Alicia Klein

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Conmebol falou demais e esqueceu do que importava: o combate ao racismo

Ontem, o sorteio dos grupos da Libertadores e da Sul-Americana me deu uma sensação de viagem no tempo. Não das boas.

Uma volta ao tempo de Nicolás Leoz. De dirigentes latinos feudais, donos dos seus continentes.

Na cerimônia que decidiria o futuro dos principais clubes da região, um terço do tempo acabou utilizado para homenagens e discursos. Com foco no presidente Alejandro Domínguez e seu falecido pai, também cartola dos grandes, Osvaldo Domínguez.

Sabe o que não teve destaque? Diversidade. Inclusão. A luta contra o racismo. Os casos que assolam as competições da entidade viraram uma nota de rodapé, escondida em uma fala engessada e ensaiada de Cafu.

Pareceu-me insano não reservar um tempo para falar dos planos, do uso do dinheiro das multas, da importância do tema para a instituição.

Pero no. Resolvi então conversar com Marcelo Carvalho, diretor-executivo do Observatório da Discriminação Racial no Futebol.

Ele também estava indignado?

"Desiludido. Não esperava que o presidente falasse alguma coisa sobre o assunto, e nem sei se queria. Já houve tanta comunicação, sobre mudanças na entidade, sobre punir casos de racismo e a gente não avança.

Na Federação Gaúcha mesmo lançaram uma ação, chamada Protocolo Zero, mas na hora que as coisas acontecessem nada disso se realiza.

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A gente precisa mesmo é de ação. Que algo de fato aconteça a partir das denúncias. Não adianta querer zerar os casos de racismo, não temos como controlar o comportamento do torcedor. Estamos vendo alguns casos no campeonato gaúcho e os julgamentos, as punições não vêm.

Estou descrente. Mas tenho cobrado muito da Conmebol ações práticas. Não só punição, como também o debate, que na América Latina ainda é muito desigual, com o Brasil bastante à frente na discussão. Precisamos que todos entendam que o combate ao racismo é algo extremamente necessário dentro do futebol, que não é uma luta do Brasil contra a Argentina ou outros países sul-americanos.

Minha principal demanda hoje, no canal que temos com a Conmebol, é fazer o trabalho com outros coletivos que monitoram e atuam no combate ao racismo e outras formas de preconceito na América Latina, para equalizar o debate.

Na primeira reunião que tivemos com a instituição esse ano, também batemos de novo na questão da multa e eles sinalizaram de forma positiva. Então, por mais que eu tenha desesperança nas falas, tenho esperança nas atitudes."

Marcelo talvez seja um cara mais otimista do que eu. Décadas se passaram e a Conmebol continua se comportando como uma entidade com donos. Brancos. Ricos. Homens.

Aí eu penso: eles já têm todos os privilégios. Custava ter também um pouco de noção?

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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