Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Precisamos parar de nos apropriar de nossos sofrimentos
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Nestes últimos dias, criei mais uma ficção romântica em minha cabeça. Até aí, tudo bem; já falei em outro texto que costumo me apaixonar para me distrair, mesmo que não haja a mínima possibilidade de correspondência. Mas isso me gerou uma outra reflexão, que irei desenvolver agora.
Mas para isso, preciso compartilhar outra experiência. Estava indo para um compromisso e pedi um carro, desses de aplicativos. Como de costume, comecei a conversar com o motorista e em um certo momento, passamos debaixo de uma ponte onde estavam várias pessoas em situação de rua, com algumas estruturas precárias.
Chegamos a um consenso sobre o fato de que muita gente está ali porque não tem outra perspectiva, um fato que sempre ocorreu neste país e para o qual todos fechamos os olhos. Mas algumas dessas pessoas internalizaram tanto sua situação miserável que quando têm a oportunidade de ter uma vida mais digna fora da rua, estranham ou preferem voltar para a sua antiga realidade.
E é aqui que eu quero chegar. Muitas pessoas não privilegiadas na sociedade, sem perceber, vão se apropriando destas opressões que sofrem e acreditam que esta é a única forma de vida e que ela não pode mudar. Tamanha é a internalização das condições atuais que, se elas mudam, as pessoas estranham. E isso é muito perigoso.
Porque quem oprime vai pensar, ora, a pessoa está feliz assim, na sua situação de sofrimento, então não tenho motivo para agir de outra forma. E assim a miséria se perpetua. A violência de gênero se perpetua. A LGBT+fobia se perpetua.
Precisamos parar de nos apropriar de situações que nos oprimem e achar que está tudo bem. Uma parte da luta contra as opressões passa pela percepção de que esta é uma situação de sofrimento que não pode perdurar.
Da minha parte, ainda preciso desconstruir a percepção de que não tenho boas perspectivas amorosas. E quem sabe, dar chance para me apaixonar por pessoas que não sejam apenas fictícias, montadas com base em suposições, e sim por pessoas reais, que estejam realmente interessadas em outras pessoas reais.
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