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Como a pele de tilápia ajuda na cicatrização de vítimas de queimaduras

Divulgação/ Prefeitura do Rio de Janeiro
Imagem: Divulgação/ Prefeitura do Rio de Janeiro

Giulia Granchi

Do VivaBem, em São Paulo*

07/08/2020 11h50

Criado há alguns anos por médicos do Ceará, o método pioneiro de usar pele de tilápia para tratar queimaduras deve ajudar a recuperar centenas de vítimas da explosão que ocorreu em Beirute, no Líbano, na última terça-fera (4).

A ideia é enviar mais de mais de 40 mil cm² de pele do estoque brasileiro para tratar os libaneses e o sucesso da transação, depende, no momento, de tramites legais entre os dois países.

A pele de tilápia age como um curativo para queimaduras de 2º e 3º grau e o seu uso acelera o processo de cicatrização além de diminuir a dor do paciente. Por enquanto, mais de 350 pessoas já foram beneficiadas com o procedimento no Brasil.

Em entrevista a Ecoa, o cirurgião plástico Edmar Maciel, presidente do IAQ (Instituto de Apoio ao Queimado) explicou como o tecido do peixe age na pele humana. Segundo o médico, o método é muito mais eficiente do que um curativo feito com pomada e cremes, que precisam ser trocados constantemente, e além de causar dor, podem requerer o uso de anestésicos, elevando ainda mais o preço do tramaneto.

"Já a pele de tilápia tem efeito de cicatrização mais rápido e não necessita de tantas trocas, já que o colágeno interage com a ferida da queimadura facilitando o processo de cicatrização. E, como a pele da tilápia adere completamente à área queimada, isso evita a contaminação externa e a perda de líquido e proteína, que desidrata o paciente", afirmou.

Cerca de 97% dos queimados são tratados pelo SUS. Atualmente, os hospitais públicos do Brasil usam pele de cadáver para recuperação inicial desses pacientes. Os pesquisadores esperam que, no futuro, o método possa ser aplicado na rede pública.

Como a pele de tilápia é preparada

Info pele de tilápia - Reprodução/Revista Pesquisa Fapesp - Reprodução/Revista Pesquisa Fapesp
Imagem: Reprodução/Revista Pesquisa Fapesp

Antes de ser utilizada, a pele do peixe é submetida a um processo de limpeza em que são retirados as escamas, o tecido muscular, as toxinas e o odor característico do peixe.

Depois, é estirada em uma prensa e cortada em tiras de 10 cm por 20 cm. O resultado é um tecido flexível, similar à pele humana. As tiras de pele são armazenadas em um congelador a uma temperatura entre 2 e 4 graus Celsius por no máximo dois anos.

Rede de pesquisa

Edmar Maciel lidera a pesquisa desde 2015 ao lado do médico Manoel Odorico de Moraes,professor da Faculdade de Medicina da UFC (Universidade Federal do Ceará). O estudo teve início quando eles abraçaram uma ideia original do cirurgião plástico Marcelo Borges, professor da Faculdade de Medicina de Olinda (PE).

Após ler uma reportagem sobre artesanato feito com pele de tilápia, Borges imaginou que poderia usar o material para tratar queimados por ser muito rico em colágeno e se tratar de um item barato - em geral, é descartado pela indústria pesqueira. O uso de curativos biológicos para tratar feridas e queimaduras não é novidade no mundo. Além da própria pele humana, disponibilizada por bancos de pele, usa-se pele de porco, entre outros materiais.

Hoje, a linha de pesquisa com a pele de tilápia tem a participação de 189 colaboradores distribuídos em sete estados e outros seis países — Estados Unidos, Alemanha, Holanda, Colômbia, Guatemala e México. "Todos eles são coordenados por nosso grupo", afirma Maciel. O material biológico é objeto de 43 projetos de pesquisa conduzidos dentro e fora do Brasil.

Além do bem-sucedido tratamento de queimados e da reconstrução de vagina, estão sendo estudados outros usos do material em procedimentos odontológicos e veterinários. "Até agora depositamos cinco pedidos de patente no Brasil e no exterior", diz Maciel. Entre os produtos em teste, destacam-se scaffolds (suportes estruturais), biomaterial projetado para ser empregado na produção de válvulas cardíacas e telas para reparos de tendões e hérnias abdominais. "Só para scaffolds, há mais de uma dúzia de possíveis empregos diferentes", informa o cirurgião plástico.

*Com informações da BBC e da Revista Pesquisa Fapesp