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Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

'O Ultimato' consegue ser pior que 'Casamento às Cegas' (mas também vicia)

Em "O Ultimato: Ou Casa Ou Vaza", casais trocam de parceiros para testar o comprometimento com o relacionamento - Divulgação/Netflix
Em "O Ultimato: Ou Casa Ou Vaza", casais trocam de parceiros para testar o comprometimento com o relacionamento Imagem: Divulgação/Netflix

Colunista de Universa

12/04/2022 04h00

Os reality shows bizarros de relacionamento estão na moda. A primeira razão para isso é simples: eles dão audiência. E por quê? Pelo visto, porque os produtores de séries acharam um jeito de os tornar viciantes unindo suspense do estilo "quem vai acabar com quem" e muito sofrimento humano. Esse tipo de fórmula é extremamente viciante. E todos nós que maratonamos "Casamento às Cegas" (um programa onde as pessoas pedem em casamento pretendentes que nunca viram) sabemos disso.

Por isso, trago boas e más notícias ao mesmo tempo. Quem se viciou em "Casamento às Cegas" (sou uma dessas pessoas) e passou uma semana maratonando sofrimento de casal e DRs alheias (eu!) agora tem uma série ainda pior (e, ao mesmo tempo, melhor) para se viciar. Trata-se de "O Ultimato: Ou Casa ou Vaza", dos mesmos produtores do outro reality de casamentos da Netflix.

Lançado semana passada, o reality já está na lista dos mais vistos da plataforma de streaming mundo afora.

O enredo é, digamos, um tanto complexo: no novo programa, casais que estão em crise por causa do drama "um deles quer casar logo e o outro não" vão para um "experimento". Em uma casa junto com os outros casais na mesma situação, eles são convidados a se separar e paquerar os integrantes dos outros casais e ver se eles "batem" mais com outra pessoa.

É isso mesmo. A ideia é colocar o relacionamento à prova e tomar uma decisão definitiva de casar ou separar. Complicado, não?

Mas calma que piora. Segundo o enredo do reality, eles devem escolher uma pessoa que não é o seu par para uma experiência de casamento de três semanas. Depois, eles devem decidir se vão se casar com o parceiro com quem entraram no programa ou se vão namorar ou casar com essa outra pessoa. Sim. É bizarro.

Mas a ideia dos produtores parece ser criar várias confusões ao mesmo tempo, para que muitas lágrimas sejam roladas, muitas brigas aconteçam e nós, sedentos por sofrimento alheio, fiquemos dependentes do programa, mesmo sabendo que é uma porcaria.

Funciona. Logo no segundo episódio assistimos pessoas que são obrigadas a ver seus parceiros paquerando outros, enquanto eles fazem o mesmo. Alguns deles sofrem de verdade, alguns nem aguentam e deixam o programa.

Basicamente o programa mostra muita dor da rejeição, de ciúme e de perda. Todos aqueles sentimentos que detestamos sentir. Esse tipo de reality tem sido chamado pelos seus criadores de "experimentos". Mas que tipo de experimento é esse? Talvez o de testar o quanto nós, telespectadores, somos sadomasoquistas.

Sim, pois além de ver os outros sofrerem (uma forma de entretenimento desde quando pessoas eram jogadas aos leões), também sofremos vendo esse programa.

Afinal, todos nós já fomos rejeitados e já rejeitamos. Além disso, é impossível não pensar: "e se eu passasse por isso com meu namorado (ou marido, ou parceiro)?" Imaginar isso é assustador e angustiante. Mas como adoramos uma fofoca, insistimos.

Anel de noivado?

Além de mostrar que o sadomasoquismo anda em alta, o programa também reafirma outra tendência: o conservadorismo. Em tempos de lutas pelos direitos de pessoas não-binárias, de igualdade e luta pelos direitos LGBTQIA+, o programa exibe jovens de 20 e poucos anos que dizem coisas do tipo: "ele precisa colocar um anel no meu dedo" e homens que se ajoelham para pedir a mão da amada. Todos os casais do programa são heteronormativos.

É muito esquisito que em 2022, jovens mulheres ainda sonhem com anéis de noivado e pedidos de príncipes.

E mais estranho ainda é que a gente se vicie em reality sobre esse tema...