Quem decide o tamanho da sua fome: as emoções ou o estômago?
"Quando iniciei meu tratamento com a psicóloga, uma frase me marcou: buscamos na terceira, quarta ou quinta fatia o prazer que tivemos ao comer o primeiro pedaço, mas não vamos encontrar”, conta a especialista em marketing Marly Palmieri dos Prazeres, 59. Há quase um ano, ela conta com a ajuda de uma terapeuta para manter o peso sob controle. Ela, que tem 1,70 m de altura, chegou a pesar 115 kg.
“Sou ansiosa, tenho crises de depressão, e minha relação com a comida sempre foi conturbada. Ficou claro para mim que durante muito tempo usei o ato de comer como um fator de apoio. Então decidi fazer uma cirurgia bariátrica e perder peso com calma. As sessões de terapia me ajudaram a pensar melhor nas escolhas que faço, passei a me perguntar por que decidi comer algo”, conta.
Para o psiquiatra Leandro Savoy, especialista em transtornos alimentares e dependência química, a emoção e a alimentação estão intimamente ligadas.
“Se por um lado, certos alimentos podem levantar o humor e provocar uma sensação de bem-estar, o sofrimento psíquico pode acarretar uma alimentação inadequada ou mesmo um transtorno alimentar. O estresse e a ansiedade podem fazer com que a pessoa dedique menos atenção à qualidade da alimentação, optando por alimentos com baixo valor nutricional”, afirma Savoy.
A fala do especialista é atestada cientificamente. Segundo estudo da Universidade de San Diego, nos Estados Unidos, publicado no “Journal of Health Psychology”, em junho de 2015, o consumo de gordura trans --comumente exemplificado por doces ou fast food— está ligado a um estado de baixa atenção emocional e dificuldade em controlar o humor.
A compulsão alimentar é frequentemente associada a transtornos de ansiedade, de acordo com a psicóloga Valéria Palazzo Lemos, coordenadora do GATDA (Grupo de Apoio e Tratamento dos Distúrbios Alimentares e da Ansiedade), em São Paulo.
“O doce funciona como um acalentador, tem apelo emocional e essa relação é feita desde a infância. Também existe o perfil de quem diminui o consumo de comidas em geral em um período de dificuldade, porém, em ambos os casos, é frequente o quadro de angústia e depressão”, fala Valéria.
O sucesso de uma dieta depende muito do equilíbrio emocional do indivíduo, segundo a médica Maria Edna de Melo, diretora do Departamento de Obesidade da SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia). As emoções não só influenciam na decisão do que o indivíduo vai comer como também traz consequências fisiológicas.
“Quando estamos estressados, há um aumento de adrenalina e isso afeta o cortisol, que age diretamente no aumento de gordura no corpo. Como esse hormônio forma tecido adiposo, essa luta será perdida se não houver tratamento adequado”, explica Maria Edna.
O psiquiatra Alexandre Pinto de Azevedo, do Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, propõe uma autoanálise para que o indivíduo perceba de que maneira seu estado emocional afeta a forma como ele se alimenta.
“Comece prestando atenção nos horários em que come e tente identificar as emoções e os sentimentos que tem nesses momentos. Além disso, é importante perceber quais situações ou adversidades vivenciadas promovem mudança no comportamento alimentar”, afirma Azevedo.
Uma forma de colocar em prática o conselho do psiquiatra é anotar em uma espécie de diário, durante um período entre cinco e sete dias, o que come, considerando o que foi ingerido também nos intervalos das refeições. “É importante verificar se o que se comeu ajudou a melhorar a ansiedade e também se houve uma alteração qualitativa ou quantitativa, como aumento da ingestão de doces”, diz Valéria Palazzo.
O recurso foi um aliado de Marly Palmieri. “Esse exercício me ajudou a ficar frente a frente com o problema. Como trabalho em casa, vou facilmente à cozinha, mas agora uso o truque de beber um copo de água e consigo olhar para uma guloseima e dizer ‘ dá para esperar’.”
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