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Cientistas descobrem por que alguns "odeiam" o som de pessoas comendo

Barulho de mastigação pode ser insuportável para quem tem misofonia - Thinkstock
Barulho de mastigação pode ser insuportável para quem tem misofonia Imagem: Thinkstock

03/02/2017 13h34

Cientistas dizem ter descoberto por que algumas pessoas reagem de forma intensa - com emoções que podem beirar o "ódio" - ao som de mastigação de alimentos ou de respiração.

A explicação está na misofonia, uma condição marcada por reações intensas a alguns sons específicos, bem mais complexa do que o "não gostar" de alguns barulhos.

"Eu me sinto ameaçada e que preciso me debater ou fugir - a resposta é sempre essa, lutar ou fugir", conta Olana Tansley-Hancock, de 29 anos, que convive com misofonia há mais de duas décadas.

Cientistas britânicos mostraram que os cérebros de algumas pessoas são programados para produzir uma resposta emocional excessiva nessas situações.

Olana desenvolveu a condição quando tinha oito anos. Os sons que a irritam incluem o de respiração, de mastigação e o farfalhar de folhas ou sacos de papel ou plástico.

"Qualquer pessoa comendo salgadinho crocante faz com que eu me afaste na hora. O barulho do pacote abrindo já é o suficiente para eu começar a me mexer", disse ela à BBC.

"Não é qualquer irritação, é algo que me faz dizer imediatamente: 'Meu Deus, que barulho é esse?', e aí eu tenho que sair dali ou fazer parar na hora."

"Passei muito tempo evitando lugares como cinema. Em trens, eu tinha que mudar de lugar sete ou oito vezes em menos de 30 minutos. E eu deixei um emprego depois de três meses depois de ter passado mais tempo chorando e tendo ataques de pânico do que trabalhando", contou.

Cientistas britânicos escanearam o cérebro de 20 pessoas com misofonia - incluindo Olana - e 22 pessoas sem o problema.

Os voluntários tiveram de ouvir diversos barulhos enquanto estavam ligados ao equipamento de ressonância magnética, incluindo:

  • sons neutros, como a chuva
  • sons mais incômodos em geral, como gritos
  • sons que ativavam a doença

Os resultados, divulgados na publicação científica Current Biology, revelaram que a parte do cérebro que une nossas sensações com nossas emoções - o córtex insular anterior - estava excessivamente ativa em momentos de misofonia.

E que, nos voluntários que sofrem da condição, as conexões e interações com outras partes do cérebro se davam de forma diferente.

"Eles começam a ficar extenuados quando começam a ouvir esses sons, mas a atividade era específica sobre esses sons que ativam a doença, não os outros dois", disse o cientista Sukhbinder Kumar, da Universidade de Newcastle.

Olana Tansley-Hancock já tem misofonia há 20 anos - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Olana Tansley-Hancock já tem misofonia há 20 anos
Imagem: Arquivo pessoal

"A reação é majoritariamente de raiva. Não é nojo, desgosto, a emoção dominante é raiva - parece uma resposta normal, mas de repente se torna uma resposta exagerada."

Tratamento
Não há tratamentos para o problema, mas Olana desenvolveu uma forma de "driblá-lo", usando, por exemplo, tampões nos ouvidos. Ela também sabe que cafeína e álcool pioram a condição, por isso evita os dois.

"Mas agora eu consegui amenizar o problema, ainda consigo ter um emprego - conheço muita gente que não consegue -, então eu me sinto com sorte, na verdade", afirmou.

Ainda não se sabe ao certo o quanto o problema é comum ou não, já que também não há uma forma clara para diagnosticar o problema, que é considerado uma descoberta recente.

Atualmente, a esperança dos pesquisadores é que o entendimento sobre como funciona o cérebro de uma pessoa com misofonia - em comparação com o cérebro de pessoas que não sofrem do problema - ajude a encontrar novos tratamentos.

Uma ideia é que passar uma corrente elétrica de baixa intensidade pelo crânio, ação conhecida por ajustar funções do cérebro, pode ajudar.

Tim Griffiths, professor de neurologia cognitiva da Newcastle University e da University College London de Londres, disse esperar "que isso tranquilize um pouco os pacientes".

"Eu era parte dessa comunidade cética até que recebemos pacientes na clínica e entendemos o quão surpreendentes e semelhantes eram as suas características", disse.

"Nós agora temos evidências para estabelecer a base do transtorno conforme as diferenças no mecanismo do controle do cérebro em casos de misofonia."