Opinião

A nova cesta básica, os ultraprocessados e o câncer

Há alguns dias, li num dos principais jornais do país uma reportagem que informava que os brasileiros moradores das periferias tendem a consumir mais alimentos ultraprocessados. De acordo com o estudo da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), essa tendência é atribuída à escassez de opções saudáveis a preços acessíveis e à falta de conhecimento sobre alimentação.

A pesquisa revelou que os moradores das periferias consomem menos frutas e legumes regularmente, embora reconheçam que vegetais, carnes, arroz e feijão sejam opções mais saudáveis. Curiosamente, um estudo anterior da UFMG, de 2021, já havia indicado que adolescentes de escolas particulares tendiam a consumir mais alimentos ultraprocessados em comparação com seus colegas de escolas públicas.

Recentemente, um artigo publicado no British Medicine Journal apresentou uma ampla revisão de estudos sobre os malefícios dos alimentos ultraprocessados, associando-os a 32 efeitos prejudiciais à saúde.

Embora os pesquisadores ainda estejam investigando os mecanismos exatos pelos quais esses produtos afetam o organismo, já está estabelecida a conexão entre seu consumo e o desenvolvimento de doenças crônicas, como diabetes, problemas cardiovasculares e obesidade. A relação entre esses alimentos e o aumento do risco de diversos tipos de câncer também tem sido objeto de estudo há anos.

Porém, reverter essa situação não é tarefa simples. Reconhecemos que desembalar alimentos industrializados é mais fácil do que preparar refeições com ingredientes frescos. Além disso, os preços desses produtos e a dificuldade de acesso a uma dieta diversificada a valores acessíveis são obstáculos significativos para toda a população.

Neste sentido, é positiva a recente proposta para revisar a composição da cesta básica, alinhada às diretrizes dos Guias Alimentares para a População Brasileira. A ideia é priorizar alimentos frescos, como verduras, frutas, legumes e grãos integrais. No entanto, o desafio está em estabelecer estratégias de precificação que tornem essa cesta realmente acessível a todos os brasileiros.

Esta seria apenas uma das políticas que poderiam ser eficazes na mudança de abordagem para a prevenção de doenças crônicas no país. Além de apresentar soluções, é essencial criar oportunidades para que a população também possa desempenhar um papel ativo no cuidado de sua saúde.

Isso não só na alimentação, mas com a prática regular de atividade física, com a vacinação, com a atenção ao bem-estar mental.

Não basta apenas falar sobre os fatores de risco; é fundamental abordar as condições em que vive a maioria dos brasileiros. A educação tem uma função importante neste processo, e devemos criar as condições para que a adoção de hábitos saudáveis seja efetivamente possível.

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*Fernando Maluf é diretor associado do Centro Oncológico da BP - Beneficência Portuguesa de São Paulo, membro do Comitê Gestor do Centro de Oncologia do Hospital Israelita Albert Einstein e fundador do Instituto Vencer o Câncer. É formado em medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, onde hoje é livre-docente.

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Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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