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Mari Rodrigues

Por que os homens não sabem, ou não querem, se controlar?

Mari Rodrigues

19/10/2020 11h15

Os fatos narrados nos próximos dois parágrafos aconteceram há pouco mais de quatro anos.

Estava eu num dos vários cafés de uma zona chique de Belo Horizonte, pedi meu belisco e minha bebida e posicionei-me confortavelmente numa mesa na calçada. Era um dia bem quente e o ventinho do fim da tarde foi providencial para refrescar. Calmamente fazia minha refeição quando percebo na minha frente um rapaz de mais ou menos uns 35 ou 40 anos, em trajes esportivos, bem-apessoado até, que parou e me deu oi.

Nada de muito diferente; os mineiros geralmente são pessoas muito simpáticas e expansivas. Porém o rapaz começou a fazer várias perguntas como se quisesse puxar mais assunto e se convidar pra sentar comigo. E eu apenas queria comer em paz. Após várias cortadas, o rapaz finalmente se tocou de que eu não queria estender aquela conversa e tomou seu caminho.

Corta para 2020.

Como já é de conhecimento público, um jogador de futebol teve seu contrato com um clube suspenso, após a pressão popular, e principalmente dos movimentos feministas, cujo barulho foi tanto que empresas ameaçaram cortar patrocínios ao referido clube. O jogador foi condenado num tribunal italiano por estupro; desdenhou do fato e ainda por cima atacou os movimentos feministas.

Aonde quero chegar citando estes dois fatos? Os homens infelizmente não sabem, ou pior, não querem se controlar no seu trato com as mulheres. Em textos anteriores, falei sobre como os corpos lidos como femininos, lidos como subalternos, ganham apenas um caráter público, que supostamente dão aos homens o poder de escrutínio total e mesmo violação desses corpos. Tudo corroborado por uma justiça parcial, haja vista o festival de absurdos que temos que ler diariamente em julgamentos de casos de estupro, e por um mercado que não se importa de verdade com os corpos femininos e apenas reproduz valores distorcidos.

Tudo isso é parte de algo muito mais profundo e muito mais difícil de trazer à tona. As bases patriarcais de nossa sociedade são ainda muito fortes e fazê-las ruir ainda vai ter de se fazer à base de muitas cortadas em rapazes inconvenientes e de muito barulho de movimentos feministas, que sim, existem, e que não, não se calam.