Deputados aprovam em primeira leitura a legalização do aborto na Argentina

A Câmara dos Deputados da Argentina aprovou nesta quinta-feira em primeira leitura a legalização do aborto até a 14ª semana de gestação, um projeto que passará agora ao Senado.
A votação foi de 129 deputados a favor, 125 contrários e uma abstenção, anunciou o presidente da Câmara, Emilio Monzó.
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Entenda o que está em jogo
O Congresso da Argentina votou, pela primeira vez em sua história, um projeto de lei para legalizar o aborto.
Caso entre em vigor, a lei que permitirá o aborto livre até a 14ª semana de gestação.
"Há motivos de saúde pública. Tivemos três ministros da Saúde, os três com visões diferentes por pertencerem a governos distintos, e nisto coincidiam: a legalização do aborto melhora os cuidados de saúde das mulheres argentinas", afirmou ao abrir a sessão o deputado do governo Daniel Lipovetzky, que esteve encarregado dos debates.
Atualmente na Argentina o aborto é permitido apenas em caso de estupro ou risco para a vida da mulher.
"Para além das boas intenções, (o projeto de lei) subverte uma ordem biológica, biomédica, jurídica e histórica da nação", criticou o deputado Horacio Goicoechea, da União Cívica Radical, aliada do governo de Mauricio Macri.
A questão religiosa
Argentina, país do papa Francisco e de forte influência da Igreja católica, foi pioneira na América Latina em aprovar o casamento igualitário.
Mas a questão do aborto nunca havia sido discutida no parlamento.
Embora tenha se declarado "a favor da vida", o próprio Macri encorajou o debate, depois de sete tentativas fracassadas em governos anteriores.
Desde o primeiro dia, as posições no parlamento têm sido independentes das afiliações políticas.
Dos 257 deputados, 126 haviam se declarado contra e 123 a favor. Minutos antes do início da sessão, vários dos indecisos anunciaram suas posições, sem que tenha ficado claro ainda qual será a postura da maioria.
"Nossa função é escutar. Não é uma decisão pessoal, mas do que nós representamos. Escutando os diferentes setores da província de Buenos Aires tomei a decisão de acompanhar", anunciou às portas do Congresso o deputado Fernando Espinoza, da agrupação peronista Unidade Cidadã.
As vozes da rua
Os argentinos se mostram divididos tanto dentro como fora do parlamento.
Movimentos a favor e contra a legalização do aborto se concentraram nos arredores do Congresso, onde permanecerão até que se conheça o resultado final.
Na semana passada foi realizada em Buenos Aires uma "oração inter-religiosa pela vida", que contou com a participação de líderes da Igreja católica e outras correntes cristãs, assim como de muçulmanos e judeus.
Ao mesmo tempo, estudantes tomaram várias escolas em Buenos Aires para apoiar com uma vigília a despenalização do aborto.
"As reivindicações principais são que se aprove o projeto de aborto legal, seguro e gratuito, que se cumpra a lei de educação sexual integral, que haja protocolos contra a violência de gênero nas escolas", resumiu a líder estudantil Juana Garay.
Mortes por abortos
Segundo cifras oficiais, 17% das 245 mortes de mulheres grávidas registradas em 2016 ocorreram por abortos. Várias ONGs calculam que a cada ano morrem cerca de 100 das 500.000 mulheres que fazem abortos clandestinos na Argentina.
"A penalização do aborto impõe uma carga discriminatória sobre as mulheres e meninas e põe em risco sua vida e sua saúde. O Congresso argentino tem uma oportunidade histórica de proteger os direitos das mulheres, ao pôr fim a este status quo injusto e cruel", afirmou José Miguel Vivanco, do organismo de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch, em um comunicado horas antes do início da sessão parlamentar.
Por outro lado, a vice-presidente argentina, Gabriela Michetti, afirmou: "Temos mulheres que morrem por abortos mal praticados, é um tema de saúde pública que existe. Mas não aceito que para melhorar esta situação estejamos encurtando a vida de outro".
Na América Latina, o aborto sem restrições é legal em Uruguai e Cuba. Também é permitido na Cidade do México. Em quase todos os demais países só pode ser realizado em caso de risco de vida para a mulher, inviabilidade do feto ou se a gravidez for fruto de um estupro. Em El Salvador e na Nicarágua, é proibido em todos os casos.
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