Na Espanha, casa de pedras do século 16 é reformada e torna-se refúgio de final de semana
Girona, Espanha – Nos seus finais de semana, Anna Noguera, seu marido Juan Manuel Ribera e seus dois filhos costumam tirar a grande mesa da cozinha e colocá-la na varanda, onde jantam mariscos e outras iguarias regionais. Este alpendre elevado, ou “badiu”, como se diz em Catalão, tem alguns séculos e foi revestido com a pedra local, salpicada de fósseis pré-históricos. Em contraste, a mesa criada por Anna, que é arquiteta, desliza para fora sobre rodinhas de skate. Uma sensibilidade similar, que une o antigo ao moderno, permeia toda a casa que hoje é o refúgio da família nos finais de semana e, algum dia, deve se tornar lar em tempo integral.
Doze anos atrás, pouco antes do nascimento do primeiro filho, o casal teve a ideia de se mudar de Barcelona (que fica a 105 quilômetros de distância) para Girona, onde Noguera, hoje com 50 anos, cresceu. “Adoramos a qualidade de vida daqui, é uma cidade mais tranquila e fácil para criar uma família”, avalia Ribera, 46 anos, analista e estrategista de turismo.
A pequena cidade, que fica à beira de um rio e é cercada por vilas medievais e fazendas fascinantes, está perto dos Pirineus e da Costa Brava. É também uma cidade universitária, onde fragmentos de trincheiras romanas surgem pelas vielas medievais. Ibéricos, visigodos, judeus, mouros e as forças de Napoleão, todos deixaram ali suas marcas.
Em 2000, no centro histórico, o casal comprou um prédio de pedras com 500 m² por US$ 396 mil. O plano era abrigar o escritório de arquitetura de Noguera no andar de baixo e manter um duplex para a família logo acima. Mas uma década se passou antes que eles conseguissem completar a reforma.
A casa e a arqueologia
A construção trapezoidal, com anexos que foram construídos aos poucos e seus inúmeros apartamentos, estava em péssimas condições. Mesmo assim, inquilinos permaneceram ali até que as autoridades identificassem o risco de desabamento. Mais tarde, a descoberta de paredes de uma vila romana do século 1º suspendeu a construção durante a investigação arqueológica.
À medida em que Noguera contemplava as camadas e descobria as restrições sobre modificações na área, ela se perguntava “qual a história” que deveria ser salva ou restaurada. Será que as construções precisam ser imutáveis simplesmente porque são antigas?
Sem dúvidas houve achados incríveis: lintéis entalhados indicavam o nome de um proprietário, do século 16, como criador da construção. Vidros de perfume e peças de cerâmica também foram desenterrados, junto com uma bala de canhão e um fragmento de bomba, provavelmente napoleônicos.
Mas nem todas as descobertas eram tesouros. Uma das vigas do telhado era de concreto coberta por madeira, outra trazia aço embutido. E para arrematar as formas diferentes do prédio, havia uma escada mal posicionada e de formato estranho.
O que preservar, o que esconder?
Surpreendentemente, a cidade permitiu que Noguera aperfeiçoasse a geometria e demolisse um anexo volumoso. Mas quando quis expor, em vez de cobrir com massa, as pedras irregulares da fachada, ela teve que desafiar os mandados locais - e venceu.
No interior, entretanto, a arquiteta assumiu o controle. Eliminando divisórias e reposicionando a escada, ela brincou com materiais contemporâneos: concreto e placas de aço escuro foram instaladas sobre a pedra, carvalho e terracota. “Quis reinterpretar o antigo dialogando com o novo”, argumenta Noguera, descrevendo seu desejo “de recuperar um pouco do caráter original do século 16, cuja rigidez ressoa seu estilo minimalista”.
Um exemplo desta comunhão é uma pia de pedra gasta pelo tempo encontrada no local e que foi instalada ao lado da banheira de concreto aplainado que a arquiteta havia criado. Do lado de fora, Noguera ainda restaurou a cisterna de 60 mil litros para que ela alimentasse um jardim que fica sob a sombra de glicínias e uma piscina de concreto preta; também revestiu um pátio com pedras recuperadas da demolição.
A reforma de US$ 900 mil reflete tanto a longa evolução da construção quanto a história dessa família. Durante os dez anos de gestação do projeto, as crianças foram criando raízes em Barcelona, enquanto Ribera construía ali sua carreira. Então, até que o esperado trem rápido ligue Barcelona a Girona, a casa principal continua sendo um pequeno apartamento na capital catalã e, o futuro escritório de Noguera, funciona como abrigo para hóspedes. Mas nos finais de semana, quando eles jantam no “badiu”, mergulham na piscina e relaxam sob as glicínias, Ribera revela: “sonhamos em nos mudar para Girona”.
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