Mil primeiros dias da criança são decisivos para prevenir obesidade
As pesquisas científicas já comprovaram há tempos que uma criança gordinha não é mais saudável do que uma sem dobrinhas. Mesmo assim, os pediatras seguem chamando atenção para o grande número de crianças acima do peso. Obesidade é doença e pode acarretar outros males que comprometerão o resto da vida do indivíduo, como diabetes e hipertensão.
Embora tenha natureza genética, os genes sozinhos não determinam o mal. O ambiente influencia e muito (hábitos alimentares e comportamentais), mas é perfeitamente possível que o ganho de peso seja controlado.
O início da vida do bebê –mais especificamente os mil primeiros dias, incluindo os de gestação– é uma fase decisiva para o desenvolvimento da obesidade, de acordo com o documento “Obesidade na Infância e Adolescência: Manual de Orientação do Departamento Científico de Nutrologia da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria)”. Manter sob controle a qualidade e a quantidade da alimentação da gestante, então, é fundamental.
O “Estudo Nutriplanet Danone Baby Nutrition – Revisão Sistemática da Literatura Científica sobre o Contexto Alimentar e Nutricional de Gestantes, Lactantes, Lactentes e Primeira Infância”, de 2012, revelou que 31% das grávidas brasileiras são obesas e mantêm uma dieta alimentar com excessos de carboidratos, proteínas e sódio, e baixa ingestão de ferro, cálcio, fibras e ácidos das famílias do ômega-3 e 6.
Engravidar com sobrepeso ou engordar mais que do que o recomendado pelo médico durante os nove meses, por exemplo, faz com que a mulher dê à luz bebês mais gordinhos, fator que persistirá até por volta de quatro e cinco anos de vida da criança.
Os bons e maus hábitos alimentares da mãe não só determinam a saúde dela: também influenciam o bebê desde o útero. Ele consome o líquido amniótico para desenvolver o trato gastrointestinal e, por causa disso, saboreia o produto, acostumando-se a sabores diferentes de alimentos ingeridos pela mulher.
Esse processo é o pontapé inicial para o desenvolvimento do paladar infantil. Por isso, quanto mais saudável e diversa a alimentação da mãe, melhor para a saúde dela e do filho. “Quando nascer, ele vai aceitar novos alimentos com mais facilidade”, afirma Fabíola Suano, pediatra membro do Comitê de Nutrologia da SBP e uma das autoras do citado manual da entidade.
Outro fator que tem relação com a prevenção da obesidade futura é o tipo de parto. “Crianças que nascem de parto normal, ao passarem pela abertura vaginal, são contaminadas positivamente com bactérias da microflora materna envolvidas com a modulação do gasto energético”, diz a pediatra.
Leite materno é único
O leite provido por uma mãe saudável, dentre vários outros benefícios, tem os nutrientes exatos de que o bebê precisa nos primeiros seis meses de vida, mesmo sem uma composição fixa (varia de mulher para mulher e tem relação direta com o que ela come).
“Se o bebê que só mama no peito está engordando de modo exagerado, uma das primeiras providências é analisar a alimentação materna, que pode ter grande quantidade de açúcar, por exemplo, e por isso estar comprometendo a boa composição do leite”, fala Fabíola.
Nenhuma fórmula infantil substitui o leite materno à altura no que diz respeito à composição. Só ele contém substâncias bioativas que afetam a diferenciação e a proliferação das células que armazenam gorduras e o hormônio leptina, importante regulador do apetite e da gordura corporal.
Crianças alimentadas com fórmulas durante os primeiros seis meses ingerem diariamente cerca de 1,6 vez mais proteína por quilo de peso do que as alimentadas no seio materno, conforme cita em estudos Ute Alexy, pesquisadora da Universidade de Bonn, na Alemanha.
Ao ingerir mais proteína do que o necessário, há possibilidade de aumento da secreção de insulina, que, por sua vez, pode estimular a captação da glicose pelas células e inibir o processo de lipólise (quebra de gordura), contribuindo para o armazenamento de células gordurosas.
No que diz respeito à aprendizagem do controle da saciedade, ao ser alimentada com leite materno, a criança dá sinais claros de que está satisfeita.
“Ninguém controla a quantidade de mililitros ingerida quando o bebê mama no peito. É ele quem decide. Já ao ser alimentado com a mamadeira, por mais saciado que esteja, o controle é do adulto, que sempre insiste para ele beber um pouco mais e oferece todos os dias a mesma quantidade”, diz Cassia Amaral, professora do curso de medicina da Universidade Anhembi Morumbi.
Além disso, segundo a médica, mamar no seio é mais trabalhoso e exige esforço, enquanto a sucção na mamadeira é mais fácil e por isso a criança tende a tomar mais leite, bebendo, às vezes, mais do que realmente precisa.
Vale destacar ainda que o leite materno, por conta disso tudo, deve ser liberado inclusive para recém-nascidos com sobrepeso. “O aleitamento materno para eles é indispensável também. É no momento da introdução das papinhas que a família deve prestar atenção e, em parceria com o pediatra, regular a quantidade que a criança pode comer”, diz a pediatra Fabíola.
Outro ponto relevante é a exclusividade do leite materno até o sexto mês do bebê: se a alimentação complementar é introduzida antes, os efeitos protetores do leite são menores.
Cardápio especial nos primeiros anos de vida
Quando a introdução da alimentação complementar tem início depois dos seis meses da amamentação exclusiva, os cuidados devem ser intensificados para a prevenção da obesidade. Não faz sentido pensar que a criança já pode ser alimentada com o cardápio familiar.
Na primeira infância (entre 12 e 36 meses), ela tem necessidades nutricionais diferentes das dos adultos porque está em fase de crescimento. Nesse período, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), o tamanho dela dobra, o cérebro ganha, em média, um grama por dia, e o peso aumenta cinco vezes.
“Ter um bebê em casa é um grande motivo para melhorar os hábitos alimentares da família toda e abandonar antigos vícios”, fala Samantha Caesar de Andrade, nutricionista do Centro de Referência para Prevenção e Controle de Doenças Associadas à Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP.
“É indicado não adicionar sal e outros temperos, inclusive os industrializados, antes do primeiro ano de vida. O óleo vegetal só deve ser acrescido no final do preparo. “Quando usado para refogar, por exemplo, ele se transforma em gordura trans, que colabora com um ganho de peso não saudável”, diz Fabíola.
Confira a seguir outras 12 dicas para que seu filho não adquira peso além da conta e cresça com saúde:
1) Não ofereça sucos e outros líquidos durante as refeições. A criança cria o hábito de beber muito para deglutir os alimentos rapidamente e não mastiga. Bebidas gasosas, nem pensar: além de interferirem no metabolismo ósseo e no esmalte dos dentes, causam distensão gástrica, aumentando a capacidade de ingestão de comida;
2) No caso de bebês alimentados com mamadeira, não engrosse o leite com produtos industrializados, como farinhas infantis. Desse modo, estará oferecendo mais calorias do que a criança precisa;
3) Não alimente a criança com sobremesa láctea após as refeições. Dê um intervalo de, pelo menos, uma hora. O cálcio desses produtos interage com o ferro presente na comida e isso prejudica a absorção de ambos no organismo;
4) Substitua a ingestão de salgadinhos, ricos em sódio e gorduras, por pipoca feita com óleo de soja;
5) Livre-se do hábito de manter o saleiro à mesa;
6) Prefira oferecer alimentos integrais. Eles são ricos em fibras e parte delas não é absorvida pelo intestino, criando assim uma barreira para retardar a absorção de açúcares e gorduras;
7) A partir dos dois anos de vida, substitua laticínios integrais pelos com baixo teor de gordura;
8) Organize um ambiente tranquilo para o momento das refeições. Desligue a televisão para que seu filho concentre-se no que está comendo e saboreie os alimentos;
9) Planeje momentos para fazer caminhadas com as crianças, ainda que rápidas. Também vale estimular o hábito de andar de bicicleta;
10) Limite o tempo de lazer passivo a, no máximo, duas horas diárias. Isso significa controlar o tempo que as crianças passam assistindo à televisão e brincando com videogame e computador;
11) Até os 11 meses de vida, proíba o consumo de açúcar. Não adoce o leite oferecido na mamadeira;
12) Ofereça alimentos variados e novos sempre, incluindo legumes e verduras em todas as refeições. No início, cara feia é comum. Cada alimento deve ser apresentado por, pelo menos, dez vezes, antes de ser taxado como não aceito pela criança.
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