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Por que algumas pessoas mudam de personalidade quando trocam de par?

Assumir como seus os gostos do parceiro pode estragar o relacionamento - Getty Images
Assumir como seus os gostos do parceiro pode estragar o relacionamento Imagem: Getty Images

Heloísa Noronha

Do UOL, em São Paulo

07/05/2015 07h25

É comum, ao iniciar um namoro, tentar se adaptar à vida do novo par e compartilhar programas, gostos, preferências, alguns desconhecidos até então. Entretanto, há quem extrapole e acabe forçando a barra, deixando de lado a própria personalidade para agradar.

Esses "mutantes do amor" se transformam conforme o estilo de vida do outro: se a pessoa gosta de surfe, aprendem a surfar também; se curtem um determinado gênero musical, passam a ouvir só isso; se preferem certo tipo de comida, também. Com o passar do tempo, a “transformação” pode assustar o parceiro.

Assumir como suas as preferências do outro é um mecanismo defensivo e estrutural que se inicia na infância, segundo o psicólogo clínico Roberto Rosas Fernandes, diretor de publicações da SBPA (Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica).

“É o jeito que a criança encontra para obter atenção dos pais. Podemos dizer que pessoas que agem assim são regredidas, agem como uma criança que procura agradar aos pais”, fala. O psicólogo afirma que, ao criar um “falso eu” para cativar o objeto de amor, a pessoa corre o risco de “apagar” as características que despertaram a atenção do par.

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Crianças que também tiveram sua individualidade podada pelos pais, que consideraram seus gostos diferentes ou dissonantes como ingratidão ou deslealdade, não só podem desenvolver sentimento de culpa como aprender que, para serem amadas, precisam se adequar ao outro.

Amor x dependência

Crenças equivocadas sobre o amor também merecem atenção. Segundo a psicóloga e terapeuta de casal Ana Maria Fonseca Zampieri, autora do livro “Erotismo, Sexualidade, Casamento e Infidelidade” (Editora Ágora), algumas pessoas têm necessidade de que outras dependam dela. “Elas parecem acreditar que a submissão à vida do outro é uma forma de amar intensamente.”

Para ela, nem sempre as pessoas se dão conta de que agem dessa forma. “Algumas só percebem quando são abandonas por quem fizeram tudo o que podiam”, fala Ana Maria.

Os relacionamentos construídos nessas bases tendem a não dar certo, porque o par se cansa de ter uma espécie de cópia ao seu lado. “Partilhar crenças e hobbies ajuda uma relação dar certo, mas é um erro não levar nada de novo para a parceria, tornando-se um seguidor e não um companheiro”, declara Lígia Baruch Figueiredo, mestre e doutoranda em psicologia e pesquisadora do Núcleo de Família e Comunidade da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo.

Quando casal está se apaixonando, a entrega e a mistura dos dois são naturais. Os problemas só aparecem quando o excesso de espelhamento começa a causar estranheza nas pessoas ao redor.

Conforme a experiência da psicóloga e psicodramatista Adelsa Cunha, co-organizadora do livro “Por Todas as Formas de Amor – O Psicodramatista Diante das Relações Amorosas” (Ed. Ágora), tal comportamento tem maior incidência entre o sexo feminino, sendo fruto de um modelo cultural que apregoa que uma boa companheira aceita o outro e quer compartilhar da sua vida.

“Quem quer construir uma relação precisa fazer concessões e aprender o que é importante para o par, mas isso não significa se transformar nele ou naquilo que supõe que ele espera, muitas vezes negando a própria essência”, diz Adelsa.

Como romper o padrão?

Para Roberto Fernandes, o investimento de energia em si mesmo é fundamental para a ampliação da consciência e para a transformação desse desequilíbrio.

Ana Maria afirma que se livrar de velhas crenças sobre relacionamentos é o caminho para romper esse padrão. “É um erro imaginar que alguém seja totalmente responsável por nos fazer feliz. Em qualquer relação, é preciso entender que desagradar a quem se ama, em alguns momentos, é uma forma de manter o respeito por si mesmo. É fundamental colocar limites adequados no relacionamento”, diz a psicóloga.

Na opinião de Adelsa Cunha, o primeiro passo para parar de viver a vida do outro é adquirir a consciência de que esse mecanismo, no fundo, não faz bem. “Até porque o que não é autêntico nem espontâneo não dura. A verdade de cada um, sorrateiramente, aparece em flashes de comportamentos inconscientes. É preciso acreditar que quem ama, vai amar a pessoa do jeito que ela é. Todo e qualquer esforço que fortaleça a autoestima ajuda a romper esse círculo vicioso.”