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Peugeot 408, ruim de loja, mostra seu valor até na versão básica

<b>Peugeot 408 Allure M/T: bom custo/benefício num carro ótimo de dirigir</b> - Murilo Góes/UOL
<b>Peugeot 408 Allure M/T: bom custo/benefício num carro ótimo de dirigir</b> Imagem: Murilo Góes/UOL

Claudio de Souza

Do UOL, em São Paulo (SP)

09/11/2011 08h28

Na indústria automotiva há variados exemplos de descaso com um produto ou um segmento do mercado. Recentemente, lembramos que a Fiat deixou o Palio à deriva por anos, enquanto o Volkswagen Gol se transformava num carro novo e melhor; a Chevrolet mantém desde sempre a mesma Zafira e, quando mexeu na Meriva, foi para estragá-la com o câmbio Easytronic -- agora prepara um único carro para enterrar esses dois na mesma cova. Já a Peugeot merecia uma boa puxada de orelha por não perceber a tempo que os sedãs médios são um front crucial na guerra do mercado brasileiro (e, de resto, em qualquer país cuja economia tenha entrado nos eixos).

No Brasil, o sedã derivado do hatch 307 nunca cumpriu seu papel a contento. Para a crítica automotiva, a principal razão era seu visual sem graça, com uma traseira inspiradora de bocejos. Seu primo menor, o 207 Passion, também não é dono do "bumbum" mais elegante do mercado, diga-se. Enfim, à medida que novos três-volumes médios iam chegando ao Brasil, o 307 fossilizava-se um pouco mais.

O primeiro sinal da reação da Peugeot veio no Salão do Automóvel de São Paulo de 2010, quando o estande da marca francesa exibiu um 408 pré-série. O "8" é a geração do carro -- ele é contemporâneo do 308, 3008 e 508. E o "4" é relativo ao porte. De uma tacada, o sedã, projetado para mercados emergentes por europeus e chineses, engoliu o 307 pelo tamanho maior e depois o tirou de linha, além de ter barrado também o 407.

Deu certo? A julgar pelos números de emplacamentos nacionais compilados pela Fenabrave (associação das concessionárias), não mesmo. No fechamento de outubro, o 408 contabilizou 659 unidades vendidas. Ficou em 9º lugar no segmento dos sedãs médios -- citamos o recorte de um mês apenas porque o modelo começou a ser vendido em abril. O que, aliás, não é desculpa para apanhar de coisas como Fiat Linea e Nissan Sentra. Ou para vender metade do que vende o Renault Fluence.

Qual o problema do 408? Não sabemos dizer.

UOL Carros experimentou por uma semana a configuração de entrada do sedã médio, a Allure, dotada de câmbio manual. No lançamento, o preço anunciado para este carro foi de R$ 59.500, conjugado a agrados como três anos de garantia, preço fechado nas três primeiras revisões somando R$ 730 -- depois, a marca chegou a oferecer temporariamente três revisões de graça -- e incentivo à troca, supervalorizando o seminovo dado como entrada. O 408, ainda por cima, é o atual campeão de reparabilidade no segmento.

O preço oficial ainda é esse, mas em feirões de fábrica há ofertas com o famoso "juro zero" e, na primeira concessionária Peugeot de São Paulo que consultamos nesta terça-feira (8), bastou insistirmos um pouco para receber a oferta de uma unidade branca por R$ 56 mil e uma preta ou prata por R$ 57 mil. Se por telefone foi fácil assim, imagine pessoalmente.

MUITA COISA BOA
O "x" da questão é que o 408 é um ótimo carro. Por exemplo: geralmente é cansativo dirigir carros de motor 2.0 com câmbio mecânico, porque a tendência é que o sistema seja um tanto duro -- especialmente para o pé esquerdo. No entanto, neste sedã os engates são fáceis e exatos, combinando à perfeição com um pedal de embreagem suave. Pela experiência prévia com a versão automática, garantimos que pagar R$ 5.000 a mais por ela é rasgar dinheiro.

O propulsor é bicombustível e entrega 151 cavalos de potência com etanol, com torque de 22 kgfm. O motorista nunca fica na mão em saídas e retomadas (fundamentais para as ultrapassagens), e atinge velocidades de cruzeiro interessantes, na faixa dos 120 km/hora, com naturalidade -- isso porque o 408 pode ir muito além, segundo dados da Peugeot: a máxima é de 212 km/h, e a aceleração de 0 a 100 km/h é feita em 10,4 segundos.

Somando o motor bem disposto ao câmbio de fácil operação, à direção eletro-hidráulica bem direta e ao conjunto de suspensões com acerto firme (mas sem "bateção" de roda e com um toque de conforto para quem vai atrás), obtém-se como resultado um comportamento com certo toque de esportividade. Dentro do segmento, o 408 está mais para Volkswagen Jetta do que Toyota Corolla.

O sedã também tem um tamanho de respeito, com 4,69 metros de comprimento e excelentes 2,7 metros de entre-eixos, medida que permite um arranjo bastante confortável para quatro adultos na cabine. Verdade que há muito plástico a bordo, e os revestimentos são de tecido. Mas há texturas macias, e o evidente capricho no acabamento faz com que o conjunto de instrumentos e comandos, bem simples, passem impressão de sobriedade em vez de avareza. Caprichado, com amortecedores externos regulando a abertura sem roubar espaço da bagagem, o porta-malas recebe bons 526 litros.

Vale destacar alguns itens de série da versão Allure: para a segurança, há airbags frontais e freios com ABS (antitravamento), auxílio em emergências e repartição eletrônica da força; para o conforto, vidros, trava e retrovisores com acionamento elétrico, porta-luvas com refrigeração, sistema de som com entrada USB e ajustes de posição para o banco do motorista e a coluna de direção. As rodas de série são de liga-leve, com aro 16".

O QUE HÁ DE RUIM?
Há duas ressalvas a fazer: num carro do porte do 408, o sensor de estacionamento deveria ser obrigatório -- mas ele só vem de fábrica na versão Féline (que, quando dotada de transmissão automática, possui o dispositivo também na dianteira). E não é possível que a Peugeot não tenha se tocado que o generoso envidraçamento dianteiro, o qual garante ao 408 uma visibilidade de minivan, é ambivalente: os braços nus do motorista vão cozinhar em dias de sol. Faltou um tratamento -- qualquer tratamento -- de proteção.

O consumo aferido pelo computador de bordo, ao longo de 713 km de uso do 408 (70% em estrada e 30% em cidade), ficou em 7,15 km/litro de etanol. Acende-se a luz amarela: este número poderia ser melhor. Mas não é desastroso.

Levando em conta o trem de força de respeito, o conteúdo digno e o visual imponente (que respeita a tradição "felina" da Peugeot, mas resolve o desenho da traseira com belas lanternas horizontais), o 408 é um produto que deveria estar melhor situado entre os sedãs médios. Verdade que, se essa versão Allure manual estaciona em sua garagem por um preço "baixo" (notem as aspas, por favor), a top Griffe A/T já bate nos habituais e absurdos R$ 80 mil e pode dar o viés de baixa ao desempenho da gama -- mas é assim com todos os modelos do segmento.

Ou seja: depois de provar e aprovar esse bom 408 Allure, entendemos menos ainda o porquê de as vendas do modelo serem tão medíocres.