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Estado americano adota 'caixa de papelão' para recém-nascidos

Tradição finlandesa de colocar crianças em caixas está se espalhando pelo mundo  - Divulgação/The Baby Box Company
Tradição finlandesa de colocar crianças em caixas está se espalhando pelo mundo Imagem: Divulgação/The Baby Box Company

28/02/2017 13h03

Nova Jersey é o primeiro Estado dos EUA a adotar um programa amplo de distribuição de caixas de papelão, que servem como berços, a famílias de recém-nascidos.

A ideia, que surgiu na Finlândia na década de 1930, vem se espalhando pelo mundo como uma maneira de reduzir a mortalidade no primeiro ano de vida do bebê.

A chamada Síndrome da Morte Súbita Infantil, que ocorre quando um bebê aparentemente saudável morre sem explicação, normalmente durante o sono, já foi relacionada em pesquisas à forma com que o bebê dorme.

Em países como o Reino Unido, a indicação clara é de que o bebê deva ser posto para dormir de barriga para cima, em um colchão relativamente firme e sem a presença de itens como bichos de pelúcia. A caixa de papelão pode ser também útil para se ter o bebê próximo, sem a necessidade de que seja posto para dormir na cama com os pais, outro fator de risco. Além do cuidado com o sono, o projeto tem como objetivo estreitar a ligação entre pais e o sistema de saúde.

Finlândia

A tradição é considerada crucial para que a Finlândia tenha uma das taxas de mortalidade infantil mais baixas do mundo: cada família, independentemente de sua origem, recebe gratuitamente uma caixa de papelão com presentes para seu bebê.

Ela contém produtos úteis para as primeiras semanas de vida do recém-nascido. Há roupas, inclusive um pijama para protegê-lo do frio do inverno, um gorro, alguns sapatinhos (tudo em cores neutras), além de fraldas, babadores, produtos de banho, toalhas e um álbum fotográfico - e a própria caixa pode ser usado como o primeiro berço, pois vem com um pequeno colchão.

Há três anos, uma reportagem da BBC sobre as caixas de papelão foi lida por milhões de pessoas. E, agora, a ideia finlandesa está se disseminando no mundo. O Estado de Nova Jersey é ocaso mais recente.

Em 2014, três pais finlandeses criaram uma empresa para distribuir estas caixas para clientes em diferentes países. Duas americanas fizeram o mesmo. E existe uma empresa similar no Reino Unido.

E, em agosto do ano passado, o governo da Cidade do México colocou em prática o projeto "Cunas CDMX" (cunas significa "berço" em espanhol), inspirado no modelo finlandês. Seu objetivo era atingir 10 mil famílias e acompanhar a gravidez daquelas com menos recursos financeiros para combater a mortalidade infantil.

"Buscamos gerar uma maior proteção para os bebês na Cidade do México, principalmente os que vivem na pobreza", diz Gamaliel Martínez Pachecho, diretor-geral dos Sistema para Desenvolvimento Integral da Família da capital mexicana, departamento encarregado do projeto. Na Finlândia, o projeto também começou entre famílias mais pobres, mas é hoje universal.

Com frequência, os produtos incluídos na caixa e a forma como ela é distribuída são adequados aos problemas locais: desde prevenir infecções até tirar a criança da cama dos pais, onde há um risco de sofrerem asfixia.

África do Sul e Ásia

Dois empreendedores sul-africanos - Ernst Hertzog, da organização Action Hero Ventures, e o executivo de marketing Frans de Villiers - concluíram, por exemplo, que uma caixa de plástico, que pudesse ser usada como banheira e não tanto como cama, era mais útil para pais e mães de seu país.

Mas um dos objetivos ainda é, inclusive na Finlândia, incentivar as mães a comparecer às consultas de controle pré-natal.

De fato, um projeto-piloto realizado pela Universidade de Stellenbosch no ano passado descobriu que, na África do Sul, a caixa aumentava a frequência das mães nos exames pré-natais.

Essa frequência reduz, por exemplo, o risco de transmissão de HIV para o bebê durante o parto. De Villiers e Hertzog querem agora que o projeto seja ampliado e que um dia se torne um programa nacional.

"A caixa finlandesa foi um exemplo de design que mudou um país. Esperamos que, fazendo alguns ajustes, nosso produto tenha o mesmo impacto", diz Hertzog.

Por sua vez, uma estudante de doutorado da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, teve a ideia de adotar a caixa finlandesa no sul da Ásia.

Karima Ladhani desenvolveu o projeto "Barakat Bundle" (barakat significa "benção" em alguns idiomas da região), que entrou em vigor em um hospital rural da Índia. A caixa tem ferramentas para prevenir infecções durante o parto ou pouco depois de se dar à luz e também inclui um mosquiteiro para proteger os bebês da malária.

"Queremos oferecer às novas mães soluções de baixo custo para salvar vidas ao combater as causas evitáveis de mortalidade infantil e materna", afirma Ladhani.

Um projeto-piloto também está sendo lançado no hospital Queen Charlotte's and Chelsea, em Londres, no Reino Unido, em colaboração com a empresa americana Baby Box.

"Partimos do pressuposto de que as pessoas têm dinheiro para comprar um moisés ou um berço, mas nem sempre é o caso", diz a ginecologista Karen Joash, conselheira obstetrícia do programa.

Ela considera que a caixa também fará com que mães e bebês fiquem no mesmo quarto, já que elas são fáceis de carregar. "Isso é bom para estreitar sua ligação."

Apoio familiar

Há projetos em curso também no Estado australiano de Victoria e na província canadense de Alberta.

Karen Benzies, professora de Enfermagem da Universidade de Calgary, no Canadá, destaca que a intenção original era ajudar as famílias mais vulneráveis, mas seus organizadores se deram conta que "a ideia de vulnerabilidade para a maioria das pessoas se refere a alguém com uma renda baixa, algo que não se aplica necessariamente à realidade de Alberta".

É uma região que se beneficia da indústria petrolífera, e, por isso, quando os homens vão trabalhar nas plataformas, surge um novo tipo de problema: as mães criam seus bebês sozinhas. "O objetivo é dar apoio às famílias na transição da gravidez para a maternidade", diz Benzies.

Um elemento-chave para isso é a mentoria dada aos pais, em que uma pessoa os auxilia, por telefone ou pessoalmente, a partir das 32 semanas de gestação até seis meses após o parto.

"No Canadá, quando alguém da família ou um amigo vê algo de errado, às vezes prefere não dizer nada, é comum que não interfira. Queremos mudar isso", afirma Benzie.

'Assistente de berço'

Outra inovação incorporada pelos canadenses é um "assistente de berço", uma espécie de folheto criado para que os homens tenham uma relação mais próxima com seus bebês. Com um estilo parecido com o de um manual de um automóvel, o texto oferece um guia prático.

"Sabia que faz bem para o bebê arrotar algumas vezes?", diz o texto, que ressalta a importância do "combustível", o leite materno, e explica como "checar debaixo do capô", as fraldas no caso, porque "manter seu modelo novo limpo e cômodo é importante".

O governo finlandês destacou estar consciente do interesse global em seu projeto e que, com frequência, oferece assessoria a outros países. De fato, realiza apresentações em embaixadas. Mas nem todo mundo está convencido de que a caixa é a melhor forma de ajudar.

Colin Pritchard, professor da Universidade de Bournemouth, no Reino Unido, estuda mortalidade infantil e acredita que o sistema tem "sentido teoricamente", por dar ao bebê um local para dormir além da cama dos pais e poder reduzir os casos de morte súbita por asfixia. No entanto, acredita que o efeito é pequeno.

Ele argumenta ser mais importante criar mecanismos para reduzir a pobreza, fazer com que os pais deixem de fumar e melhorar a educação dos pais e os cuidados que eles terão com os filhos para frear a mortalidade infantil.