Associação francesa questiona na Justiça o trabalho de crianças youtubers
Uma associação francesa está questionando na Justiça e junto a autoridades do governo o trabalho de crianças youtubers, apontado-o como ilegal e citando o risco de que elas sejam exploradas pelos pais.
A atividade também poderia afetar o desenvolvimento psicológico das celebridades infantis, ressalta o Observatório Parental e da Educação Digital (Observatoire de la Parentalité et de l'Éducation Numérique – Open, na sigla em francês), associação voltada para pais e professores que discute o universo da internet e das redes sociais.
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A Open denuncia a falta de regulamentação de uma atividade lucrativa, que chega a gerar dezenas de milhares de euros por mês às famílias.
Como no Brasil, há na França canais no Youtube estrelados por crianças e adolescentes com mais de um milhão de seguidores e que, por esse motivo, atraem o interesse de companhias que querem divulgar suas marcas.
Nos vídeos, filmados pelos pais, as crianças geralmente aparecem abrindo os mais variados presentes enviados por empresas, passeando em parques de atrações ou comendo petiscos e doces de marcas exibidas aos internautas.
Os vídeos são permeados por inserções publicitárias.
A pedido da Open, autoridades francesas analisam o fenômeno das crianças youtubers, que se tornou uma febre em vários países do mundo.
Além de apresentar denúncia ao Ministério Público e acionar o Conselho Nacional de Proteção da Infância, presidido pela ministra da Saúde, a Open recorreu nesta semana à Defensora das Crianças, Geneviève Avenard, autoridade nomeada pelo governo francês.
Para Thomas Rohmer, presidente da Open, há canais infantis do Youtube que funcionam como verdadeiras empresas, e os vídeos apresentados por crianças não se resumem a simples atividades de lazer, mas representariam um trabalho ilegal.
"É realmente um trabalho, com vocação para gerar renda. Esses recursos são destinados somente aos pais, que usam seus filhos", diz Rohmer.
Além dos ganhos com publicidades, vários canais infantis fazem parcerias com marcas mostradas nos vídeos.
"Alguns youtubers fazem até 35 vídeos por mês. Vários pais criaram empresas voltadas para isso", destaca o presidente da associação.
Os vídeos duram geralmente dez minutos, mas isso não inclui as cenas refeitas ou cortadas na edição, o que pode estender o tempo dedicado pelas crianças às filmagens.
Pais ganham até R$ 440 mil mensais
Um dos canais infantis mais populares na França é o Studio Bubble Tea, das irmãs Kalys e Athéna, de 8 e 13 anos, com mais de 1,3 milhão de seguidores.
Devido ao número crescente de seguidores, o pai das crianças, Mickaël (o sobrenome não é revelado), decidiu criar, em 2014, um estúdio para produzir vídeos diariamente.
Mais de 1,5 mil já foram divulgados e alguns têm milhões de visualizações.
As duas meninas aparecem regularmente no Youtube degustando sorvetes e chocolates, testando brinquedos ou em passeios que mostram lojas.
O Studio Bubble Tea gera ganhos de 10 mil a 50 mil euros por mês (R$ 44 mil a R$ 220 mil), segundo o pai das garotas. O canal lançou recentemente uma linha de brinquedos.
Outro canal infantil famoso é o dos garotos Néo e Swan, filmados pela mãe, com mais de 3 milhões de seguidores.
Ela ganharia, segundo a imprensa francesa, de 50 mil a 100 mil euros (cerca de R$ 440 mil) por mês.
Diferentemente das atividades de crianças que atuam no cinema e na TV, onde o tempo de trabalho é regulamentado e os recursos ganhos ficam bloqueados até a maioridade, não existe regulamentação na França no caso de menores que têm atividades na internet.
A Open também considera que há um "verdadeiro perigo" para a saúde física e mental das crianças.
"Ao filmar um vídeo diariamente, elas são privadas de vida social e de lazer. É um equilíbrio que deixa de existir", diz a advogada da Open, Christine Aubague.
Os pais das celebridades no Youtube dizem discordar que os vídeos representem um trabalho.
"Minhas filhas só filmam cerca de duas horas por semana. São elas que querem fazer isso e se divertem em família. Elas têm uma vida de garotas da idade delas", diz o pai de Kalys e Athéna, Michaël.
Incitação ao consumo
O fenômeno de "unboxing", que consiste em desembalar presentes em frente à câmera, também movimenta parlamentares franceses e órgãos regulatórios.
O Conselho Superior do Audiovisual francês (CSA) demonstra preocupação com o impacto desses canais familiares sobre os jovens internautas.
"As crianças ficam fascinadas com essa quantidade de presentes e de atividades de lazer. Esses vídeos podem causar frustração e contribuem para difundir a ideia, para o público infantil, de que a felicidade é devida ao consumo permanente", afirma Olivier Andrieu-Gérard, especialista do comitê público jovem do CSA.
A senadora socialista Michelle Meunier pediu à ministra do Trabalho, Muriel Pénicaud, para incluir os vídeos na internet com crianças na legislação sobre o trabalho de menores em publicidade e no cinema.
A Defensora das Crianças, que analisa atualmente a questão, poderá propor uma lei ou mudanças na legislação sobre o trabalho de menores.
A Open também alerta para a questão do direito ao esquecimento na internet.
"O que acontecerá com essas crianças quando se tornarem adultos? São imagens que elas não controlam e com as quais vão ter que lidar a vida toda", diz Rohmer, presidente da Open
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