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Por que torcedores do Irã usam a Copa para pedir liberdade para mulheres?

Copa do Mundo: torcedores do Irã fazem protesto contra o governo iraniano, que tem fortes represálias contra mulheres.  - reprodução
Copa do Mundo: torcedores do Irã fazem protesto contra o governo iraniano, que tem fortes represálias contra mulheres. Imagem: reprodução

Anita Efraim

Colaboração para Universa, em São Paulo

21/11/2022 14h47

Na manhã desta segunda-feira (21), o jogo entre Irã e Inglaterra, manifestações de torcedores e jogadores chamaram a atenção. Durante a execução do hino do Irã, os torcedores presentes vaiaram, enquanto os atletas se recusaram a cantar. Iranianos levantaram placas com as cores da bandeira do país e as palavras "mulheres", "vida" e "liberdade".

As manifestações são mais um capítulo de uma série de protestos que têm mobilizado a vida do Irã. Tudo começou em 16 de setembro, quando a jovem Mahsa Amini, de 22 anos, morreu durante uma abordagem policial por 'uso inadequado' do véu islâmico.

Desde então, iranianos têm ido às ruas para protestas em diversas partes do país, em especial em região de maioria curda, mesmo grupo étnico que Mahsa Amini. O povo curdo luta pela própria autodeterminação e costumam ser reprimidos pelo governo iraniano. Com os protestos, a violência aumentou.

"Esse caso foi o catalisador de diversos protestos contra as políticas repressivas do governo em relação às mulheres", explica Karina Calandrin, doutora em Relações Internacionais pelo programa Santiago Dantas, pesquisadora da USP e coordenadora do Instituto Brasil-Israel.

"O Irã, desde 1979, é uma teocracia fundamentalista islâmica que utiliza como base para todas as leis do país a Sharia, uma interpretação radical da lei islâmica que afeta muito a vida das mulheres, obrigando o uso do véu - que é entendido como opção da mulher no islamismo - e limitando diversas atividades às mulheres", afirma.

Qatar também aplica a Sharia

"O governo do Irã tem combatido fortemente as manifestações, já estimam que 380 pessoas, incluindo 47 crianças, morreram fruto do combate de autoridades aos protestos", diz a especialista.

De forma geral, a Copa do Mundo é um evento de alto visibilidade e, por isso, protestos feitos neste contexto ecoam em todo o planeta. No entanto, com o evento no Qatar, as manifestações ganham ainda mais significado: o país sede, o primeiro do Oriente Médio a receber uma Copa, também aplica a Sharia.

Para Karina Calandrin, esse aspecto eleva o tom das críticas internacionais e coloca os problemas da região nos holofotes do mundo ocidental. Ao mesmo tempo, alerta, é preciso ter cuidado para não recair no mito do "branco salvador" - quando pessoas brancas, educadas pela moral cristã entendem que todos que estão fora deste contexto precisam ser salvos.

Mulheres muçulmanas que usam véu não querem ter assegurado o direito de escolher como professam a fé islâmica, sem serem violentadas por isso.

"Toda a noção que temos de direitos humanos é ocidental, e o ocidente sempre subjulgou o oriente (tanto diretamente com colonialismo, imperialismo, quanto indiretamente, de forma econômica, política e cultural). Há um senso comum no ocidente de que o oriente é inferior em todos os aspectos, que são incivilizados, bárbaros. Isso faz com que haja uma imposição dos valores culturais ocidentais ao oriente", finaliza a especialista.