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Brasil está longe do alvorecer elétrico, mas participa da 'moda' do carro híbrido

Ford Fusion foi primeiro modelo com motorização "híbrida total" disponível oficialmente no país, mas não a única iniciativa a rodar em nosso atribulado asfalto, apesar da falta de incentivos - Murilo Góes/UOL
Ford Fusion foi primeiro modelo com motorização "híbrida total" disponível oficialmente no país, mas não a única iniciativa a rodar em nosso atribulado asfalto, apesar da falta de incentivos Imagem: Murilo Góes/UOL

EUGÊNIO AUGUSTO BRITO

Enviado especial a Curitiba (PR)

06/01/2011 17h27

O ano de 2010 foi especial para o cenário automotivo brasileiro: o setor bateu novo recorde de produção e emplacamentos (leia mais aqui); o mercado assumiu a quarta posição mundial (à frente da Alemanha e atrás de China, Estados Unidos e Japão); e, em termos tecnológicos, se ainda não estamos alinhados ao alvorecer mundial da propulsão alternativa à combustão, contamos com diversos modelos híbridos e elétricos testados e até lançados.

Em março, noticiamos a presença de uma unidade do supercompacto elétrico Mitsubishi i-MiEV no país (releia aqui), especialmente escalada para testes e, principalmente, "demarcação de território". No mês de junho, jornalistas, executivos, o governador fluminense Sérgio Cabral e o ainda presidente Luiz Inácio Lula da Silva se espremeram em um galpão fechado no Rio para apreciar o presente e imaginar como pode ser futuro da motorização elétrica (saiba como foi). Um mês depois, a Mercedes-Benz disparou na largada ao ser a primeira fabricante a vender um carro híbrido no país (ou "híbrido parcial", segundo o jargão técnico, por utilizar o propulsor elétrico apenas como complemento de potência, quase um booster) -- no caso, o sedã de luxo S400 Hybrid (veja nossa avaliação). Em novembro, foi a vez da Honda apresentar suas armas, ao colocar o hatch Inside e o cupê esportivo CR-Z para rodar na pista (leia nossas impressões) e antecipar o desempenho que pode estar disponível, em breve, para futuros donos de uma versão híbrida do Civic.

O movimento mais importante, no entanto, foi dado no final do ano, com o lançamento do Ford Fusion Hybrid (aqui), com preço pouco mais acessível (R$ 134 mil) e tecnologia híbrida total, que utiliza o esforço combinado dos motores a combustão e elétrico no tracionamento do carro. Sem diferenças externas em relação do sedã tradicional importado do México, o Fusion híbrido chega oficialmente ao país prometendo maior autonomia com menor poluição -- seu desempenho no dia-a-dia, aliás, pode ser acompanhado através do teste de longa duração feito pelo site parceiro Interpress Motor (veja aqui).

Ainda assim, o país ainda está no que podemos chamada de "crepúsculo" da tecnologia híbrido/elétrica, onde os esforços ainda são pontuais, isolados -- como o serviço no aeroporto da região metropolitana de Curitiba (PR), que conta com um Fiat Palio Weekend elétrico como iniciativa experimental (e cuja disseminação foi barrada pelos políticos de Brasília).

Falta uma política oficial que defina o nível correto de impostos e taxas, propicie benefícios aos fabricantes interessados em fomentar novas formas de propulsão, e permita a criação de uma rede de fornecedores e estrutura de manutenção e abastecimento dos novos veículos (no caso dos elétricos, especificamente, que precisariam de um sistema de recarga ou troca de baterias difundido por todo o país).

E esta tem sido a principal reclamação de grupos como os japoneses Mitsubishi e Honda ou os franceses da Renault (ao lado da aliada japonesa Nissan). Representantes das marcas e especialistas têm discurso muito parecido, que chega a soar quase como um mantra, mas a realidade do segmento: Não há legislação adequada para o carro elétrico, a taxação é pesada e muito acima da cobrada de qualquer outro veículo e, com isso, qualquer negócio é inviabilizado.

No final de julho do ano passado, o governo Lula chegou a definir uma espécie de incentivo útil com a publicação de Medida Provisória de isenção de tributos para projetos de inovação tecnológica desenvolvidos com recursos públicos (leia mais aqui). A decisão, no entanto, não era  específica para o setor, e um projeto nacional de desenvolvimento para setor automotivo foi adiado, recaindo sobre o atual governo de Dilma Rousseff.

ALVORADA
Quando perguntados sobre modelos ideais para um futuro segmento híbrido/elétrico no país, os especialistas também fazem coro ao apontar o Japão, onde há bônus do governo para compra de carros elétricos, Europa, onde diferentes fabricantes se uniram para obter incentivos semelhantes dos governos locais (destaque para os franceses dos grupos Peugeot-Citroën e Renault-Nissan), e Estados Unidos, que também contou com cheques de auxílio a quem trocasse um carro "beberrão" por um modelo mais racional no último ano -- o que fez disparar a procura por híbridos.

SER VERDE É SER BOM

  • Reprodução

    Na imagem, anúncio bem humorado da Toyota israelense, que compara o nível de emissões provocado pela flatulência de uma ovelha a gerada pelo híbrido Prius: o carro seria mais 'verde'

Embora o alvoroço internacional tenha diminuído com o abrandamento da crise, a queda do preço dos derivados de petróleo nos últimos meses, sobretudo nos EUA, e a distância entre os benefícios alegados e a realidade dos primeiros modelos disponíveis (a disparidade entre promessa e entrega é maior no caso dos elétricos, e entre procura inicial e vendas concretizadas, no caso dos elétricos, conforme mostra o site Carsale nesta nota) , híbridos e elétricos têm se mantido como assunto quente no noticiário automotivo internacional.

Nesta quinta-feira, pipocou a informação de que a Renault francesa disse investigar membros de seu alto escalão por suspeita de vazamento de informações confidenciais sobre o desenvolvimento de tecnologias elétricas (saiba mais sobre a denúncia de espionagem aqui).

No Japão, um híbrido é o carro mais vendido do país há um ano e meio, distinção feita ao pioneiro Toyota Prius (o site iCarros tem os detalhes), primeiro modelo com propulsão alternativa à combustão a obter sucesso comercial e que está em sua terceira geração (a primeira foi lançada em 1997). E nos Estados Unidos, que voltou a contar com a pujança de sua indústria automotiva, a notícia de queda da Toyota das primeiras posições, abalada pela sequência sem fim de recalls, veio seguida da promessa de que a fabricante fará de tudo para ter o Prius e suas vertentes (estão no forno o Prius totalmente elétrico, ou Plug-in, e também uma versão monovolume) como líder geral de vendas do mercado ianque até o final deste ano de 2011.

De volta ao Brasil, mas ainda falando Prius, uma empresa de transporte, terceirização de frota, locação de carros e logística, a paranaense Ouro Verde, teve a iniciativa de importar de forma independente duas unidades do hatch híbrido dos Estados Unidos e homologá-las para que possam rodar no país. Com isso, deu início ao que chama de "EcoFleet", uma frota ecológica formada exclusivamente por modelos híbridos ou elétricos, que deve atender a executivos interessados em mostar que são "antenados" e ecologicamente corretos.

Se a iniciativa -- que embora conte com a parceria de algumas concessionárias da Toyota na região de Curitiba, não tem o respaldo oficial da fabricante (esta se mostra mais preocupada em desenvolver o motor popular para seu futuro carro compacto a ser montado no interior de São Paulo) -- dará certo num país sem incentivos e viciado no projeto do etanol, só o futuro dirá. Mas os gerentes da Ouro Verde se mostram confiantes a ponto de dizerem que o projeto não precisa de reforço governamental, pois vai ser uma exigência de mercado em um futuro próximo. Ou de cravar que o fato do país ter um modelo bem sucedido -- no caso, o do álcool combustível -- isso não impede que modelos híbridos tenham sucesso, já que o objetivo não é, nem será tão cedo, o de substituir, mas sim de aumentar a autonomia e diminuir os gastos em relação a carros equipados com motores convencionais.

"Décadas atrás, ter carro automático era quase uma excentricidade, poucos entusiastas arriscavam, mas hoje a possibilidade de trocar marchas sem usar (o pedal de) embreagem já é uma demanda de segmentos populares, a Fiat tem em quase toda a linha, a Volkswagen também. Acreditamos que saltar na frente com um destaque como o Prius, que é o iPhone dos híbridos, é uma forma de mostrar a viabilidade do híbrido e colocá-lo a disposição de executivos e pessoas mais arrojadas, antes de todo mundo sequer saber a importância de se ter um", arfirmou José Maurício Dieguez, gerente de locação da empresa.

Para saber o que o Prius oferece, UOL Carros testou uma das unidades que rodam em Curitiba e mostra suas impressões em reportagem exclusiva (leia aqui). O fato é que com ou sem benefícios, políticas próprias ou vontade empresarial, o assunto híbrido/elétrico está na moda e, assim, ainda vai dar muito o que falar.