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Casa resgata arquitetura sul-coreana do século 14 com madeira, muros inclinados e telhado rebuscado

Casa em estilo "hanok", tradicional sul-coreano do século 14, em Seul  mantém antiga estrutura construtiva - Marcel Lam/The New York Times
Casa em estilo "hanok", tradicional sul-coreano do século 14, em Seul mantém antiga estrutura construtiva Imagem: Marcel Lam/The New York Times

Elaine Louie

Do The New York Times, em Seul, Coreia do Sul

18/07/2012 07h09

Seul, Coreia do Sul – Alguns anos atrás, quando Hongnam Kim, uma professora da “Ewah Womans University”, resolveu construir sua casa, ela decidiu que a edificação teria a forma de um “hanok” - a estrutura tradicional de madeira da dinastia Joseon, de 1392. Mas Kim também queria um porão moderno, onde pudesse dar continuidade ao seu trabalho.

Kim, 64 anos, trabalha com história da arte. Mas não é uma historiadora qualquer. Ela já foi diretora-geral do Museu Nacional da Coreia e, também, dirigiu o Museu Nacional do Folclore, além de atualmente ajudar a comandar o “National Trust” da Coreia, um grupo não-governamental que busca a preservação da cultura e do meio ambiente.


Além disso, a professora também é uma perfeccionista e conhece bem os “hanoks”. Porém, é uma mulher que vive em uma sociedade patriarcal. Assim, quando questionada sobre se a equipe de construção gostava de receber suas ordens, Kim diz rindo: “irritei todos os funcionários. Eles nunca conheceram alguém como eu em suas vidas profissionais. Pedi para que várias coisas fossem refeitas”.

Fazer e refazer para ficar perfeito

Uma das ordens de Kim quanto a reconstrução tratou de todos os muros que cercam a propriedade. Para o observador ocasional, aquelas paredes de granito parecem ser extensões perfeitamente retas à partir do chão. Mas não o são exatamente.
 
 “Os muros mais externos precisam de uma angulação ascendente entre 10 e 15 graus, do contrário, parece que eles estão se abrindo”, explicou Kim. “Uma ilusão de ótica os faz parecer retos, completa”. Assim, a professora e historiadora quando descobriu que os funcionários haviam feito os muros retos, fez com que fossem derrubados e corretamente refeitos.

Levou dois anos e US$1 milhão, mas Kim finalmente construiu a casa que havia imaginado, um conjunto de dois “hanoks” (um para ela e outro para os convidados), cada um com 150 metros quadrados, com seus próprios jardins de cerca de 50 metros quadrados, cada. A construção foi finalizada em 2010 com a ajuda de Lee Moon-ho, um arquiteto local especializado em arquitetura tradicional.  
 
“Hanok” por quê?

  • Marcel Lam/The New York Times

    Casa em estilo "hanok", do século 14. Madeira e paredes inclinadas são elementos tradicionais

Mas por que viver em um “hanok” ao invés de escolher uma casa moderna?  Foi pelo sentido histórico ou um modo de preservar a arquitetura coreana? Ou, simplesmente, pela aparência?

“Por todos estes motivos”, justifica Kim. “E um pouco também pela minha memória de infância. Nossa casa era um ‘hanok’,  na cidade de Jinju, em uma província ao sul do país”, completa.

Claro que sua casa não é simplesmente um testamento sobre o passado – ela fez questão de instalar banheiros modernos, utensílios de cozinha elegantes, ar-condicionado e janelas duplas. Mas pelo lado de fora não há qualquer indício de que aquilo tudo está ali. E mesmo do lado de dentro, muitas das facilidades modernas estão escondidas atrás de portas de madeira tradicionais.

Casas segmentadas, mas interconectadas

Na tradição dos “hanoks”, há uma área somente para o entretenimento, além das alas masculina, feminina e dos empregados. Kim, que vive sozinha e tem um cão shih-tzu de 15 anos chamado Toto, dividiu suas alas em “anchae” (sua residência) e “sarangchae” (casa de hóspedes).

Seu quarto fica no andar de cima da residência. No andar inferior, onde ela passa a maior parte do tempo, fica o acervo com milhares de livros sobre arte. Uma entrada separada permite que seus alunos tenham acesso à biblioteca diretamente da rua. Ela usa a outra casa para o entretenimento. No andar superior há um quarto de hóspedes e no andar de baixo fica uma sala de estar aberta, além de uma cozinha completamente branca.

Por toda a casa, portas translúcidas de treliça de pinho emolduram os vidros cobertos por papel. Conforme o sol passa pelos padrões da treliça, vemos um constante duelo entre a luz e a sombra no chão de madeira brilhante e livre de qualquer sujeira ou pó.

Isso acontece porque é costume na Coreia trocar o sapato por um chinelo antes de entrar na casa. Kim coloca os sapatos em uma bandeja de madeira, que fica escondida embaixo de um degrau, na galeria externa. “Sapatos contemporâneos não são bonitos dentro do contexto de um ‘hanok’”, afirma.

“Quando você está em uma construção moderna, você está cercado, há uma fria separação dividindo você e o mundo lá fora”, diz a professora.  Mas em um "hanok", “você está cercado pela natureza, pelo céu aberto, pelo cheiro da madeira, e você não sai dali. É um lugar maravilhoso para se estar o tempo todo”, conclui.