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Samuel Pupo e João Chumbinho: a nova dupla do Brasil na elite mundial

Samuel Pupo vai estrear na elite da WSL em 2022 - WSL
Samuel Pupo vai estrear na elite da WSL em 2022 Imagem: WSL

Colunista do UOL

14/12/2021 04h00

Dois jovens na idade, mas muito experientes quando o assunto é competição. E a partir de agora, eles estão com status renovado.

O carioca João Chumbinho, e o paulista Samuel Pupo podem encher o peito e gritar que alcançaram a meta de fazer parte da principal divisão da World Surf League (WSL).

Ambos chegaram ao Havaí no finalzinho de novembro, dentro da bolha dos 12 atletas que subiriam para a elite. E a confirmação veio na etapa decisiva do Challenger Series —circuito da divisão de acesso— realizada em Haleiwa. Em 2022, começa a jornada no "outro patamar".

Jovens de famílias de surfistas, eles estão prontos para encarar o desafio.

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João Chumbinho, surfista brasileiro
Imagem: Saquarema Surf Festival/Divulgação

Irmão de Lucas Chumbo —campeão mundial de ondas gigantes—, João não vê a hora de enfrentar Gabriel Medina na famosa e temida bancada de Pipeline. Cria de Saquarema, ele volta a colocar o estado do RJ no topo do tour depois de 7 anos de espera. O último havia sido Raoni Monteiro, outro local das poderosas ondas do "Maracanã do Surfe".

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Samuel Pupo, novidade do CT em 2022
Imagem: WSL

Filho e irmão de tops do esporte, Samuel —acostumado com as clássicas direitas e esquerdas de Maresias, no litoral norte de SP— espera realizar o sonho de disputar uma bateria no CT com Miguel, o mais velho dos Pupo. "Fiquei muito feliz com toda a torcida, recebi milhares de mensagens, foi demais".

Ainda curtindo a vibe pela classificação inédita para o WT, eles bateram um papo exclusivo com o @surf360_.

O dia da classificação foi bem diferente para vocês dois. Um foi eliminado cedo da etapa de Haleiwa e precisou torcer na areia, o outro conquistou a vaga dentro da água, chegando à decisão. Sensações, pressões e tensões bem diferentes, né?

João Chumbinho - Foi bem preocupante essa situação de ranking. A gente chega no Havaí e as coisas acontecem ou a seu favor ou contra. O tipo de lugar onde realmente tudo pode acontecer. O ranking sempre muda muito aqui. Eu tentei manter o foco, a minha primeira bateria foi muito bem surfada, consegui ficar bem calmo e fazer o meu trabalho. Mas na segunda, estava totalmente em outro ritmo e acabei perdendo. Aí, comecei a fazer os cálculos e vi que a combinação era bem difícil pra me tirar. E quando o Jacob perdeu (australiano Jacob Willcox), foi o alívio. Fui pra casa, a WSL estava fazendo as contas e em quinze minutos eu tava confirmado.

Samuel Pupo - É muita pressão. Às vezes, não só a sua pressão, mas tudo o que rola em volta. Todos os atletas que estavam perto de classificar ali no palanque junto comigo... e eu era um dos únicos ali vivos. Então, você sente aquela vibe pesada, mas eu senti que estava com um grupo muito bom, o Marcinho e a família dele que são do Havaí, e o Deivid Silva, um cara que não é da minha família, mas que entende muito de surfe e conseguiu me passar muita calma para eu ir bem para a bateria.

Em 2019, você tinha chegado com chance e bateu na trave. Como você usou aquela frustração para trabalhar a mente desta vez?

SP - Eu cheguei na mesma posição daquela vez e eu fui pra o Havaí com meu irmão e minha irmã. Eles estavam tão nervosos quanto eu, e antes da bateria eles não conseguiram passar a tranquilidade que eu precisava. Não foi por causa disso que não consegui entrar, tudo ali me deixou muito nervoso. Esse ano optei por ir sozinho e deu tudo certo.

chumbinho - Divulgação/WSL - Divulgação/WSL
João Chumbinho, novo representante do Brasil no CT
Imagem: Divulgação/WSL

O Rio de Janeiro não tinha um atleta na elite desde 2014, e agora você vai representar o estado. O último havia sido Raoni Monteiro, outro surfista de Saquarema. Como vai ser trazer o RJ de volta ao tour?

JC - Eu tenho muito orgulho do meu estado. A gente não pode simplesmente deixar de lado o que a gente é ou de onde a gente vem, a origem, né. Sempre fui muito bem tratado onde eu moro, tive um carinho enorme pelas pessoas. Sempre vou honrar a camisa do RJ. Por mais que eu ache que o Rio tenha as dificuldades e a diferença enorme de onda, comparado à São Paulo e ao sul do país, eu sempre vou dar o meu máximo se precisar treinar o dobro que todo mundo pra compensar. Ser o único representante do RJ hoje em dia, é muito especial. Espero que consiga incentivar, nem que seja só mais um atleta a fazer exatamente o que eu fiz: nunca desistir e sempre deixar as coisas bem simples na sua cabeça. O que você precisa fazer quando é novo, é estar ali na água, levar seu coração para as coisas que você faz e dar o gás. Representar depois do Raoni (Monteiro) e o Léo (Neves —ícone de Saquarema que morreu afogado em 2019), de quem tive a oportunidade de estar bem próximo... foram exemplos, e eu pude tirar as coisas boas e ruins. Me sinto honrado, os dois sempre acreditaram, me olhavam na rua ou treinando, nunca deixaram passaram a oportunidade de passar para mim a mensagem de que eu era capaz.

Vocês dois fazem parte de família de surfe. Como foi a influência de pai e irmão mais velho? As lições de caras mais experientes no esporte?

SP - Comecei a surfar por causa deles, sem ter essa base não estaria aqui hoje. Deixaram um caminho já bem traçado, porque já convivia neste mundo do surfe, assistindo meu pai (Wagner Pupo foi profissional durante vários anos) e meu irmão (Miguel)... e desde cedo eu já queria entrar na competição. Ou seja, foi muito bem encaminhada, nem precisei olhar para os lados. Desde que comecei, sempre fui apaixonado. Acho que isso diferencia eu e o João da nossa geração, a gente tem muito amor pelo surfe e quer ficar o dia inteiro na água.

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Samuel Pupo rasga forte durante a etapa de Haleiwa
Imagem: WSL

O que achou deste formato do Challenger Series? Ficou mais difícil conseguir o acesso?

SP - A gente está bastante acostumado com as mudanças, mas acredito que esse ano foi o mais difícil de classificação. Foram pouquíssimas etapas e muito surfista bom no mesmo lugar, cento e poucos surfistas que são simplesmente incríveis, com nível de surfe muito alto. Antes, a gente tinha 30 ou 40 etapas para alcançar 5 bons resultados.

JC - Ficou bem complicado porque enxugou muito. Ao mesmo tempo muito equilibrado e forte, com período de tempo muito curto. A pandemia foi um fator muito diferente para a nossa geração. Nenhum surfista tentando a classificação para o CT, teve o mundo literalmente parado para treinar quase um ano e meio... pra disputar 4 etapas. Por exemplo, Caio Ibelli ou Miguel Pupo, quando entraram na elite, o número de baterias vencidas e a porcentagem de experiência deles são muito maiores do que eu e o Samuel.

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João Chumbinho em ação durante uma das etapas do CS 2021
Imagem: WSL

Como é entrar no tour da elite e estrear logo em Pipeline?

JC - Começar em Pipe vai ser alucinante. É a etapa que eu sempre sonhei, assim como Teahuppo e Bells Beach, tem muita tradição, há muito tempo no circuito. E é até engraçado, porque a partir do momento que a gente pegar a lycra, a gente vai ser Pipemasters, né... o nome do campeonato. Nem passava nas nossas cabeças as coisas que agora estão passando. Então vou tentar aproveitar essa oportunidade ao máximo, já treinei muito naquela onda. Comparada a outra do CT, posso dizer que tenho conhecimento e pode ser um início bom.

O que é preciso melhorar na performance para encarar de frente os melhores do mundo?

SP - Melhorar um pouco mais o meu físico, ficar mais preparado. Melhorar minha técnica no surfe de borda., que no CT esse quesito é muito mais elevado, e tem muitas etapas em que não vou conseguir usar a minha melhor arma, que seria o aéreo. Sempre tem muitos pontos para melhorar e é isso que é interessante de ser um surfista, você nunca vai ser perfeito.

JC - Muita coisa. Estou bem animado, porque vou tentar aproveitar as oportunidades ao máximo. Todos que entraram no tour têm uma grande evolução, mental, físico e dentro do surfe. Tem que ter os dois lados da sua base, front ou backside, prontos para serem usados de imediato. Vai ter que ter a cabeça no lugar e mandar ver.

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Samuel Pupo voando durante etapa do WQS
Imagem: WSL

Tem algum cara em especial que vocês gostariam de enfrentar?

JC - (depois de pensar bastante) Ah... eu vou falar! Em off, eu sempre falei em pegar o Gabriel em Pipe (risadas). Com todo o respeito, e o Gabriel é muito meu amigo, dá muita abertura, temos bons momentos, boas memórias... e damos muitas risadas juntos. Fora isso, é um cara que eu sempre tô olhando, literalmente uma máquina, completo. Ou seja, vou estar só ganhando se enfrentá-lo, só de pegá-lo já vou estar treinando alguma coisa, nem que for pra se arrepender (risos). Agora que a gente entrou, não pode mais reclamar de bateria difícil, né?

SP - Ah, meu irmão, né! Bateria com meu irmão no CT é um sonho desde criança. Tirando o meu irmão, pegar o Filipe em J-Bay (África do Sul) ia ser muito irado. Sempre assisti os vídeos dele lá, os campeonatos que ele ganhou. É o cara a ser batido ali, ia ser legal ter esse desafio.

por @thiago_blum / @surf360_