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Atletas contam prós e contras de iniciar esportes na infância

A judoca Mayra Aguiar entrou no tatame pela primeira vez quando tinha seis anos - Montagem/Divulgação
A judoca Mayra Aguiar entrou no tatame pela primeira vez quando tinha seis anos Imagem: Montagem/Divulgação

Marina Oliveira e Rita Trevisan

Do UOL, em São Paulo

31/07/2015 07h40

Ver o filho se tornar um atleta profissional, ganhar troféus e medalhas, e ter uma carreira de sucesso é o sonho de muitos pais. Mas, muitas vezes, para isso acontecer, é preciso incentivar a criança a começar a prática de esportes desde muito cedo, o que pode interferir em seu desenvolvimento físico e emocional, tanto positiva quanto negativamente.

A judoca Mayra Aguiar, 23 anos, campeã mundial de judô e medalhista olímpica, entrou no tatame pela primeira vez aos seis anos. "Comecei a treinar como profissional quando eu tinha 14 anos, depois de ficar com a medalha de prata nos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro", diz.

Por conta das competições, ela afirma ter se tornado mais disciplinada. "No colégio, tinha que me esforçar em dobro, pois viajava muito para competir. Minha alimentação também sempre foi bastante controlada", conta.

A nadadora Larissa Oliveira - Satiro Sodré - Satiro Sodré
A nadadora Larissa Oliveira se tornou profissional depois do Ensino Médio
Imagem: Satiro Sodré

A história da nadadora Larissa Martins Oliveira, 22, atleta do Esporte Clube Pinheiros e da seleção brasileira, é parecida com a da judoca. "Quando era bebê, eu já adorava piscina. Mas, no início, fazia natação sem compromisso, só para ter uma atividade física", fala. Até os 17 anos, sua rotina era planejada para não prejudicar os estudos, e ela só virou profissional depois de terminar o ensino médio.

Na opinião do pediatra Marcelo Reibscheid, do Hospital São Luiz, de São Paulo, as trajetórias das duas atletas são exemplares: começaram no esporte sem deixar de realizar atividades comuns da infância e não tiveram de lidar com um excesso de exigências físicas e psicológicas, o que poderia levar a lesões e frustrações.

"Criança tem que ser criança: brincar, estudar e praticar esporte como um hobby. Os pais não devem forçar nada. O envolvimento com a modalidade tem que vir dela, que, com o tempo, poderá ou não encarar aquela atividade física de maneira mais séria", explica.

A jogadora de vôlei Paula Pequeno, que começou no esporte na adolescência - Divulgação - Divulgação
A jogadora de vôlei Paula Pequeno virou profissional na adolescência
Imagem: Divulgação

A jogadora de vôlei Paula Pequeno, 33, bicampeã olímpica, entrou na quadra um pouco mais tarde, aos 12 anos. A partir daí, não parou mais de treinar. "Foi tudo muito rápido. Aos 14, eu já estava na seleção brasiliense de vôlei e, aos 17, estreava na seleção brasileira", diz.

A dedicação ao esporte a levou a interromper os estudos ao final do ensino fundamental. "Eu era ótima aluna, mas entrei de cabeça no vôlei. Mudei de Brasília para São Paulo aos 15 anos, quando já tinha uma carga horária de adulto: treinava de manhã e à tarde, de segunda a sábado", conta.

No tempo certo

A faixa etária em que Paula estreou no esporte competitivo é considerada a mais adequada, segundo o fisiologista do exercício Paulo Correia, coordenador do laboratório de neurofisiologia e fisiologia do exercício da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). "A partir da puberdade, meninos e meninas têm força e resistência muscular para intensificar a prática esportiva", explica.

Até os cinco anos, a criança deve ser estimulada a correr, saltar, pular e a pedalar sem compromisso, para que possa desenvolver habilidades importantes. "Os menores de seis anos ainda não têm maturidade para perceber velocidade e seguir objetos como uma bola, por exemplo. É com essa prática inicial que vão aprender o conceito de forte e fraco, pesado e leve", afirma a pediatra Sulim Abramovici, do Hospital Infantil Sabará, também de São Paulo.

Cabe aos pais e à escola oferecerem às crianças a possibilidade de escolher uma prática esportiva. "Mas os filhos não devem ser pressionados com base na possibilidade de sucesso financeiro no futuro, ou apenas para suprir uma frustração pessoal dos pais", diz a pediatra.

Sem exageros

Quando a criança começa um treinamento esportivo para competições, alguns sinais podem indicar se a prática está prejudicando seu desenvolvimento. "Ela não pode passar mal no treino --desmaiar, vomitar, ter enjoos-- frequentemente, nem voltar para casa muito machucada ou dolorida", diz o fisiologista Paulo Correia.

"Se os pais perceberem esses tipos de ocorrências, devem investigar se o professor não está intensificando em excesso os treinamentos, ou se a própria criança está exigindo demais de si, por vontade própria", afirma.

Vantagens e desvantagens

Os benéficos da prática de atividades físicas na infância atingem os mais diversos órgãos e sistemas do corpo humano: cardiovascular, respiratório, muscular (aumento de massa, força e resistência) e esquelético (fortalecimento ósseo e cartilaginoso). "O exercício também auxilia na prevenção e no tratamento da obesidade e favorece a disciplina e a socialização da criança", diz Sulim Abramovici.

Entretanto, em muitos casos, a criança tem de abrir mão de programas típicos da idade. "Perdi festas, saídas com os amigos e aniversários de família. Sempre me esforcei para ter uma vida pessoal, pois a minha felicidade influencia positivamente no meu treinamento", fala Mayra.

Para Larissa, o maior prejuízo foi o abandono da vida escolar. "Infelizmente, não se consegue ter, ao mesmo tempo, uma vida esportiva e uma acadêmica. É preciso optar por uma delas, e eu escolhi o esporte. Estou com a faculdade trancada há dois anos", conta.

O maior prejuízo do atleta profissional, no entanto, é sentido na pele, ou melhor, no corpo todo. "A dor faz parte da rotina, e a gente tem de aprender a lidar com ela. O atleta de alto nível nunca vai treinar sem dor, e alguns desgastes no corpo são irreversíveis", afirma Paula Pequeno.