Topo

Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


Exames de imagem não são necessários para tratar dor lombar

iStock
Imagem: iStock

Colunista do UOL

27/07/2018 04h00

Quando uma pessoa com dor na coluna lombar procura um profissional da saúde é frequente obter a resposta de que é necessário um exame de imagem, como uma ressonância magnética ou tomografia para identificar o que está causando dor.

Será que essa resposta é correta? Na maior parte das vezes não.

Mas como assim?

Pois bem, os exames de imagem sugeridos teriam como objetivo, em casos como esse, a identificação de alterações como protrusões, "bicos de papagaio", alterações da altura do disco intervertebral ou fissuras, espondilolistese e outras que seriam a causa das dores daquele paciente. Mas, na realidade, não é possível dizer que essas alterações sejam a causa das dores.

Parece surpreendente, mas não é.

Em 2015 foi publicado na Revista Americana de Neuroradiologia uma pesquisa que agregou informações de diversos outros estudos, com o objetivo de verificar a ocorrência dessas alterações da coluna lombar em pessoas sem sintomas (1). Ao todo foram analisados os exames de mais de 3000 pessoas. E o que foi encontrado?

Que as alterações são muito comuns e que são encontradas mais frequentemente à medida que a pessoa é mais velha. Ou seja, quanto mais idade alguém tiver, maior a chance de ter uma ou mais alterações. Lembrando que estamos falando de pessoas sem sintomas.

A sugestão dos autores do estudo é que "essas alterações são parte normal do processo de envelhecimento, e não condições patológicas que necessitem de alguma intervenção".

Se pessoas que têm essas alterações não têm dor, fica difícil dizer que a presença dessas alterações causem dor.

Mas e quando a pessoa tem uma crise de dor lombar? Será que ela teve uma nova protrusão ou alteração na coluna?

Também parece já haver resposta a essa pergunta. Ela se baseia em dois estudos. O primeiro foi realizado na Universidade de Washington e publicado em 2005 na revista Spine (2). Nele mais de 100 pessoas sem sintomas realizaram um exame de ressonância inicialmente, e foram acompanhadas por 3 anos. Naquelas que desenvolveram dor, novo exame de imagem foi realizado.

Não foram observadas novas alterações na grande maior parte dos casos.

Mas há um outro estudo similar, este realizado por pesquisadores da Universidade de Stanford (3). Acompanharam mais de 200 pessoas, sem dor inicialmente, que realizavam ressonância magnética e eram acompanhadas ao longo do tempo. Aquelas que passaram a ter uma crise de dor intensa realizaram novo exame, de forma a se verificar a presença de novas alterações.

Observaram que uma nova crise de dor lombar não promovia novas alterações no exame de imagem na vasta maior parte dos casos.

O surgimento de dor não foi provocado por uma alteração ou lesão da coluna.

Se observarmos que 1)as alterações estão presentes em pessoas que não têm dor; e que 2) pessoas que desenvolvem dor não apresentam novas alterações, podemos dizer que as alterações são as responsáveis pela dor?

Não podemos.

Tem algum mal fazer o exame?

Em primeiro lugar temos de dizer que, ao que tudo indica, não há benefícios em se fazer o exame de imagem. Ele não vai fazer o tratamento ser mais rápido ou efetivo (4). Além disso, tanto nas radiografias como nas tomografias computadorizadas há exposição à radiação (5, 6, 7).

Outro aspecto, referente às ressonâncias magnéticas, é o risco de reação alérgica ao contraste (8, 9, 10, 11). O risco de reações alérgicas graves é muito pequeno, mas presente.

Mas um aspecto muito interessante é que a realização da ressonância magnética em pessoas com dor lombar parece levar a um caminho de tratamento que envolve mais custos, mais exames, mais tratamentos e mais riscos (12, 13, 14).

Estamos falando de novos exames de imagem, exames invasivos (como a discografia), aplicação de injeções e novas cirurgias, cujo custo estimado é de US$ 8 a 13 mil maior em relação àqueles que não realizam ressonância magnética.

Quando o exame de imagem é necessário?

Há uma situação na qual o exame de imagem pode, de fato, ser necessário. Isso acontece quando se desconfia de uma condição séria como causa da dor (15). E quando falamos de uma condição séria estamos nos referindo a tumores, fraturas e outras doenças. Essas orientações são baseadas nos principais guias clínicos para tratamento e diagnóstico da dor lombar atuais (15, 16) e são usadas por diversas associações médicas norte americanas.

Se o profissional que atende alguém com dor lombar desconfia da presença de alguma dessas condições, ele deve encaminhar o paciente para a realização do exame adequado para confirmar ou descartar essa dúvida. Outra situação é quando uma crise inicial de dor não melhorou num período de 4 semanas após seu início. Sendo este o caso, a realização de um exame de imagem também passa a ser recomendada.

Evidentemente, nada substitui uma consulta com um profissional da saúde atualizado.

Referências
1. BRINJIKI et al - Systematic literature review of imaging features of spinal degeneration in asymptomatic populations - AJNR Am J Neuroradiol, v36 n4 2015. BRINJIKI et al - 2015
2. Jarvik JG, Hollingworth W, Heagerty PJ, Haynor DR, Boyko EJ, Deyo RA. Three-year incidence of low back pain in an initially asymptomatic cohort: clinical and imaging risk factors. Spine. 2005 Jul 1;30(13):1541–8; discussion 1549. JARVIK et al - 2005
3. Carragee E, Alamin T, Cheng I, Franklin T, van den Haak E, Hurwitz E. Are first-time episodes of serious LBP associated with new MRI findings? Spine J. 2006 Dec;6(6):624–35. CARRAGEE et al - 2006
4. Chou R, Fu R, Carrino JA, Deyo RA. Imaging strategies for low-back pain: systematic review and meta-analysis. The Lancet. 2009 Feb;373(9662):463–72. CHOU et al (2009)
5. Brenner DJ, Hall EJ. Computed tomography--an increasing source of radiation exposure. N Engl J Med. 2007 Nov 29;357(22):2277–84. BRENNER & HALL - 2007
6. Berrington de González A, Mahesh M, Kim K-P, Bhargavan M, Lewis R, Mettler F, et al. Projected cancer risks from computed tomographic scans performed in the United States in 2007. Arch Intern Med. 2009 Dec 14;169(22):2071–7. BERRINGTON DE GONZALEZ et al - 2009
7. Fazel R, Krumholz HM, Wang Y, Ross JS, Chen J, Ting HH, et al. Exposure to Low-Dose Ionizing Radiation from Medical Imaging Procedures. New England Journal of Medicine. 2009 Aug 27;361(9):849–57. FAZEL et al - 2009
8. Shellock FG, Kanal E. Safety of magnetic resonance imaging contrast agents. J Magn Reson Imaging. 1999 Sep;10(3):477–84. SHELLOCK & CANAL - 1999
9. Li A, Wong CS, Wong MK, Lee CM, Au Yeung MC. Acute adverse reactions to magnetic resonance contrast media--gadolinium chelates. Br J Radiol. 2006 May;79(941):368–71. LI et al - 2006
10. Prince MR, Zhang H, Zou Z, Staron RB, Brill PW. Incidence of immediate gadolinium contrast media reactions. AJR Am J Roentgenol. 2011 Feb;196(2):W138-143. PRINCE et al - 2011
11. Jung J-W, Kang H-R, Kim M-H, Lee W, Min K-U, Han M-H, et al. Immediate hypersensitivity reaction to gadolinium-based MR contrast media. Radiology. 2012 Aug;264(2):414–22. JUNG et al - 2012
12. Webster BS, Bauer AZ, Choi Y, Cifuentes M, Pransky GS. Iatrogenic consequences of early magnetic resonance imaging in acute, work-related, disabling low back pain. Spine. 2013 Oct 15;38(22):1939–46. WEBSTER et al - 2013
13. Webster BS, Choi Y, Bauer AZ, Cifuentes M, Pransky G. The cascade of medical services and associated longitudinal costs due to nonadherent magnetic resonance imaging for low back pain. Spine. 2014 Aug 1;39(17):1433–40. WEBSTER et al - 2014
14. Fisher ES, Welch HG. Avoiding the unintended consequences of growth in medical care: how might more be worse? JAMA. 1999 Feb 3;281(5):446–53. FISHER & WELSH - 1999
15. Chou R, Qaseem A, Snow V, Casey D, Cross JT, Shekelle P, et al. Diagnosis and treatment of low back pain: a joint clinical practice guideline from the American College of Physicians and the American Pain Society. Ann Intern Med. 2007 Oct 2;147(7):478–91. CHOU et al (2007)
16. O'Connell NE, et al., Clinical guidelines for low back pain: A critical review of consensus and inconsistencies across three major guidelines, Best Practice & Research Clinical Rheumatology (2017), http://dx.doi.org/10.1016/j.berh.2017.05.001
17. Iniciativa Choosing Wisely - http://www.choosingwisely.org/