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A médica que ajudou o Hospital das Clínicas a enfrentar Covid usando robôs

A médica Lilian Ishida Arai, da Hackmed - Stela Murgel/Divulgação
A médica Lilian Ishida Arai, da Hackmed Imagem: Stela Murgel/Divulgação

Carol Firmino

Colaboração para Universa

07/08/2020 04h00

Quem chega ao Hospital das Clínicas, em São Paulo, com sintomas de Covid é recepcionado por um robô. De longe, uma enfermeira monitora as respostas dadas pelo paciente e faz a triagem do atendimento. A medida, adotada pelo hospital durante a pandemia, reduz o risco de contaminação da equipe e a rotatividade de funcionários. A tecnologia chegou ao hospital por meio da médica otorrinolaringologista Lilian Ishida Arai, 53.

Médica e empreendedora, Lilian está à frente da Hackmed, uma startup focada em inovação em saúde por meio de novas tecnologias. Se o projeto já é desafiador em um panorama de normalidade, imagine adequá-lo às necessidades de uma crise sanitária?

Ela explica que, logo no início da pandemia, muitos funcionários precisavam ficar em quarentena após contato com qualquer pessoa infectada pela doença, o que afetava a rotina do hospital. Em busca de uma solução, Lilian se juntou ao comitê de crise do coronavírus no HC e colocou a tecnologia a serviço da segurança em saúde.

Mas até um ano atrás, a vida de Lilian era muito diferente. Para acompanhar o desenvolvimento dos dois filhos, ela, que é formada pela Universidade de São Paulo, preferiu focar seu trabalho no atendimento em consultório ao longo de 30 anos. "Meu marido sempre teve condições de nos sustentar. Toda escolha implica alguma renúncia, e eu me considerava fundamental no desenvolvimento deles", conta.

Ela diz que depois que os filhos cresceram e se encaminham em suas carreiras, cresceu nela nova inquietação: ela precisava se redescobrir profissionalmente.

Por causa dos filhos, ela estava envolvida em olimpíadas científicas para alunos de alto rendimento acadêmico e criou no Facebook o grupo Pais Olímpicos, para orientar quem buscava uma oportunidade fora do Brasil. "Eu acompanho os sonhos desses jovens de transformar o futuro da sociedade", diz.

Assim ela conheceu um aluno da USP que fez intercâmbio na Universidade de Harvard em 2018, nos Estados Unidos, e voltou com a ideia de criar um hackathon na área de saúde do Brasil, inspirado no modelo do MIT Hacking Medicine.

O hackathon é uma competição em que times formados por pessoas de áreas diferentes, sejam médicos, engenheiros, programadores, designers, administradores ou estudantes, se encontram a fim de criar uma solução criativa para problemas identificados em suas próprias realidades.

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Imagem: Stela Murgel/Divulgação

Fundar uma empresa após os 50 anos

Lilian foi contagiada pela proposta e, em março de 2019, fundou com outros 4 especialistas a Hackmed. A primeira conferência da startup foi realizada no HC no final de janeiro desde anos, poucas semanas antes da pandemia atingir o Brasil, e reuniu referências da área da saúde, tecnologia, acadêmicos, investidores, empresários e representantes do governo para discutir temas de inovação. "O incrível é que fizemos toda a divulgação apenas por redes sociais e envolvemos mais de 1.200 pessoas vindas de todas as regiões do país. Não tínhamos mais como parar", conta.

Esse encontro relatado por Lilian aconteceu em janeiro de 2020, pouco antes das notícias sobre a pandemia da Covid-19 começarem a preocupar o Brasil.

No comitê de crise do HC, ela propôs que robôs também pudessem ser utilizados na UTI e nas enfermarias, com o objetivo de promover o encontro virtual entre o paciente isolado e a família. O projeto foi desenvolvido com três robôs de telepresença, 40 tablets e 50 celulares para televisitas, mobilizando um grande grupo de voluntários orientados por Izabel Rios, chefe do departamento de Humanização do HC.

Ela quer replicar a metodologia para empreender

Atualmente, além das conferências que a Hackmed realiza, a startup pretende lançar o Hackmed Health Innovation Program, reunindo metodologias das universidades USP, Stanford, MIT e Harvard para capacitar pessoas que desejam empreender em saúde. "É fato que a pandemia impactou o mundo inteiro. Para onde isso vai, depende do que faremos daqui para frente. É fundamental inovar e empreender em nosso próprio futuro, não apenas em negócios", destaca.

Eu vivo a pandemia de um jeito diferente que a maioria. Encontrei espaço para trabalhar de forma muito positiva, e realmente acredito que fomos relevantes no sentido de humanizar o atendimento com o uso da tecnologia, o que traz o sentimento de realização pessoal

Ela também comemora o número de mulheres na coordenação de projetos importantes dentro de hospitais. "Por mais que eu dê risada da minha dificuldade de usar alguns recursos tecnológicos, percebo que precisamos valorizar nossos talentos e mostrar o quanto é importante esse olhar diferente, que complementa o que os homens e os mais jovens têm."

Como mantra para viver os desafios diários e buscar crescimento pessoal, ela acredita que o sucesso está em transformar as próprias escolhas nas melhores decisões de sua vida.