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Thais Farage

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Não ligo para o Dia das Mães, mas 7 anos depois, finalmente me sinto mãe

Thais Farage e o filho Miguel - Arquivo pessoal
Thais Farage e o filho Miguel Imagem: Arquivo pessoal

Colunista do UOL

07/05/2022 04h00

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Miguel, meu filho mais velho, chegou, finalmente em uma idade (ele tem 7 anos!) em que eu me lembro de mim na idade dele. Não sou dessas pessoas que têm boa memória, eu tenho vagas lembranças... Mas 7 anos foi uma data importante na minha vida: eu mudei de cidade, minha mãe se casou e eu lembro muito da adaptação na escola nova, na cidade, da saudade da minha avó. Com 7 anos eu realmente me lembro de muita coisa. E, talvez por isso, eu tenha sentido com tanta força esse momento do Miguel.

Quando Mig nasceu eu lembro da exata cena: minha vó sentada comigo na sala de casa, um apartamento pequeno e charmosinho na Pompeia. Olhei pra ela e perguntei com todo o meu coração "vó, como foi que você deu conta de ter 3 filhas? É muito difícil, eu não tô conseguindo, tô exausta, que vida é essa?". E ela muito fofa me disse "não é fácil, mesmo, não, mas as coisas vão se acertando, a vida vai se encaixando, cê vai ver". E foi mesmo. O Tom nasceu no meio da pandemia, o caos total. Nessa época, estávamos morando em um apartamento temporário porque nossa casa estava reformando, minha vó não pode vir ficar comigo e eu já tinha um outro filho pra cuidar. E eu que jurava que na segunda vez já ia estar sabida e esperta, achei, de novo, muito difícil ter um bebê pequenininho em casa.

Enquanto o Tom chegava, mamava, se ambientava... Miguel mudava de escola, foi alfabetizado no ensino remoto, sentiu ciúmes, saudade dos amigos, medo da covid e eu passei a me perguntar se realmente as coisas ficavam mais fáceis com o tempo —como eu sempre acreditei que ficassem e como eu sentia acontecendo, até então.

Os bebês exigem de mim uma atenção integral, não dá para desviar o olhar, preciso estar presente o dia inteiro, a noite inteira pra amamentar exclusivamente em livre demanda. E essa demanda eu acho desesperadora. É uma luta interna para mim, eu não gosto da vida resumida a amamentar, dormir quando dá, comer o que não dá cólica, trocar fralda, dar banho. Me entedia, me cansa fisicamente, me deixa insegura, me desestrutura.

Thais Farage e o filho Mig - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Thais Farage e o filho Mig
Imagem: Arquivo Pessoal

No nascimento do Miguel achei que ia morrer, com certeza absoluta tinha algo errado comigo (e, hoje todas sabemos, não tinha nada de errado, era só sobrecarga). Depois, quando chegou o Tom, eu já sabia o que eu dava conta e não dava e também já sabia que passava. E passa. E é muito mais legal (pra mim!) ter filhos crianças, que conversam, gargalham, brincam. Me agarrei nisso e, por mais difícil que estivesse, eu sabia que ia passar. Foi um puerpério, claro, mas passei em paz.

Até que Miguel fez 7 anos e tudo voltou a ficar difícil e comecei até a sentir saudade dele recém-nascido, enfiado no sling no meu colo. Mas sendo bem realista, demorei meio ano para entender que tava difícil, mas não tava sofrido. Difícil, sim, mas não penoso, como eu pessoalmente acho o primeiro ano dos bebês. Voltei a precisar estar muito atenta o tempo todo, voltei a não ter as respostas, voltei a me sentir insegura na minha maternidade.

E, principalmente, passei a sentir a dor dele em mim. Demorei a entender mas é óbvio: o Miguel está vivendo a primeira idade que eu lembro de ter, a primeira idade que consigo sentir na pele a dor que ele sente, a primeira vez que tenho memória física, emocional e afetiva e consigo me relacionar diretamente com o que ele sente. E lá fui eu de volta para a literatura materna-infantil-sei-lá-como-chama.

Foi aí que entendi que os 7 anos são mesmo uma idade onde os comportamentos mudam, o jeito de olhar o mundo e a maneira como eles se sentem já não é mais como foi na primeira infância. Aprender a ler, escrever, ganhar responsabilidades, é também aos 7 que a criança começa a experimentar o mundo com mais autonomia e menos através de pai e mãe —foi só esse ano que o Miguel começou a ficar sozinho nas festas infantis, por exemplo.

Não há jeitos de crescer sem doer, imagino eu. Não já jeitos de ganhar autonomia, responsabilidade e direitos sem ter medo. E foi só depois desse monte de pensamento randômico, de ficar repassando os últimos anos e culpando a pandemia que eu entendi realmente o que precisava fazer: estar disponível para esse turbilhão de emoções e novidades.

E, não à toa, foi nesse último ano entendi que eu gosto mesmo de ser mãe.eu Demorou 7 anos para eu ter certeza absoluta que amo ser mãe dos meus filhos justamente porque amo viver com esses outros seres humanos que estão aprendendo tudo, conhecendo tudo e que precisam de mim como margem, colo, carinho, amor e atenção. Foi só agora, nos 7 anos do Mig que entendi a função que eu tenho que cumprir e não dá para delegar: é ser o porto seguro dos meus filhos, garantir que eles tenham espaço para ser quem eles são e não quem eu gostaria que eles fossem. Um trabalho enorme, gigantesco e eterno de respeito e amor, de limite e liberdade. Mas olha, infinitamente melhor (e mais desafiador, admito) do que pareceu no primeiro ano de vida dos meninos, sinceramente.

A trabalheira exaustiva do início já passou-tá-passando e a nova fase do jogo, o novo desafio, apesar de infinitamente mais delicado e difícil, é muito mais interessante. Feliz Dia das Mães pra gente que descobre todo dia qual é a mãe que somos capazes de ser e qual a mãe nossos filhos precisam que sejamos.