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Após recorde histórico, setor automotivo aposta no crédito para manter vendas

Da AutoPress

09/04/2010 11h38Atualizada em 09/04/2010 11h42

Os executivos das montadoras no Brasil estão com sorriso de orelha a orelha, e não é para menos. Um ano e meio após a crise financeira global que assolou mercados mundo afora, o setor, por aqui, bate mais três recordes. Os dados apontam para o melhor março da história, com 353 mil unidades vendidas. Nos primeiros três meses, segundo a Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automores), foram mais de 750 mil unidades entregues, 17% a mais que o mesmo período do ano passado, o que configura também o melhor trimestre da história. E no último dia de março, outro recorde: 30.500 emplacamentos.

Com as mais de 337 mil unidades emplacadas segundo a Fenabrave, o mercado de automóveis e comerciais leves em março foi quase 30% maior que março do ano passado e cerca de 60% superior a fevereiro deste ano.

  • Ilustração: Afonso Carlos/Carta Z Notícias

    Ilustração: Afonso Carlos/Carta Z Notícias

Em uma visão imediata, o fim do desconto do IPI (Imposto Sobre Produtos Industrializados), que voltou aos patamares normais em 1º de abril, pode ser apontado como a principal motivação para um mês tão aquecido. Só que o cenário econômico do país é mais valorizado pelos especialistas e executivos do setor do que o fim do desconto na alíquota. Os aumentos da renda, do crédito e dos prazos de financiamento são considerados os maiores responsáveis por esse desempenho tão vigoroso. “Os bancos oferecem condições de financiamento bastante atraentes, praticamente nos mesmos níveis de antes da crise”, exemplifica Tae Kawasaki, vice-presidente da Nissan.

 

A TABELA DO IPI

MOTORIZAÇÃO ALÍQUOTA
1,0 litro 7%
1,0 l a 2,0 l flex 11%
1,0 l a 2,0 l
a gasolina
18%
+ 2,0 l flex 13%
+ 2,0 l a gasolina 25%

Esse panorama deixa o setor otimista para o restante do ano. E apesar do IPI não ser tão importante assim para os especialistas, para abril é aguardada uma previsível e natural redução depois da corrida às lojas em março. “Em abril deve vir a ressaca do mês de março. Depois desses meses, o patamar de 260 mil unidades deve seguir no segundo semestre até dezembro”, aposta Cássio Pagliarini, diretor de marketing da Renault. A previsão é que as vendas diárias sejam 10% menores que em março, mas como tem três dias úteis a menos que o mês passado, a estimativa é que as vendas caiam em torno de 22%.

A queda nos meses subsequentes pode até não ser tão drástica assim. Há uma crença de que as montadoras vão sustentar os preços atuais, com ou sem IPI. “Agora começa a guerra para manter as vendas. Ninguém vai querer perder volume e muito menos participação no mercado”, ressalta Paulo Roberto Garbossa, consultor da ADK Automotive. “Mesmo com a volta do IPI, o mercado ficará mais competitivo. Natural uma acomodação em abril, talvez em maio, porém, nada que vá jogar o mercado para baixo. Esperamos crescimento de 5% esse ano, em uma perspectiva conservadora”, faz coro Lelio Ramos, diretor comercial da Fiat.

A indústria aposta, inclusive, que 2010 será o quarto ano de recorde consecutivo de vendas no mercado interno, com um crescimento entre 5% e 10% na comparação com 2009. “Estamos trabalhando com a perspectiva de um crescimento próximo ao da indústria, cerca de 9%. Nos próximos meses, sem a redução do IPI, iremos ver o nível de acerto dessa meta”, acredita Alberto Pescumo, gerente-geral comercial da Honda.

O tal cenário econômico positivo é visto como a base de sustentação das vendas de automóveis. Inclusive pelo poder de compra do brasileiro e o upgrade de classes sociais observado nos últimos anos. “O mercado conta hoje, ainda mais que em 2008, com uma demanda reprimida, uma demanda nascente com o crescimento da classe C e a ascensão da classe B. Quem mantém o varejo é a classe média”, pondera Luiz Carlos Mello, consultor do Centro de Estudos Automotivos. Março registrou um aumento de participação do segmento dos populares no total das vendas de 4,5%, reflexo da entrada de novos consumidores de carros zero-quilômetro no mercado.

Uma pulverização do crédito, ainda tímida, também é vista como outra mola propulsora para o setor. “O grande entrave talvez seja a falta dessa disseminação do crédito, ainda concentrado em classes de rendas e em regiões do país. O mercado pode crescer ainda mais”, argumenta o economista Alexandre Andrade, da Tendências Consultoria.

Nesta euforia, a indústria trata de acompanhar o ritmo. Ou seja, nada de erros de planejamento estratégico e de produção, como ocorreu nos primeiros meses de 2009. Na época, o mercado aquecido pelo desconto do IPI, mesmo após a pior fase da crise global, não encontrou carros suficientes para a demanda. “No mês de março as fábricas produziram com força total. Geralmente fazemos um estoque de 30 dias para os veículos, em março o estoque foi de 41 dias e, mesmo assim, no final do mês nosso estoque chegou ao equivalente a 28 dias”, conta Marcos Munhoz, diretor geral de marketing e vendas da Chevrolet. 

OUTRO PANORAMA
Os executivos garantem que a indústria automobilística instalada no Brasil está preparada para aumento das vendas no aquecido mercado interno. Mas quando o assunto é exportação do setor fora do eixo México-Mercosul -- com quem o país tem acordos alfandegários que praticamente eliminam as taxas de importação --, o futuro mostra-se bem imprevisível. No ano passado, o Brasil importou mais do que exportou: 370 mil contra 489 mil veículos. “As exportações no nível de 2008 e 2007, quando 30% da produção era enviada para fora, não devem acontecer novamente. Hoje o mercado brasileiro é maior e mais rentável”, acredita Pagliarini, da Renault.

Mas, para alguns, a questão das exportações, que no ano passado registraram queda de 35% na comparação com 2008, vai além de questões cambiais. As restrições das filiais das montadoras no que diz respeito às vendas para fora também atrapalham o setor. Muitas vezes, as matrizes dão preferência de exportar os modelos produzidos nos países de origem. Isso, independentemente de custo menor ou câmbio favorável. “É preciso que as matrizes das grandes montadoras deem liberdade às montadoras daqui para realizarem seus programas de exportação. Hoje não temos uma indústria nacional. Temos uma indústria brasileira”, aponta Mello, do Centro de Estudos Automotivos. (por Fernando Miragaya)