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Larissa Cassiano

Estar previsto em lei não significa que a mulher seja obrigada a abortar

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

25/08/2020 04h00

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Semana passada foi noticiado o drama de uma menina de 10 anos que após sofrer consecutivos abusos sexuais por seu tio, engravidou. Uma menina que não deveria lidar com a violência sexual sofrida ainda precisou lidar com a violência de uma parte da nossa sociedade cheia de ódio.

Por este motivo acredito que falar sobre o aborto no Brasil é algo extremamente importante, para que situações como a que acompanhamos recentemente não se repitam e nem se perpetuem.

Não estou aqui para discutir questões pessoais e nem religiosas sobre o abortamento, porque este tema nos levaria a uma outra pauta totalmente diferente. Meu objetivo como ginecologista é falar sobre situações que já foram discutidas previamente e já são previstas em lei.

No Brasil, a interrupção de uma gestação é considerada legal em três situações: se a gestação representar um risco de vida para a gestante, se a gravidez tiver ocorrido após violência sexual e nos fetos com anencefalia.

Em todos estes casos o aborto está previsto na lei, não necessita de nenhum tipo de pedido judicial ou boletim de ocorrência.

Diante das situações de aborto que são liberadas pela lei, a mulher pode procurar um serviço de saúde pública para que todo procedimento seja realizado por equipe com profissionais de diversas áreas como médicos, enfermeiros e psicólogos. Esse atendimento não deve hostilizar a mulher, trazer julgamento ou questionar suas escolhas.

As exigências para o procedimento dependem da situação a que ele se refere, no caso do abortamento por risco à vida da gestante, em qualquer momento da gravidez ele poderá ser realizado necessitando do laudo de dois médicos.

Em situações de violência sexual, o procedimento pode ser feito até 20 a 22 semanas desde que o feto tenha menos de 500 gramas e neste caso é necessário um laudo médico que avalie a história da paciente e confirme se a cronologia do evento é concordante com período de gestação.

Por último, nos casos de anencefalia, não se estabelece uma idade gestacional e o laudo de dois médicos é o documento solicitado.

Mas e se o médico não se sentir confortável com esta situação, ele pode se negar?

Sim, o profissional pode se recusar a realizar o aborto caso não se sinta confortável de realizá-lo, desde que não se trate de uma situação de urgência e, neste caso, o hospital deve se responsabilizar por encontrar outro profissional que aceite realizar o procedimento.

Estar previsto em lei não significa que a mulher seja obrigada a optar pelo aborto. Antes de tudo ela tem que escolher passar pelo procedimento, sempre com autonomia, mesmo em situações liberadas em lei, para realizar ou não o aborto.

Independente dos motivos e das indicações do aborto legal, na maioria das vezes este é um processo de muita angústia para a maioria das mulheres que precisa recorrer a ele, então criar um ambiente acolhedor, amparar e ajudar são formas de amenizar a dor de mulheres que passam por este momento tão complexo.

Esse caso pode se enquadrar tanto em uma situação de violência, quanto de risco de vida à gestante, por este motivo não existia nenhum motivo para que um pedido judicial fosse feito, e sua intimidade fosse divulgada.

Ficou com dúvida sobre esse tema? Quer contar uma pouco da sua opinião? Fique à vontade, será um prazer receber seu comentário.