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Paulista invisível: Eles vivem a rotina da avenida-símbolo de São Paulo

Leandro Conceição vende panos de prato na avenida Paulista - André Lucas/UOL
Leandro Conceição vende panos de prato na avenida Paulista Imagem: André Lucas/UOL

Bárbara Forte

De Ecoa, em São Paulo

25/01/2020 04h00

Quando a gente chega na Paulista, em São Paulo, logo olha para o alto, boquiaberto: são inúmeros arranha-céus que preenchem os 2,8 quilômetros de extensão da avenida-símbolo da capital. Desta vez, eu, que nasci num hospital ali perto, no coração da cidade, resolvi olhar em outra direção.

Era de tarde quando desembarquei na estação Consolação, linha 2-Verde do Metrô. Subi as escadas rolantes, não dei nem dez passos e logo me deparei com um jovem sentado na calçada, vendendo panos de prato (R$ 5 cada). Logo atrás, estacionada na calçada, uma carroça que serve de casa para ele, a esposa e duas filhinhas — uma de três anos e outra de quatro meses. Sentei-me ao seu lado e perguntei: qual é a sua história com esse lugar?

"Ixi, minha história é longa. Está com tempo?", brincou Leandro da Conceição, 24. Foi na infância que ele, a mãe e a avó saíram do Parque Novo Mundo, na Zona Norte, e desembarcaram no centro para vender balas. Nunca mais deixaram de trabalhar na região — comercializando todo o tipo de produto.

Leandro Conceição vende panos de prato na avenida Paulista - André Lucas/UOL - André Lucas/UOL
Leandro e a esposa, Alécia, vendem panos de prato na avenida Paulista
Imagem: André Lucas/UOL

A família cresceu e se espalhou. Leandro fica com a mulher, Alécia Carolaine Carrero Torres, 21, e as duas filhas próximo à estação do metrô, enquanto a mãe e a avó trabalham em outro ponto da avenida. Por dia, eles lucram entre R$ 50 e R$ 100, e agradecem o lugar que os acolheu.

A Paulista é de onde a gente tira o nosso sustento, é sinônimo de sobrevivência para nós" Leandro da Conceição, 24

Leo Dantas é pipoqueiro na Rua da Consolação - André Lucas/UOL - André Lucas/UOL
Leo Dantas é pipoqueiro na Rua da Consolação
Imagem: André Lucas/UOL
Segui o trajeto em busca de outras histórias. Não demorou muito para, virando a esquina, na Rua da Consolação, dar de cara com Leo Dantas, 23. O jovem, que vende pipoca salgada com bacon, pipoca doce e batata frita em frente ao cinema Belas Artes, atende no local há dez anos -- sim, desde os 13 o paraibano trabalha como camelô.

"Tenho mulher, filho. Todo o sustento vem da barraca", afirma, enquanto serve a cliente que pediu "meia salgada e meia doce". A localização permite que ele faça um preço mais alto.

"É R$ 5 a pequena, R$ 7 a média e R$ 10 a grande."

O ponto onde ele fica com o carrinho é fixo. Ele paga cerca de R$ 900 a cada trimestre para a Prefeitura. A fiscalização passou ali bem no momento em que a gente conversava. Conferiu os documentos de Leo e seguiu seu rumo.

Leo Dantas mostra documentação à fiscalização da prefeitura - André Lucas/UOL - André Lucas/UOL
Leo Dantas mostra documentação à fiscalização da prefeitura
Imagem: André Lucas/UOL

Entre uma pergunta e outra, o que passa de gente pedindo informação não é brincadeira. "Se informação valesse dinheiro, eu 'tava é rico'", disse, rindo, o pipoqueiro. No ponto onde ele está, o lucro (com pipoca, não informação) varia entre R$ 200 e R$ 300 por dia.

Olha a chuva!

Alexandra Carlos Sama é equatoriana e chegou ao Brasil há dois anos e meio - André Lucas/UOL - André Lucas/UOL
Alexandra Carlos Sama corre para tirar mercadorias da chuva
Imagem: André Lucas/UOL
Não deu nem tempo de voltar para a avenida Paulista, rumo à Rua Augusta, quando fui surpreendida pela chuva. Quase esbarrei em Alexandra Carlos Sama, 22, que corria para tirar sua banquinha de acessórios da área descoberta. Já debaixo de uma marquise, descobri que a jovem é mais uma personagem que faz parte do dia a dia da região.

Equatoriana, ela chegou ao Brasil há cerca de dois anos e meio — havia largado a faculdade de Medicina em Quito por falta de dinheiro e resolveu tentar a vida no país, já que um tio vivia em São Paulo e estava com uma vida financeira saudável. O plano? Guardar dinheiro e voltar para terminar os estudos.

Alexandra Carlos Sama é equatoriana e chegou ao Brasil há dois anos e meio - André Lucas/UOL - André Lucas/UOL
Alexandra Carlos Sama é equatoriana e chegou ao Brasil há dois anos e meio
Imagem: André Lucas/UOL

No começo, Alexandra conseguia juntar bastante dinheiro: "Era um lucro de até R$ 3 mil por mês. Dava para guardar e mandar um pouco para a família. Mas hoje não passa de R$ 1.200", lamentou.

Apesar de ter os sonhos adiados, ela já se sente em casa na terra que a acolheu e lembra da sensação que teve no dia em que pôs os pés na avenida mais famosa de São Paulo: "Fiquei impressionada com a imensidão das ruas e prédios. Não consegui dizer nada além de 'Uau!'".

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado no texto, a Consolação é uma estação da linha 2, e não da 4; e Equador não é um país vizinho do Brasil.
Diferentemente do informado em legenda, Alexandra Carlos Sama é equatoriana, e não peruana. O erro foi corrigido.

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