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Thais Farage

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Cento e noventa e duas mensagens não lidas no WhatsApp. E você?

Sou 100% incapaz de gerenciar tanta gente, tanta conversa, tanto grupo, tanto spam e fake news - Freestocks/Unsplash
Sou 100% incapaz de gerenciar tanta gente, tanta conversa, tanto grupo, tanto spam e fake news Imagem: Freestocks/Unsplash

Colunista de Universa

10/09/2022 04h00

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Email inválido

Cento e noventa e duas. Esse é o número de mensagens não lidas no meu WhattsApp só esse ano —em janeiro eu apaguei tudo e pensei, "vou começar do zero e agora eu vou conseguir manter assim, zerado". A frustração chegou, sei lá, em março, me provando que eu sou 100% incapaz de gerenciar tanta gente, tanta conversa, tanto grupo, tanto spam e fake news. Mesmo tentando muito, me dedicando muito e perdendo horas nessa tarefa ingrata.

Eu me rendi, sou boa em autocrítica, e mudei minha bio para "sou péssima de WhatsApp, não é pessoal, não se ofenda". Carol, minha editora aqui em Universa, pode testemunhar: várias vezes ficou sem resposta. Carol, não é pessoal, eu juro que a mensagem passou e eu não vi!

Para além do fato de que eu sou realmente ruim de mensagem de texto (acho chato, canso, sei lá), é impossível mesmo administrar essa enxurrada de contatinhos.

É claro que é uma delícia manter contato com pessoas que até hoje, segundo a história da humanidade, já nem lembraríamos mais que existem porque não nos vemos desde a segunda série do fundamental. É uma delícia falar a cada 10 segundos com meu marido para quem consigo perguntar sobre a lista do supermercado, inclusive enquanto ele tá dentro do avião porque agora até o avião tem wi-fi.

Mas é também um inferno, vamos combinar!

Com quanta gente eu queria mesmo ter perdido o contato porque não tenho mais nada em comum e não consigo porque a pessoa me acha e me manda mensagem e eu sou a pessoa horrível que não responde?! E tem toda a TRAGÉDIA que são os grupos de escola do zap, misericórdia, por queeeee?

Aliás, dá para escrever uma coluna inteira sobre o desserviço que é um monte de pai e mãe discutindo temas que pre-ci-sam passar também pela escola. Da minha parca experiência no tema, que tenho certeza não é o DataFolha materno, grupo de zap da escola funciona 90% do tempo pra gerar uma confusão que não existia, pra criar uma treta que não precisa, pra aumentar em até 100x um problema que seria resolvido em 10 segundo em um bate-papo com a escola.

Fico pensando que tem uma razão humana pela qual a gente perde o contato com as pessoas: o trabalho que dá pra manter uma amizade, um amor, uma comunidade é diretamente proporcional à importância de cada uma dessas pessoas-situações na nossa vida.

E a função da contemporaneidade é dizer pra gente "na na ni na não. não precisa selecionar quem vai e quem fica, dá pra ter todo mundo! é só mandar um whatsapp pra essas 192 pessoas e grupos, não custa nada, são só 2 minutos".

E se o propósito da contemporaneidade é dizer que dá pra fazer, a minha função nessa coluna é te dizer: não é verdade, não dá, não. Cento e noventa e duas mensagens X 2 minutos pra cada (o que é um caô, só os áudios que eu recebo já podem ser chamados de podcast!) rendem 384 minutos. São mais de 6 horas (se eu não errei as contas, perdoa se errei, mas cê entendeu meu raciocínio)!

Não é possível, não dá tempo. Eu não consigo. Trabalhar, criar dois filhos, cuidar de mim, do meu casamento, fazer exercício —eu não tô dando conta e, sinceramente, eu nem sou tão ruim assim de WhatsApp, eu só não consigo me comunicar com todas as pessoas o tempo inteiro. Ninguém consegue. O zap substituiu as reuniões (pra muita gente), o Zoom, o trabalho presencial, e inventou grupos, discussões, relações que simplesmente não precisam existir.

Mensagem misteriosa? Deve ser alguém me chamando pra festa do Oscar

Outra dia uma moça (que eu sequer sei o nome) precisava de uma informação sobre uma pessoa com a qual eu já trabalhei. Essa moça, que eu sigo sem saber quem é, me mandou um áudio. Veja bem: um número que eu desconhecia, sem nem um "oi, eu sou a fulana". Nada. Um áudio de 2 minutos. Eu ouvi na velocidade 1.5x porque eu sou muito curiosa e eu sempre acho que essa mensagem assim, misteriosa, é alguém me chamando pra festa do Oscar, me avisando que eu ganhei na Mega Sena e não fui retirar o prêmio —mas a verdade é que na maioria das vezes é só o telemarketing.

Por fim, passando a régua na minha vida, os apps de bate-papo realmente me ajudam muito a estar perto de quem eu amo e não vejo com frequência: minha família e meus melhores amigos. É também por causa do zap que eu quase não faço mais reuniões e 90% da minha vida é resolvida em troca de áudios. Mas é também uma fonte infinita de ansiedade.

Tô sempre devendo resposta pra todo mundo num ritmo de urgência de quem faz cirurgia de coração. Eu não faço, mas me cobram como se eu fizesse.

O WhatsApp me suga muito mais tempo e energia que qualquer rede social. Eu paro pra ver o link da fake news da moça que só passou filtro solar no rosto e tem o pescoço todo manchado de sol e, quando eu vejo, já se passaram duas horas. Sem contar as inúmeras tretas nos mais variados grupos, que consomem não só meu tempo, mas o meu otimismo e a minha fé na humanidade.

E eu nem vou falar do que é o grupo de WhatsApp em ano eleitoral.

Vou encerrar dizendo: devo, não nego. Perco muita mensagem importante porque fiquei três horas sem olhar o telefone e, quando olhei, tinha um monte de mensagem besta na frente e a importante foi empurrada pra trás. Juro que tô fazendo o meu melhor, porém não tenho planos de adoecer pra dar conta de tudo e todos.

Se for urgente, me liga.