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Força-tarefa para negociar acordo está formada, mas México pode endurecer conversa

Do UOL, em São Paulo*

08/02/2012 19h17

Brasil e México já definiram quem vai formar a força-tarefa conjunta, que terá a missão de discutir novos termos do acordo automotivo existente entre os dois países. O teor detalhado da pauta de negociação ainda não foi revelado, mas é certo que o objetivo brasileiro é equilibrar a balança comercial, que atualmente pende para o México, segundo informações oficiais -- o governo federal alega que o acordo bilateral com o México causou um prejuízo de US$ 1,5 bilhão (cerca de R$ 2,8 bilhões) na balança comercial brasileira.

A missão, entretanto, deve ser árdua: um comunicado divulgado pela Secretaria de Comércio Exterior do México e divulgado pela agência Reuters afirma que o objetivo da viagem dos secretários daquele país ao nosso é apenas para "conhecer as inquietudes" do Brasil. "Devido à importância econômica do ACE 55 (Acordo de Complementação Econômica), o governo mexicano não buscará renegociá-lo", afirma a nota da chancelaria do México.  

Do lado brasileiro, o subsecretário-geral da América do Sul do Ministério das Relações Exteriores (MRE), embaixador Antônio Simões, e a secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Tatiana Prazeres encabeçam a mesa de negociação. Os representantes mexicanos são o subsecretário de Comércio Exterior, Francisco Rosenzweig, e o subsecretário de Relações Exteriores, Rogélio Granguillhome.  

Segundo um técnico do MRE, ouvido pela "Agência Brasil", o diálogo entre os representantes precisa encontrar “alternativas não só conjunturais, mas também estruturais”. Entre os itens da renegociação para evitar a ruptura do acordo comercial, o Brasil vai pedir maior participação de conteúdo regional na produção dos veículos, além da inclusão de caminhões, ônibus e utilitários no benefício de alíquota reduzida.

Outra proposta seria redesenhar o esquema de produção complementar acertado em 2003, segundo o qual o Brasil se concentrou na fabricação de automóveis compactos e o México em veículos com maior valor agregado. "Seguramente vão encontrar uma solução. Qualquer coisa que for acordada será em função das grandes empresas", disse Luiz Carlos Mello, analista da indústria e ex-presidente da Ford do Brasil.

Em 2011, pelo menos 112.024 unidades foram importadas do país norte-americano -- todas chegaram através de fabricantes estabelecidas no Brasil. Como resultado, o país faturou US$ 512 milhões em exportação de carros e peças para o México, mas gastou US$ 2,07 bilhões na compra (importação) de automóveis fabricados em unidades mexicanas (leia mais aqui). 

ACORDO TEM DEZ ANOS
Firmado em 2002, o acordo automotivo permite a importação de veículos, peças e partes de automóveis do México com redução da alíquota de impostos e institui um percentual mínimo de nacionalização dos veículos vindos do país. A parceria isenta veículos da taxa de importação de até 35%, cobrada sobre carros de fora do México e do Mercosul.

Na semana passada, o país ameaçou romper o acordo com o México para conter um aumento das importações, que resultaram no primeiro déficit comercial em dois anos.  

Na última sexta-feira (3), o presidente do México, Felipe Calderón, telefonou à presidenta Dilma Rousseff e demonstrou “enorme interesse” na manutenção do acordo automotivo e concordou com a revisão da parceria bilateral. Na ocasião, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, afirmou que a parceria comercial está “desequilibrada” para o lado brasileiro e tem beneficiado somente os mexicanos.

COMPLICANDO A IMPORTAÇÃO
Para alguns analistas, o aumento das exigências serve apenas como desculpa para dificultar a entrada de carros importados no país. Sem conseguir reduzir o chamado "Custo Brasil", o governo estaria dando um jeito de ampliar as barreiras para o consumo de produtos estrangeiros, mais atrativos.

Seria, portanto, uma medida complementar à decisão de dezembro, que aumentou em 30 pontos percentuais o IPI para carros importados de mercados externos ao Mercosul-México -- decisão que, na prática, afetou chineses, coreanos e alemães. Agora, os mexicanos seriam incluídos na "lista negra".

Um exemplo do avanço de carros vindos do país norte-americano é o da Nissan. A montadora, que faz parte da aliança franco-nipônica Renault-Nissan, saltou da 12ª posição geral de vendas em 2011 (1,97% de participação) para a sexta colocação no primeiro balanço de 2012 (3,32%), divulgado na última quarta-feira (leia aqui), empurrada sobretudo pelas boas vendas da dupla March/Versa, importados do país norte-americano. Além dos dois modelos, que têm apelo mais popular, a marca também traz daquele país os médios Tiida (hatch e sedã) e Sentra.

A Nissan também vende por aqui a minivan Livina e a picape Frontier, modelos fabricados localmente, em São José dos Pinhais (PR), mas que têm vendas mais comedidas.

Também chegam do México, sem pagar tarifa de importação, nem sobretaxa de 30 pontos percentuais no IPI, o utilitário Freemont e o compacto estiloso 500, da Fiat; o Captiva, da Chevrolet; o New Fiesta (hatch e sedã) e o médio-grande Fusion da Ford; o Jetta, da Volkswagen, terceiro sedã médio mais vendido do país em janeiro; o utilitário CR-V, da Honda, líder do segmento no primeiro mês do ano, deixando Ford EcoSport e Renault Duster para trás. O SUV Dodge Journey, da Chrysler, co-irmão do Freemont, não paga tarifa de importação, mas arca com a sobretaxa do IPI.

ARGENTINA DEVE OPINAR
O endurecimento com o México, no entanto, pode ter efeitos colaterais se não definir claramente o que ocorre com o comércio de carros entre o Brasil e outro signatário do pacto, a Argentina -- o vizinho é responsável por um fluxo de carros maior que o da via México-Brasil.

Firmado em 2002, o acordo de livre comércio entre Mercosul (Brasil incluso) e México permite as importações de automóveis, peças e partes de veículos do México com redução de impostos, mas só vale para veículos de passeio. Agora, o Brasil deverá sugerir na revisão do acordo a inclusão de outras categorias -- como caminhões, ônibus e utilitários -- o que poderia diminuir o desequilíbrio para a balança comercial brasileira, segundo Pimentel.

“Queremos aumentar o conteúdo regional na produção dos veículos, tanto no México como no Brasil, e aumentar o escopo do acordo, de forma que não seja apenas para automóveis de passeio, como é hoje. Que inclua também caminhões, ônibus e utilitários, o que poderia melhorar o saldo, que hoje é totalmente negativo para o Brasil”.

Falta, no entanto, combinar qual a participação da Argentina no negócio. Essa posição é defendida, por exemplo, pelo jornalista, engenheiro e especialista no mercado automotivo Fernando Calmon, colunista de UOL Carros. Para ele, a Argentina vai querer e precisa ser ouvida durante a negociação das novas relações com o México (releia aqui a opinião de Calmon). (*Com Agência Brasil e Reuters)