Beija-Flor revela segredos de alas e arrasta multidão em Copacabana
Com cerca de três mil componentes cantando o samba na ponta da língua, a Beija-Flor levou um verdadeiro "arrastão" para a orla de Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro, durante seu ensaio técnico neste domingo (28). Mesmo sob o sol escaldante, a escola empolgou o público que aguardava o na orla. O evento, que começou com mais de duas horas de atraso, ocorreu como o esperado e deu até para alguns integrantes revelarem alguns dos segredos do desfile da escola de Nilópolis, na Baixada Fluminense. Mas, também ocorreu com situações embaraçosas, como o furto ao ator Anderson Müller, contratado pela escola para ser coach de encenação na diretoria de coreografia.
"Foi tão rápido. Eu saí para comprar água e um cara assaltou um gringo, pegou o dinheiro que eu estava pagando a água e saiu correndo. Eu gritei e acabei caindo, machuquei meu braço", contou o ator, que segurava um saco de gelo na área dolorida. Mesmo com incidente, Müller estava empolgado com o resultado do ensaio e adiantou como serão algumas performances na Marquês de Sapucaí.
"Os carros terão mais encenações. Estamos fazendo um trabalho de teatro para ter identificação com a plateia sobre os momentos atuais que passamos atualmente, principalmente na cidade do Rio. Tem eu e Edson Celulari contando a história do livro (que inspirou o enredo) no primeiro carro. Tem carro falando do Maracanã, do Corcovado, dos monstros criados no trânsito. Tem carro da Petrobrás que se transformará em uma favela, que é lindo", explicou o ator.
O enredo que embala a Beija-Flor neste ano é "Monstro é aquele que não sabe amar! Os filhos abandonados da pátria que os pariu", inspirado no livro "Frankenstein", de Mary Shelley, que vai abordar as mazelas e abandonos da sociedade brasileira atual.
Em uma das alas os componentes trarão malas de dinheiro e Müller explicou que o "acessório" não podia faltar no desfile.
"Hoje não são só esses 'assaltozinhos' que temos. Os bandidos vestem gravata e têm suas malinhas de dinheiro. Assistimos isso toda hora. Brincamos com essas situações. Vai ter a farra dos guardanapos (como ficou conhecido um jantar em Paris do então governador Sérgio Cabral, seus secretários e empreiteiros). Vai ser uma crítica com bom humor. Estamos ensaiando todos os dias porque é teatro", explicou Müller.
Segundo o diretor-financeiro da Beija-Flor, Almir Reis, mesmo com a crise enfrentada pelas escolas com a diminuição de verbas ocasionada pela crise, a criatividade não vai deixar o desfile sofrer consequências.
"Na crise usamos a criatividade. Substituímos materiais, mas isso não significa que não vai ter brilho, beleza e vigor de nossa escola", garante.
Considerando a escola já azeitada tecnicamente para o desfile, Laíla, carnavalesco e diretor de Carnaval da Beija-Flor, disse que fazer o ensaio na rua em Copacabana é importante para o povo.
"É para quem ficou sem os ensaios técnicos e não tem condições de ir aos desfiles poder vir e participar. Aqui é mais para a participação popular. A parte técnica já está pronta", afirmou Laíla.
Ala trans
Que Pabllo Vittar vai desfilar na escola em destaque todos já sabiam. Mas a ala que vai fazer parte de seu carro alegórico no desfile também promete ser "bafônica". Com nome de ala trans, os componentes serão 35 casais de homens e mulheres que trocarão de roupa no meio do desfile.
"Vão ser roupas com velcro que parecem com aquelas bonecas de antigamente, de papel, que podíamos trocar as roupas dela. A ala vai fazer da violência racional, sexual e de torcidas. Sou gay e estou muito feliz em participar dessa ala", afirmou o técnico em química Alessandro Bastos, que integra essa parte do desfile.
"É uma crítica social maravilhosa. Fico feliz em participar dessa proposta inovadora", acrescentou o professor Francisco Barros.
Batuque das meninas
O lugar das mulheres na Beija-Flor é também na bateria e não é só nos chocalhos. É no batuque das caixas que ditam boa parte do ritmo da "Trovão Azul", apelido da bateria da escola. À frente da diretoria de tamborim está Laísa Lima, de apenas 18 anos, três deles já à frente dos ritmistas desse setor.
"No começo os homens sentiam um desconforto. Agora já se acostumaram. Eu toco todos os instrumentos", explicou a diretora que começou a tocar aos 11 anos no projeto Sonhos de um beija-flor. Laísa também entregou um segredinho que veremos na avenida.
"A bateria vai fazer uma dancinha durante o refrão do samba, toda ela", contou.
Inseparáveis de Laísa são as amigas Angélica Souza, 22, Julie Carvalho, 222, Larissa Ramalho, 17, e Arthur Mendes, de 22. Todos aprenderam a tocar caixa e integram a bateria. Angélica até leva o que aprendeu para fora da Beija-Flor e toca bateria em bandas, como freelance.
"Meu pai é músico, sempre me incentivou. Aqui não enxergam como diferente, mas fora, uma menina tocando bateria, chama atenção. Mas estamos conquistando uma arte que antes era dos homens", disse. A amiga Julie explicou que ainda dentro da escola em algumas situações elas não são identificadas como membros da bateria.
"Às vezes alguns seguranças recolhem nossos instrumentos e dizem 'vocês não podem ficar aqui' e temos que explicar que somos da bateria. Alguns ainda não nos levam a sério", completou.
"Antes não tinha mulher na bateria. Falavam que tínhamos só que tocar chocalho. Não acreditavam e não nos aceitavam. Isso está mudando", acrescentou Larissa.
Orgulhoso, Arthur sempre apoia e sempre aproveita para falar das amigas. "Vem gente de fora me perguntar e eu digo que é legal o que elas fazem. Mas ainda existe preconceito", afirmou o jovem.
Quem também é da Beija-Flor desde criança é a rainha Raíssa de Oliveira que ensaiou em Copacabana e atendeu diversos fãs que queriam uma selfie. "Eu adoro o contato com o povo ainda mais esse ano que a gente não teve ensaio técnico. Esse contato com o povo é muito gosto dá oportunidade de quem não tem condições de ir ao desfile. Para mim a preparação é diferente da que ocorre para a quadra. É chão, muito movimento e esse eu acho que perdi uns dez mil quilos", disse a rainha sobre ensaiar sob o sol forte.
Muitos que assistiram ao ensaio ficaram satisfeitos. No início do evento, poucas pessoas acompanhavam a escola, mas ao final, virou um grande Carnaval com integrantes misturados ao público.
"Eu estou emocionada. Sou de Belo Horizonte, sempre venho prestigiar o Carnaval. Estou aqui desde o ano novo. Mas ver ouvir esse samba cantar 'Oh pátria amada, por onde andarás?' me emocionou muito pelo momento em que vivemos", disse a designer de joias Wanda Gontijo.
A moradora de Copacabana Ivana Malater disse estar maravilhada e que preferiu o ensaio na rua. "Eu achei que os integrantes se soltaram mais. Não tem aquela roupa toda que em alguns ensaios tinham. E os ensaios técnicos no sambódromo também eram muito cheios. Aqui foi mais tranquilo", completou a moradora.
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