à vontade no clube...
Mano:
O futebol para o treinador ficou mais difícil. Com as novas arenas, novos estádios, o torcedor se aproximou do treinador. E ele passa a ter um contato mais próximo, consegue ser ouvido pelo treinador ou pelo banco de reservas. Daí você tem dois caminhos. Te irrita e reage ou brinca e tenta minimizar determinadas coisas, seja com o adversário ou a nossa torcida. Quanto mais ao nosso lado tiver o nosso torcedor, melhor é para a gente conduzir o trabalho na beira do campo que é duro.

UOL: A fase que você se encontra na carreira, também facilita para isso, Mano? Porque você já passou por muita coisa, foi técnico da seleção, viveu grandes momentos, títulos, e fases não tão boas assim... Hoje está mais maduro, experiente...
Mano
: A gente vai fazendo aniversário. Este ano fiz 60 anos. São datas marcantes, quando se atinge essas datas redondas, invariavelmente as pessoas fazem um balanço, olham para trás, o caminho que já percorreu, já não tem mais tanta coisa para frente. E se passa a valorizar as coisas que são mais importantes, se consegue deletar as menos importantes. Tentar se irritar menos com elas, tentar deixar influenciar menos no teu andamento. Este é o momento que eu atravesso na minha vida e na minha carreira.

UOL: É, não sei se o melhor momento, mas um momento seguro, feliz, satisfeito com o que está acontecendo? Ou até uma fase mais light, digamos assim?
Mano
: Me deixa mais próximo do que eu gostaria de ser como pessoa e profissional. Isso às vezes se passa momentos mais ríspidos e duros, e quem gosta de ganhar como eu, que trabalhei a vida inteira para vencer, enfrenta esses momentos também com rispidez. Às vezes se passa a imagem de ser um cara mais turrão, brigão, e eu nunca fui esse cara no dia a dia normal. Então, acho que esses momentos vão me permitir passar mais o que eu sou, como eu gostaria que as pessoas lembrassem lá na frente.

UOL: Quando você assumiu o Inter, a torcida vivia uma desconfiança muito grande do time. Vaias, medo de brigar para não cair. E tudo isso mudou. Como estava o ambiente, como estava o vestiário, o que mais te preocupou e o que você fez para transformar a desconfiança em esperança?
Mano:
Não acho que as coisas aqui estavam em uma gravidade tão grande que não permitisse a gente reagir. Quando você é convidado a fazer um trabalho, e este trabalho está no meio do curso, ou com caminho andado, você leva em consideração o potencial do grupo que se vai assumir. E era possível sentir, olhando de fora, que o grupo do Internacional tinha um potencial muito bom. E que não estava rendendo aquilo que poderia render. As causas pelas quais isso não acontecia às vezes são bem complexas. Quando eu chego num trabalho nunca gosto de olhar para trás. Gosto de estabelecer o que acho que seja importante para que as coisas andem bem para frente. Foi o que a gente fez. Não tem muito segredo, muito plano certinho, objetivo. Você vai encontrando coisas e dirigindo para o caminho que acha mais correto, e eu defendi sempre, em todos os lugares que trabalhei, tem que ter um trabalho organizado. E isso vai desde o dia a dia do trabalho, escolha de jogadores, números um, dois, três, das posições, para que os jogadores entendam. E a organização tática da equipe. Às vezes se escolhe isso e as coisas não dão certo. Isso atrasa o processo, gera insegurança, e às vezes as trocas de treinador não surtem o efeito que surtiu aqui. A gente foi muito feliz nas primeiras escolhas, o time começou a render bem, fazer resultados, e isso ajudou muito para que novas decisões fossem tomadas e isso fez com que a equipe crescesse e se estabilizasse como está hoje.

Diferenças de orçamento, futebol brasileiro

Mano Menezes comanda o Inter contra o Corinthians, pelo Brasileirão - JHONY INACIO/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO - JHONY INACIO/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO
Imagem: JHONY INACIO/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO

UOL: Você não recebeu muitos reforços no Inter ou pode escolher este ou aquele jogador, porque o orçamento do clube não autoriza isso. Se fala muito no futebol brasileiro que pode acontecer a 'espanholização', com clubes com orçamentos maiores do que outros, que acabem levando os melhores jogadores e desequilibrando a disputa pelo título. Você acha que isso vai acontecer ou já está acontecendo, com clubes como Flamengo, Palmeiras, Corinthians, Atlético-MG...
Mano:
Existe no Brasil hoje uma diferença significativa de clubes para outros. Começa com as duas maiores torcidas do Brasil, uma com 40 milhões, outra com perto de 36 milhões, que são Corinthians e Flamengo. Quando se tem um potencial desse tamanho, você já tem uma receita muito diferenciada, trabalha com um publico quatro vezes maior que a grande maioria. Se isso é bem gerido por eles, já temos uma diferenciação. E isso também nas cotas de televisão. O que eu acho o adequado? Não caminhar para ter uma diferença tão grande deste ou daquele para os demais. O exemplo tem que ser a Premier League, que se preocupa em diminuir essas diferenças mesmo considerando os diferentes. Porque o equilíbrio é que faz uma competição mais bonita, mais atraente, e possibilita elevar o nível de todos. Assim teremos um produto melhor pra mostrar e vender para o mundo, e tornar algo que é fundamental para o brasileiro, que é tornar possível ser campeão. Não vejo o torcedor brasileiro vivendo situações como na Europa em que os clubes passam 40 ou 50 anos sem conquistas e o torcedor é extremamente fiel. O brasileiro gosta de vencer, é visível e notório que ele vai mais no estádio quando a chance do clube dele ser campeão aumenta. Não vai haver igualdade, não precisa. Mas sem dinheiro nenhum é impossível enfrentar quem tem muito dinheiro, não se consegue fazer uma equipe. Se os valores são próximos, considerando os diferentes, é possível fazer times com capacidade de ser campeão.

UOL: Comparando com outros países do continente, o Brasil está acima dos times de outros países? Neste ano três dos quatro finalistas das competições continentais são brasileiros. Ano passado os quatro foram brasileiros...
Mano:
A economia está ligada às diferenças. Embora o futebol seja cíclico. Há três anos já existia uma diferença econômica, mas quem dominava a América Latina era o River Plate. Há alguns anos foi o Boca Juniors, recentemente o Flamengo, agora o Palmeiras, que vai perder a hegemonia porque foi eliminado na semifinal. Sempre tem aqueles que fazem bons trabalhos e tem um resultado cíclico de dois ou três anos entre os primeiros. Mas a diferença econômica estendida em períodos grandes vai influenciar para o lado do Brasil neste sentido que falamos.

UOL: Quem é que está jogando melhor no Brasil hoje na tua opinião?
Mano:
Eu sempre penso que quem está vencendo as competições, está jogando melhor. Pode não ser o futebol que te agrada mais ou me agrada mais, mas para mim é o melhor. Para você ser bicampeão da Libertadores e liderar o Brasileiro como o Palmeiras está há bastante tempo, é porque você é melhor, está melhor. Por isso, para mim, o Palmeiras é o time que está jogando o melhor futebol até agora. Se daqui para frente teremos outra realidade, daí vai depender de quem se colocar como melhor.

Estrangeiros no Brasil, curso em Portugal, brasileiros na Europa

Observado por Mano Menezes, Abel Ferreira gesticula durante Palmeiras x Inter, jogo do Campeonato Brasileiro - Carla Carniel/Reuters - Carla Carniel/Reuters
Imagem: Carla Carniel/Reuters

UOL: Você sucedeu um treinador estrangeiro no Inter e teve mais sucesso do que ele estava tendo. O teu amigo Dorival Jr, no Flamengo, também sucedeu um estrangeiro e teve sucesso superior ao que ele tinha. É diferente substituir um estrangeiro, e existe realmente mais paciência com treinador estrangeiro hoje em dia?
Mano:
É um assunto bem complexo. Não classifico treinador pelo país. Isso não tem sentido nenhum. É como se disséssemos que os treinadores gaúchos eram melhores do que os paulistas. Não é porque você nasce no Rio Grande do Sul ou eu São Paulo que será melhor. Aqui no Internacional, nos grandes momentos da história, o treinador era paulista, em Brasileiros, depois foi campeão invicto com seu Ênio [Andrade], que era gaúcho, e ganhou Mundial com Abel [Braga] que era carioca. Você vai vendo que essas coisas não servem de ponto de partida para uma discussão, nem se deve valorizar isso, senão se reduz a discussão a: se está falando isso porque é brasileiro, ou estrangeiro. Essa coisa a gente deve evitar. Não é bom para a discussão mais profunda. Existem técnicos de um nível ou de outro, como jogadores de um nível ou de outro, como jornalistas de um nível ou de outro. É assim que é. Sempre foi assim. O mais importante é entender as dificuldades que passam quando chegam, a maioria precisa de adaptação, não é fácil chegar a outro país, desconhecer como se joga, a cultura, eu já trabalhei fora e sei como é isso. Talvez a exceção seja o Jorge Jesus, que foi algo muito atípico, os demais também precisaram deste período, e alguns não conseguiram passar por isso porque a cobrança é muito grande nos grandes clubes. Se quer resultado, se não vem, atrapalha o trabalho. É competência de cada um, o entendimento que se tem do lugar em que está, às vezes o estágio que o clube está atravessando, também influencia, porque no milagre não se muda o que tem dificuldade. É caso a caso, situação a situação, e depois se formar opinião sobre um caso específico, independente da nacionalidade.

UOL: Você foi a Portugal estudar recentemente, em 2013... Partiu de ti essa ideia de especialização, e como eles encaram um treinador brasileiro buscando conhecimento?
Mano:
Quando eu fui a Portugal, nós ainda não tínhamos a nossa formação da CBF, ainda estávamos engatinhando no curso de formação de treinadores. Eu já sabia que existia em Portugal há bastante tempo uma formação não só voluntária, mas obrigatória. A Uefa exigia, e os portugueses também, que tivessem uma formação para dirigir as Ligas do país e do continente. Consegui receber um convite da Federação Portuguesa para fazer um curso com eles da Uefa Pró, o último estágio de formação de treinadores. Fiquei 45 dias em Portugal, com a maioria dos treinadores portugueses, entre eles o Abel Ferreira, o Victor Pereira. O Abel foi meu colega mais tempo, o Victor Pereira só veio revalidar a licença porque já tinha, de três em três anos tinha que revalidar. Convivi com eles e tantos outros portugueses naquele período. Foi algo voluntário meu, mas achei que agregaria bastante. Eram dois brasileiros, eu e o Jorvam Vieira, que trabalhava no mundo árabe.

UOL: Eles tinham curiosidade sobre o futebol brasileiro?
Mano:
O pessoal respeita muito o futebol brasileiro no mundo todo, e Portugal muito mais. Porque passaram muitos treinadores brasileiros lá. E até então, o melhor resultado da seleção tinha sido com um treinador brasileiro, que era o Felipão. Tinha um respeito muito grande, fui tratado com muito respeito.

UOL: Como era o Abel Ferreira na turma?
Mano:
O português tem uma característica muito marcante de ser muito direto para falar as coisas, nós nem estamos tão acostumados com isso. Nós nos ofendemos muito, por qualquer coisa, e às vezes nem falamos algo tão direto por achar que a outra pessoa vai se incomodar. O português fala muito mais direto entre eles. E discute de forma muito mais direta também. Determinados temas, discutiam 30 minutos, e se você não estiver bem preparado, você acha que estão brigando pela maneira tão enfática que defendem seu ponto de vista. Se aprende muito com eles, e uma das coisas que aprendi foi não ter muito melindre de falar o que tem que falar, porque se vive num mundo de resultado e performance. Tem que se respeitar, mas as coisas têm que ser ditas.

UOL: Por que não tem um treinador brasileiro em um clube top da Europa?
Mano:
Já tivemos, Felipão, Parreira, mas sem querer entrar muito no mérito, porque às vezes nem tem todos esses porquês... Os portugueses viraram treinadores renomados na Europa muito por causa do Mourinho. Os treinadores que chegam abrem caminho para os outros. Por que muitos brasileiros trabalharam no Mundo Árabe? Porque os primeiros fizeram bons trabalhos, marcaram posição. Os que vieram depois foi por isso. Os portugueses foram assim. O Mourinho veio primeiro, abriu caminho. Eles têm um embasamento teórico muito bom em sua metodologia de trabalho, uma coisa que nós agora começamos a construir no Brasil. Aqui há muito entendimento empírico, formação subjetiva, se trabalha muito bem, mas quando se vai demonstrar isso aos outros, tínhamos uma certa dificuldade porque nunca tivemos preparação para isso, foi outro tipo de formação que tivemos. Eu entro numa livraria em Portugal e vou no departamento de esportes, de futebol, e tem 50 livros de técnicos portugueses. Quantos temos de brasileiros? E quando temos, é mais contando a história da conquista do que a essência da conquista. Precisamos fazer mais isso. E é um exercício que leva outras pessoas a fazer e se começa a melhorar sua explanação teórica do que você já entende bastante, e o técnico brasileiro entende bastante. Nenhum técnico no mundo tem a capacidade de adaptação que o técnico brasileiro tem...

UOL: Adaptação ao elenco?
Mano:
Adaptação a tudo. Às dificuldades, incertezas, falta de objetividade que às vezes se tem, quando não tem uma política desenhada dentro dos clubes, uma filosofia clara. É uma caminhada, e se vai caminhando e ajustando as coisas. E o técnico brasileiro é muito bom nisso. Se ele é bom nisso, será muito melhor numa condição de trabalho mais estabilizada, planejada... O futebol brasileiro vai caminhar para este lado. O aparecimento das SAF vai exigir dos profissionais um entendimento melhor. De não ver o futebol apenas com resultado positivo no final, mas um exercício positivo, contábil, de custo e benefício, coisas que antes a gente não tinha preocupação. Agora terão que responder a isso, dar resultado ali, e isso vai engrandecer e evoluir muita gente.

UOL: Essa adaptabilidade não tem duas mãos, Mano. Se olha o treinador brasileiro, que se adapta a qualquer situação, mas em relação ao estrangeiro, ele já vem com uma ideia, com um modelo dele, uma forma dele bem clara...
Mano:
A medida que a gente se adapta, se tem vantagens, mas às vezes a gente cede muito. Se ouve muito de jogadores: eu aprendi taticamente ou me desenvolvi taticamente jogando na Europa. Sabe o que acontece na Europa? É o seguinte: as funções do time são essas aqui. Você se enquadra em qual? Eu me enquadro aqui. Bem, aqui você faz isso, isso e isso. Quem não faz tudo isso, não joga nessa posição e não joga em nenhuma. Aqui no Brasil damos um jeito do jogador jogar, porque se acha que fulano é muito importante, é muito talentoso... Ah, mas ele joga de meia por dentro, de extrema... Mas tem dificuldade de marcar o lateral. Mas vamos dar um jeito de proteger para não marcar o lateral quando perder a bola, para tirarmos o melhor dele quando tivermos a bola. Na Europa não se dá jeito. Então você tem que jogar como a função exige, senão você não joga. Essa condescendência brasileira, do técnico, criou uma ideia de que taticamente ele é menos desenvolvido. Isso não é verdade. Em conversas internas já falei muito isso com meus colegas. Temos que parar de ser bonzinhos. Temos que exigir do jogador que cumpra função. A função é essa. Não tem meia função, tem que cumprir ela inteira.

UOL: O jogador de futebol se escora nisso?
Mano
: É porque tem outro aspecto no Brasil que na Europa é menos. Se o jogador não jogar, ninguém vai ficar defendendo porque ele não joga, o que houve, nada. Não consegue entregar, não joga por isso. No Brasil há um apelo. Fulano tem que jogar, como fulano não joga? Os melhores têm que jogar, é uma frase muito nossa. E aí você está num mundo em que quer ter teu espaço, se alguém te ajuda mais a ter teu espaço, você abraça a tese. Se alguém te prejudica, você se coloca contra. É por isso que os técnicos e trabalhos são tão frágeis no Brasil.

UOL: Como se vive nesse caldeirão de interesses?
Mano:
Temos que ser o mais profissional possível, e caminhamos para isso. Se não for assim, não conseguiremos avançar nunca, e vamos até regredir. Agora estamos vivendo, com as chegadas dos técnicos de fora, um momento importante do futebol brasileiro. Se começar a acontecer com eles o mesmo que acontece com os brasileiros, e se fizermos um levantamento já acontece bastante, do treinador trabalhar três meses e já ter o trabalho interrompido, vai prejudicar a vinda de outros profissionais, porque eles vão se questionar: Lá no Brasil é muito bom, mas não se consegue realizar o trabalho. Isso não é bom para nada.

Seleção brasileira e a Copa do Mundo

2011 - Técnico da seleção brasileira, Mano Menezes conversa com Neymar durante treino para a Copa América - ALEX SILVA/AE - ALEX SILVA/AE
Imagem: ALEX SILVA/AE

UOL: Esse ano tem Copa do Mundo, como você vê o Brasil neste processo?
Mano:
O Brasil está bem preparado e postulante ao título. Temos um trabalho de seis anos com o mesmo técnico, é tudo que a gente pregava que deveria acontecer. Se via nas outras seleções, como a Alemanha, quando ganhou da gente, a discussão foi sempre em torno disso, tinha continuidade. Hoje estamos neste estágio. Temos esta preparação que eu julgo o mais importante, por experiência própria. Se aprende e se amadurece muito na caminhada da seleção. Se conhece um jogador internacional alto, de seleção, se tem mais parâmetro de comparação e as avaliações são melhores.

UOL: Quem são os concorrentes?
Mano:
França tem uma seleção, em termos de potencial, com um trabalho muito próximo do Brasil, com técnico há muito tempo, com jogadores capazes de sustentar essa ideia com destaques individuais. Nossa companheira de continente [Argentina] está de volta, bem organizada, e com jogadores muito próximos do nível dos brasileiros. Não tanto individualmente, mas coletivamente, tem um comportamento forte de competição, e que iguala muitas coisas sempre. Tenho visto a Holanda de novo começando talvez a evoluir novamente, junto com ideias do Van Gaal, que é um treinador de personalidade forte e que faz a Holanda se tornar mais competitiva. Talvez esteja por aí. Não foge muito disso.

UOL: No fundo do coração, você guarda mágoa com a seleção, no processo quase todos mas interrompido antes de chegar na Copa
Mano:
Não guardo mágoa de nada no futebol. O futebol só me deu coisas boas. Ter tido a oportunidade de treinar a seleção brasileira para mim é um orgulho bastante grande. Tenho um pouquinho de frustração porque todo treinador que não termina um trabalho fica frustrado. Mas eu sempre falo que as pessoas têm o direito de escolher com quem querem trabalhar, não são fáceis as escolhas que têm que fazer.

UOL: O Tite já disse que depois da Copa do Mundo vai deixar a seleção independente do resultado. Você acha que o treinador a ser contratado será brasileiro ou estrangeiro? Você tem o sonho de voltar a receber chance na seleção?
Mano:
Não sei o que eles pensam lá, não conheço a cabeça dos dirigentes atuais para saber se será brasileiro ou estrangeiro. Eu penso que deveria ser nacional, mas é opinião minha. Acho que ser técnico da seleção não pode vir do nada. Existem técnicos hoje que estão nos últimos anos conquistando coisas importantes no futebol brasileiro. São esses que devem estar preferidos para serem escolhidos para substituir o Tite.

UOL: Mas tu guardas uma esperança?
Mano:
Quando eu conquistar no Inter, vamos pensar nisso. Vou trabalhar muito para conquistar algo no Inter, e então poder pensar nisso.

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