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De ídolo a homem de negócios, Ronaldo tem tudo a ver com a seleção atual

Ronaldo se emociona em sua despedida dos gramados atuando pela seleção brasileira, no Pacaembu - Almeida Rocha/Folhapress
Ronaldo se emociona em sua despedida dos gramados atuando pela seleção brasileira, no Pacaembu Imagem: Almeida Rocha/Folhapress

Dassler Marques, João Henrique Marques, Pedro Ivo Almeida e Pedro Lopes

Do UOL, em São Paulo e em Sochi (RUS)

15/06/2018 04h00

As arrancadas letais com a camisa 9 amarela são coisa do passado, e Ronaldo não ocupa nenhum cargo na CBF ou na comissão técnica de Tite. Engana-se, entretanto, quem pensa que o Fenômeno está distante da realidade da seleção brasileira: para o elenco que se prepara em Sochi para a disputa da Copa do Mundo, o artilheiro brasileiro em Mundiais ocupa espaços como ídolo, amigo, olheiro e até empresário. A presença, inclusive, vai muito além da estadia em Moscou e da aparição especial na cerimônia de abertura realizada nesta quinta-feira.

Boa parte do grupo atual da seleção cresceu assistindo aos gols e dribles de Ronaldo e surgiu no futebol quando ele fazia a transição de jogador do Corinthians a empresário do meio esportivo. A idolatria evoluiu para amizade e, em alguns casos, mais do que isso. Antes na 9ine e atualmente na Octagon, o ex-atacante tem clientes e parceiros vestindo a camisa da seleção, transformando sua influência em negócios e até indicando contratações a gigantes europeus que defendeu quando era atleta.

Amigo, conselheiro e parceiro de Neymar. Olho clínico para Jesus

Ronaldo e Neymar se aproximaram e desenvolveram amizade desde 2011 - Ricardo Nogueira/Folhapress - Ricardo Nogueira/Folhapress
Imagem: Ricardo Nogueira/Folhapress

Ronaldo hoje tem laços estreitos com dois dos principais atacantes da seleção. Em meio a muitas amizades que conectaram as partes, as aproximações com Neymar e Gabriel Jesus se transformaram em oportunidades de negócios.

Logo depois de se aposentar dos gramados, em 2011, Ronaldo lançou a agência de marketing esportivo 9ine, que embora tenha encerrado suas atividades em 2016, teve ascensão meteórica na época do lançamento. A transição de jogador para empresário se apoiou na explosão de Neymar ainda no Santos, em 2012, com a agência se aproximando de Neymar pai e intermediando importantes contratos de patrocínio com marcas como Claro, Listerine e L’oreal.

A parceria comercial durou até 2016, mas sempre teve por trás uma relação de amizade e admiração entre boleiros que existe até hoje. Ronaldo jogou pôquer com Neymar enquanto o camisa 10 da seleção se recuperava da fratura no metatarso do pé direito e os dois jantaram juntos antes da apresentação do elenco na Granja Comary. Agora como conselheiro, e não mais sócio de negócios, o Fenômeno ainda pode influenciar na carreira do amigo. Embaixador do Real Madrid, ele tem, em conversas, aconselhado a troca de Paris pela capital espanhola.

A experiência com Neymar virou bagagem e uma segunda promessa capturou a atenção de Ronaldo. A aproximação com Gabriel Jesus começou ainda em 2015, quando o então palmeirense tinha 18 anos. A 9ine viu no atacante um potencial que ia além dos gramados e iniciou conversas sobre a possibilidade de um projeto de gestão de imagem. Na época, a empresa negou o interesse comercial, reforçando a ideia de uma relação de amizade e admiração; ela de fato existia, mas o Fenômeno, ainda naquele ano, chegou a indicar a contratação para clubes italianos em que tinha bom trânsito dos tempos de atleta.

Hoje, o vínculo é oficial, e a Octagon, nova empreitada de Ronaldo, cuida desde junho do ano passado da imagem de Gabriel Jesus. A relação pessoal também é cada vez mais estreita, e Jesus tem no ex-camisa 9 da seleção seu principal ídolo. “Ele é um cara em que eu sempre me espelhei. Conhecendo ele então, eu pareço ainda mais com ele. Às vezes as pessoas comparam nós dois, mas é difícil ser comparado a alguém como ele. Ronaldo é único, assim como Neymar, Ronaldinho Gaúcho”, disse Jesus, em 2017.

A maioria dos assuntos envolvendo Gabriel na Octagon passa diretamente por Ronaldo. “Aprendiz” de Fenômeno, o atual camisa 9 da seleção brasileira é a “menina dos olhos” da empresa e recebe atenção constante.

Entre idolatria e amizade, o “presidente” é quase onipresente 

Neymar posa com jogadores do PSG e seleção brasileira - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Imagem: Reprodução/Instagram

Na reta final de sua trajetória na seleção brasileira, entre 2006 e 2010, Ronaldo resumia sua influência no apelido “presidente”, gíria no futebol que indica quem é o líder da resenha, o mais respeitado entre os boleiros. A “gestão Ronaldo” oficialmente acabou, mas para além dos negócios com Jesus e Neymar, seu legado permanece espalhado em relações com vários jogadores, dos mais novos aos mais experientes.

Um dos mais próximos, Marcelo convive bastante e frequenta a casa do Fenômeno, em encontros que muitas vezes trazem papos até as madrugadas e contam com a presença do ex-lateral Roberto Carlos. O volante Paulinho, ao acertar com o Barcelona em 2017, disse que teve em Ronaldo, com quem atuou no Corinthians, o espelho mais importante em sua carreira.

“Eu queria ser a pessoa e não o jogador. A forma com que ele [Ronaldo] levava a vida dele, dentro de campo, não tinha o que questionar, foi o meu maior espelho. E depois também com Roberto Carlos, mas acho que meu maior exemplo é o Ronaldo. Foi uma pessoa que me ensinou bastante”, disse, na época, ao site oficial do clube catalão.

Casemiro não tem tanta proximidade quanto Marcelo, seu colega de Real, mas convive bastante com o Fenômeno em Madri. Mais novo, cresceu vendo o camisa 9 em ação e não conteve a alegria quando soube que o armário que herdou no Santiago Bernabeu era o mesmo utilizado por Ronaldo quando foi um dos galácticos.

A influência atinge até quem era criança quando o centroavante viveu seu auge. Firmino tinha apenas dez anos em 2002, quando Ronaldo marcou dois gols na final da Copa do Mundo da Coreia e do Japão. Apesar da pouca idade, a idolatria era tanta que o agora atacante do Liverpool repetiu em seus cabelos o peculiar corte “cascão”, eternizado naquela partida e que acabou virando símbolo da conquista.

Dos fisioterapeutas da seleção, dois têm relação muito próxima com Ronaldo. Caio Mello foi casado com a irmã do ídolo, com quem tem dois filhos, e mantém relação de amizade. Bruno Mazziotti ganhou projeção ao tratar o Fenômeno quando este voltou ao Brasil, indo posteriormente ao Corinthians e adquirindo proximidade com Tite.

Tite repete tratamento dado a Ronaldo com Neymar

Ronaldo atuou no Corinthians sob o comando de Tite em 2010, antes de se aposentar - Adriano Vizoni/Folha Imagem - Adriano Vizoni/Folha Imagem
Imagem: Adriano Vizoni/Folha Imagem

Ronaldo se despediu do futebol sob o comando de Tite em 2011, depois de trabalhar com o treinador ao longo de 2010 no Corinthians. Os dois se conhecem bem e o comandante da seleção chegou a dizer, em maio do ano passado, que utiliza o tratamento dado ao Fenômeno no Parque São Jorge com Neymar e outros jogadores da seleção.

“Talvez eu consiga explicar citando Ronaldo. Treinei ele no Corinthians, já no final da carreira dele. Eu tratava ele com a mesma lealdade e sinceridade, sendo honesto, com que trato Neymar e os outros, Coutinho, Daniel Alves”, disse ao jornal Sport, na Catalunha, ao explicar a regularidade de Neymar com a camisa da seleção.

A seleção brasileira que se prepara em Sochi está “sob nova direção”, dada por Tite, Neymar, Gabriel Jesus e o resto dos jogadores e comissão técnica. Dentre os que não estarão em campo ou diretamente envolvidos com o trabalho, poucos têm tanta influência quanto Ronaldo. O legado do "ex-presidente" vai muito além das conquistas e dos 67 gols em 105 partidas.