Em tempos de crise, ao divergir, muna-se de argumentos e não de raiva

O Brasil está fervilhando em meio a uma crise política e econômica. As ruas e a internet se transformaram em um ringue para muitas pessoas. E não é difícil encontrar alguém que tenha uma história de rompimento com amigos ou familiares motivada por divergências de opiniões. Porém, para preservar relações, é fundamental exercitar a tolerância.
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- http://mulher.uol.com.br/comportamento/enquetes/2016/03/25/por-causa-da-crise-voce-ja-rompeu-relacoes-com-um-amigo-ou-parente.js
Para Cassiana Carvalhal, mestre em análise do comportamento e docente do Departamento de Psicologia da UEL (Universidade Estadual de Londrina), a dificuldade do ser humano em aceitar um ponto de vista diferente existe porque não somos ensinados a argumentar com embasamento, mas nos sentimos ofendidos e reagimos com agressividade. "Já percebeu como é difícil dizer que não concorda com alguém sem causar um mal-estar? A tendência do comportamento é polarizar a discussão de forma maniqueísta entre os certos e bons e os errados e maus."
A especialista diz que esse tipo de divisão coloca os que têm opiniões contrárias como inimigos, sem valores e moral, principalmente quando as questões políticas são discutidas de forma superficial. Para ela, as pessoas agem como se só existissem dois posicionamentos possíveis --contra e a favor do governo.
Porém, antes de julgar alguém como bom ou mau, esquerda ou direita, precisamos compreender os motivos que levaram alguém a pensar de certa forma. "A tolerância é a base da democracia, mas um país ser democrático não garante que seus habitantes ajam democraticamente. É preciso ensiná-los a se comportarem de tal forma, o que só é possível incentivando o diálogo --e não a briga-- com o diferente."
Pensar "mas vou falar para quê? Fulano não vai entender mesmo a minha forma de pensar" é mais um erro na busca pelo exercício da condescendência. Guardar a sua opinião pode até ser uma atitude inteligente para evitar problemas, mas pode soar como falta de engajamento e alienação. É por isso, de acordo com Thaysa Molina, psicóloga cognitivo-comportamental, que temos tantos debates superficiais. "Existem muitas informações rasas e que não levam a nada simplesmente porque aquele que se mostra incapaz de emitir uma visão é visto como incompetente." Segundo Cassiana, “o fato de muitas pessoas quererem se envolver na discussão é positivo, mas seria melhor se fosse de forma mais fundamentada".
Para as especialistas, é fundamental ter clareza de que é cômodo estar apenas cercado de pessoas que pensam como você, mas não é uma posição nada produtiva.
Alcance das redes sociais
Para Cassiana, o problema não são as redes sociais, mas a falta de repertório para fazer uso delas. "Elas potencializam a discussão porque uma opinião publicada alcança uma infinidade de pessoas. Outro ponto é que as relações virtuais nos afastam das consequências diretas das nossas ações e, portanto, perdemos o cuidado com o que falamos."
O tom acalorado --para não dizer de briga de torcida-- que muitas vezes toma conta das discussões no ambiente virtual também vem do fato de as pessoas não quererem "ficar para trás", sentindo-se "obrigadas" a formarem opiniões sobre tudo, dado ao fluxo rápido de informação.
"É ridículo porque ninguém domina todos os assuntos. Tudo vira motivo de barbárie, algo que se torna cansativo e vai diminuindo cada dia mais o número de amigos virtuais --erro que cometemos pelo conforto de só querer ver pensamentos semelhantes", declara Pollyana Ferrari, consultora em mídias sociais e autora do livro "No Tempo das Telas" (Estação das Letras).
Pollyana, que também é professora da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo, afirma que outro equívoco é enxergar as telas como escudos. "Elas tiram o filtro do comportamento. É como se pegassem um megafone para gritar suas opiniões por pura sede de briga. É preciso pensar antes de postar, assim como de falar na vida real. Ou então, fica muito fácil: discordou? Excluí."
Celso Figueiredo, doutor em comunicação e docente na Universidade Presbiteriana Mackenzie, também na capital paulista, pontua a figura do que chama de "ativista de sofá". "Uma das funções primordiais das redes sociais é dar a oportunidade de colocar para fora nossos próprios demônios. É como em um jogo de times rivais no futebol: o fulano vai para xingar o outro, mas não faz nada, de fato, para que qualquer coisa mude de rumo. E é assim que grande parte dos brigões superengajados se comporta nas redes sociais."
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