Freia e acelera

Chefe da Uber no Brasil vê empresa mais madura após crises, focada em segurança e no jeitinho brasileiro

Gabriel Francisco Ribeiro De Tilt, em São Paulo

Não há dúvidas de que a Uber mudou o mundo. Há seis anos, ninguém imaginava que seria uma coisa tão banal entrar no carro de um desconhecido que não fosse taxista. Ao mesmo tempo, a empresa chegou até aqui arrastando polêmicas: da falta de lucro, aos casos de violência envolvendo passageiros ou motoristas, passando pela discussão sobre a precariedade da relação de trabalho praticada com os "parceiros" até as mais recentes denúncias sobre uma antiga gestão, digamos, agressiva.

A atual chefona da Uber no Brasil chegou em fevereiro e passou os últimos sete meses tomando ciência dos desafios que a empresa tem para continuar relevante no longo prazo. Agora, em entrevista exclusiva ao Tilt, Claudia Woods conta um pouco que rumos decidiu dar para a startup no país, numa tentativa de responder aos questionamentos de motoristas, passageiros ou investidores.

Freia aqui, acelera ali

Para fugir das polêmicas, Woods explica: a Uber é uma empresa mais madura agora. De fato, a companhia tem passado por transformações aceleradas desde que o controverso chefão mundial Travis Kalanick saiu para dar lugar ao mais 'boa praça' Dara Khosrowshahi e, nos últimos tempos, tem pregado uma cultura interna diferente e focado em novidades 'good vibes'.

Ela ressalta que a companhia virou o que virou em apenas cinco anos, passou por algumas fases e agora precisa "começar a equilibrar as coisas". "Eu acho que cheguei em um momento em que já tinha passado o boom inicial. O desafio agora não é abrir mais cidades, mas manter o crescimento de forma sustentável. Estamos em um momento mais maduro", diz.

Para Woods, é hora de pisar no freio em alguns pontos e acelerar "sem limites" em outros. E aqui ela está falando de inovar no transporte público trazendo para a plataforma carros autônomos, carros voadores, patinetes, bicicletas e delivery... É a tal da "plataforma única e total" para a mobilidade que a Uber tem construído nos últimos anos.

Também faz parte desse novo posicionamento garantir que todos que usam o app, motoristas e passageiros, se sintam protegidos.

A ex-executiva do Banco Original, do Walmart e da Webmotors cita inclusive um dado curioso: todas as tecnologias relacionadas à segurança usadas no resto do mudo saem do centro de desenvolvimento daqui —por que, afinal, desse assunto a gente entende bem.

"Segurança permeia a cultura do Uber"

Quais serviços a Uber quer oferece

Rumo ao carro autônomo e voador

Tilt: A Uber é uma empresa que mudou até as relações humanas. O que podemos prever para os próximos 10 ou 15 anos? Ela pode continuar transformando a sociedade?

Claudia Woods: Vai continuar. Uma visão importante é a gente entender que a Uber não é mais uma empresa de ride sharing [compartilhamento de caronas], de aplicativo de transporte. Ela já é uma plataforma de vários tipos de empresas, todas relacionadas à locomoção do ponto A ao B. Às vezes de pessoas, de coisas, comida. Quando a gente olha para o presente, para a cidade de São Paulo, temos o Uber ride sharing, o Uber Eats [app de delivery de comida] e, em breve, teremos patinetes e bicicletas elétricas...

Tilt: Eu conversei no ano passado com o Ryan [Rzepecki], CEO da Jump [serviço de bicicletas elétricas compartilhadas da Uber], e ele me falou que até 2019 a empresa chegaria ao Brasil com patinetes e bicicletas. Por que não chegou ainda?

Claudia Woods: Chegará, ainda estamos em 2019. Aí já são três opções dentro de uma mesma plataforma.

Quando a gente olha para o futuro, o que enxergamos? Denver, onde já há integração com o transporte público e você consegue fazer um planejamento de rota levando em consideração carro, patinete, ônibus e metrô, até com integração de pagamento. Isso seria uma plataforma em um nível mais completo. Quando a gente olha além desse mercado mais óbvio, tem o Uber Freight [frete], que já é relevante no mundo da logística, mudando completamente a relação das empresas com suas frotas de transporte de carga.

E tem o tão sonhado carro voador. O Uber Air já é uma realidade, existem parcerias com empresas como Embraer e Boeing para começar o desenvolvimento desse hardware para a gente começar a pilotar em 2023. É o melhor exemplo de que a gente não tem limites. Mostra nossa ousadia, nossa busca pela inovação contínua. Essa plataforma não termina na patinete ou na bicicleta, ela vai cada vez mais além do esperado.

Tilt: No Brasil já existem conversas para usar o transporte público como em Denver? Já houve alguma tentativa disso, uma aproximação?

Claudia Woods: Apesar de ser uma empresa gigante que atua globalmente, no Brasil a gente atua no nível do município. Essas conversas com o Transit estão em andamento nesse nível. É até um dos nossos valores: "we build globally, but we act locally" ["construímos globalmente, mas agimos localmente"]. Não adianta pegar o produto que foi implementado em Denver e falar 'beleza, vamos implementar aqui em São Paulo, tá aqui'. Essas conversas estão em andamento.

Tilt: O que vem primeiro? O carro voador da Uber ou o carro autônomo?

Claudia Woods: É a pergunta de um milhão de dólares, reais, bitcoins, qualquer moeda que queira. Quando a gente fala de autônomo, a gente precisa reprogramar nosso cérebro para entender o que é isso. Não estamos falando dos 600 mil carros da plataforma virarem autônomos. A tendência é isso começar primeiro em um mercado de logística, com caminhões em estradas e rotas e ambientes muito previsíveis.

Pensamos muito no carro e na tecnologia, se está pronta. E aí ouvi um exemplo em uma palestra: o carro autônomo está na fila de buscar as crianças na escola. Chega a vez de pegar seu filho e a criança foi ao banheiro, não está no local naquele momento. O que ele faz? Espera e segura a fila inteira? Entende que tem que dar meia-volta? Ele sabe que vai voltar para o fim da fila? Tem um lado humano nisso.

Novo mantra é "maturidade"

Tilt: Como foi sua chegada à Uber, que na época estava prestes a abrir o capital? Rolou um choque?

Claudia Woods: Ah, rolou. Acho que, dada minha trajetória de ter participado de muitos projetos que começam e terminam ou crescem rápido e fecham, ser uma pessoa flexível e de fácil adaptação é minha maior virtude. A chegada aqui teve um lado chocante pelo tamanho e potência, ao mesmo tempo em que os lados de inovação, cultura, tecnologia e adrenalina foram uma coisa bem familiar. Cheguei alguns meses antes da abertura de capital, então fiquei muito feliz de participar desse marco. Acho que se eu tivesse chegado depois teria uma eterna sensação de 'ah, eu não estava lá nesse momento'.

Tilt: O que foi mais complicado nesses sete primeiros meses?

Claudia Woods: Estamos falando de uma empresa que tem o tamanho que tem, presente em múltiplos países —e com o Brasil já no top 2 do mundo. Quando você cresce em cinco anos e vira a empresa que é hoje, tem que começar a equilibrar essas coisas, uma demanda de crescimento com crescimento estruturado, o que às vezes é difícil.

Eu acho que cheguei num momento em que já tinha passado o boom inicial. O desafio agora não é abrir mais cidades, mas manter o crescimento de forma sustentável. Estamos em um momento mais maduro. A empresa obviamente nunca nasceu para ser de curto prazo, mas eu acho que os momentos trazem olhares diferentes. Você tem um momento inicial de crescimento, olha só para o crescimento, e chega um momento em que tem de equilibrar as duas linhas: manter o crescimento e ver a rentabilidade da empresa melhorando.

Tilt: Essa é uma mudança de perfil da empresa? A Uber queria crescer, crescer, crescer e agora está enorme. Chegou a hora de cuidar da casa, dos pequenos detalhes?

Claudia Woods: Não acho que é uma mudança de perfil. Sempre teve essa visão de longo prazo, de crescer de forma verdadeira e sustentável, só que as coisas vão chegando em fases de maturidade diferentes. As empresas passam por exercícios de priorização.

Talvez o que você possa perceber como diferença é porque hoje a gente começa a lançar coisas que são mais perceptíveis para quem está na ponta, para o cliente. Não estávamos preocupados em falar sobre isso, mas em construir e garantir. A gente aprendeu a fazer esse diálogo, a escutar e testar. Cada vez mais a parte de escutar está desenvolvida.

No começo, o que a gente fazia ninguém mais fazia no mundo. Existiu durante muito tempo um desafio de como fazer pesquisas com parceiros, eles nem sabiam como era trabalhar para plataformas como a nossa. Todas essas mudanças que aconteceram não só internas quanto no mercado trazem essa percepção de que a Uber mudou. Acho que na verdade o que mudou foi todo o entorno e a gente cresceu, ficou cada vez mais uma empresa mais madura.

Os números da Uber

Brasil: foco em segurança e escuta

Tilt: O Brasil é o segundo país com mais viagens da Uber no mundo. Imagino que, por isso, seja um dos grandes focos da matriz. Qual o próximo grande avanço da empresa por aqui?

Claudia Woods: O principal foco que a gente trouxe para o Brasil foi o da segurança. Temos um centro de desenvolvimento de tecnologia aqui, onde toda a inovação de segurança da Uber no mundo é construída. Ele já recebeu um investimento de R$ 250 milhões, é um time completo de engenheiros e de especialistas de produtos.

Quando a gente fala de segurança não é só uma função nova que lançou no aplicativo, mas educação de motorista parceiro, de passageiro, dos nossos times internos. A existência do centro de desenvolvimento é muito simbólica, porque representa o grande papel do Brasil no mundo da Uber. A inovação vai nascer aqui.

Mas não é só o centro de desenvolvimento, é um assunto que permeia a cultura. Esse é um lado muito curioso do negócio. É uma empresa que, apesar de estar dentro do rol das empresas de tecnologia, tem uma diferença que é estar na rua com as pessoas. Eu vim de Uber para cá de manhã, interagi com meu parceiro.

Quando a gente fala do Brasil, tem uma série de desafios: de trânsito, de crescimento para cidades que não têm muitas vezes nem infraestrutura de rede ou cultura digital... O app Uber Lite é o olhar de que nem todo mundo tem um iPhone ou o último lançamento da Samsung. Como a gente permeia cidades inteiras, em todos os níveis sociais, precisamos desse olhar. E o Brasil aporta isso para o mundo.

Tilt: Você comentou que veio para cá de Uber. Quando eu estava vindo para cá, meu motorista me perguntou se o pessoal que é dono da Uber andava nos carros. Então você realmente anda, pega opiniões... Mas não fala que é CEO, né?

Claudia Woods: Às vezes eu falo, principalmente para mulheres. O mais engraçado é que quando eu estava na Webmotors eu ia de bicicleta para o trabalho. Era um superproblema [risos]. Aí eu falava: 'não, mas eu vendi meu carro na Webmotors, por isso venho de bicicleta'.

Uma das coisas que está por trás do que a gente chama de nossa "experiência mágica" é o fato de que se você quiser entrar no carro e não falar com o motorista, está tudo bem. Ele não tem uma expectativa de que você vai entrar e ter uma conversa. Mas quando comecei aqui isso mudou completamente. Você usa o momento como aprendizado. Para entender como ele está, se está feliz ou não, o que achou do último recurso.

Tilt: Mas rola uma reação quando você fala 'eu sou a CEO da Uber'?

Claudia Woods: Eu nunca coloco dessa forma, porque acho que esse é um termo muito específico da nossa área de negócios. Mas eu às vezes tenho dúvida se eles acreditam ou não. Dizem 'não é possível, não pode ser'. Apesar de a gente estar ali dentro do rol das empresas de tecnologia do Vale do Silício, estamos falando de 600 mil motoristas espalhados pelo Brasil e interagindo com nosso produto todo dia, 22 milhões de pessoas pegaram Uber no mês passado. Não tem como você se esconder. Além de todos os desafios de operar uma plataforma tecnológica que a gente sabe que dá problema como todas as outras, a gente também tem que interagir com o mau humor das pessoas, trânsito na cidade...

Equilibrando motoristas e passageiros

Tilt: Antes de vir para a entrevista, eu pedi para motoristas mandarem perguntas para mim. Uma delas é: por que os requisitos para passageiros entrarem na plataforma são tão inferiores aos dos motoristas? Essa é uma reclamação antiga, por causa de assaltos e perfis falsos. Sei que a Uber fez parceria com o Serasa e tudo o mais, mas como está isso?

Claudia Woods: Segurança e checagem de identidade é um assunto contínuo de melhoria. A gente começou focando muito no lado do motorista. Por isso que a pergunta vem à tona: existia um período em que o rigor era diferente e hoje a gente já tem um processo de checagem de passageiro que está nessa evolução.

O lançamento mais recente foi o U-Check, que foi a parceria com Serasa, em que checamos uma série de dados desse passageiro para garantir que ele é quem ele diz que é e reduzir qualquer tipo de fraude. Até o fim do ano vamos lançar outras novidades nessa frente e ano que vem também. A mensagem mais importante, como normalmente é em qualquer tipo de fraude seja financeira ou identidade, é que isso não para nunca. Cada vez que você lança uma nova coisa precisa pensar na próxima.

Tilt: Como equilibrar requisitos para motoristas e passageiros?

Claudia Woods: Não adianta melhorar só a vida do motorista se não aportar novas funcionalidades no passageiro e vice-versa. Um exemplo é que lançamos neste ano um pedido antigo dos motoristas de saber o destino antes de aceitar a viagem [a Uber, na verdade, oferece uma região abrangente de destino, enquanto a 99 mostra o endereço]. É um excelente exemplo de como a Uber ainda trata inovação dentro de casa. É um ciclo de ouvir o que o motorista precisa, estudar esse pedido, pensar na melhor solução, fazer uma prévia do produto que muitas vezes é uma forma muito simples da solução definitiva. Então testamos isso em uma cidade, depois duas, depois três. E quando chegamos no modelo ideal, vai para todo o Brasil.

Já para o passageiro teve o lançamento do kit de segurança, que tem desde ligar para a polícia até uma série de funcionalidades em que o passageiro está cada vez mais conectado com formas de pedir ajuda. E também um trabalho muito forte de treinamento de motoristas.

Tilt: Uma outra pergunta enviada por motoristas foi sobre como é feito o cálculo para a taxa tirada da Uber em cada corrida. Até parei para reparar: fiz uma corrida que custou R$ 33. Disso, R$ 24 foi para o motorista. Hoje vim para cá e deu R$ 24, sendo R$ 21 para o motorista. Como é a taxa atual e como a tarifa dinâmica influencia?

Claudia Woods: O cálculo básico é tempo e distância. Pensa em uma cidade como São Paulo. Você está saindo da Vila Olímpia [área empresarial na zona sul] e pode ficar 15 minutos para andar um quarteirão. Imagine se nesse momento eu fosse remunerar meu parceiro considerando quilômetro. Ele ia rodar 200 metros e gastar 15 minutos do dia dele. Então esse cálculo que leva em consideração essas duas pontas para proteger os parceiros da dinâmica das cidades. Esse é o principal motivo de o valor variar tanto.

Motoristas são polêmicos: parceiros ou contratados?

Tilt: A Califórnia (EUA) aprovou recentemente a lei do AB-5, que dá alguns direitos trabalhistas para motoristas de aplicativo do tipo Uber, como pagamento de salários. Aqui no Brasil já existem decisões da Justiça que dizem que eles são prestadores de serviço, não contratados. Qual sua visão sobre isso?

Claudia Woods: O Brasil está num momento diferente. Tivemos mais de 200 casos na Justiça concluindo que o motorista é um microeempreendedor independente. Mais recentemente, o STJ [Superior Tribunal de Justiça] decidiu sobre isso.

O desafio maior é onde focar nossa energia e fazer com que um parceiro da Uber tenha benefícios. O melhor exemplo é o lançamento recente do Uber Pro, que é nosso programa de fidelidade de motoristas. Os benefícios aumentam quanto mais a pessoa dirige, mas até no nível de entrada já tem benefícios. Nosso foco está aí: usar essa plataforma para estruturar nossa relação com ele [parceiro], como um empreendedor independente.

Tilt: Mas você acha que esse termo 'economia de bico' ainda está correto? Talvez nos EUA, sim, mas no Brasil, com desemprego em alta, a gente vê motoristas trabalhando 12 horas por dia para ganhar R$ 300. Vira o emprego fixo deles, mas não deveria ser, né?

Claudia Woods: O perfil de quem é nosso parceiro varia muito. Tem mãe de família ganhando dinheiro extra enquanto os filhos estão na escola para comprar uma televisão, tem a pessoa que está desempregada e começa a dirigir enquanto procura outra coisa, e tem os que começam assim, acabam gostando e ficam na plataforma. É muito difícil fazer qualquer tipo de generalização e essa é a beleza desse tipo de relacionamento.

Quando a gente fala de 'gig economy', de Uber e outras empresas parecidas, a flexibilidade e a autonomia acabam sendo a chave de quem escolhe fazer essa atividade. Agora, claro que com o desemprego a 13% uma das coisas que me traz prazer no dia a dia é saber que estamos introduzindo uma opção para essas pessoas gerarem renda, seja duas horas por dia ou dez, o que elas acharem melhor.

Tilt: Nas minhas conversas com motoristas da Uber, uns que falam 'ah, eu não gostaria de ser registrado, prefiro assim', já outros dizem que seria bom ganhar uns benefícios. Têm dois perfis mesmo. Você acha que no futuro a Uber pode dar essas duas opções?

Claudia Woods: Acho que têm dois perfis. Eu durante anos queria ser empresária. Tive empresa própria, insisti nisso, e hoje virei uma funcionária corporativa. Isso é o ser humano, tem o que quer e o que não quer. E as pessoas acabam guiando suas escolhas de acordo com o seu perfil natural. No nosso formato, é difícil dizer qual será o futuro, somos uma empresa em constante evolução e seguiremos dessa forma.

As bagunçadas finanças da Uber

Andrew Kelly/Reuters

US$ 5 bilhões perdidos

Em agosto, a Uber divulgou seu balanço trimestral com um recorde de US$ 5,2 bilhões de prejuízo no período - a maioria relacionada a pagamentos de ações a seus funcionários depois do IPO. Há a expectativa de que o próximo balanço vire o jogo, mas até aqui a empresa nunca deu lucro.

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Levas de demissões

Tentando conter os seguintes prejuízos, a companhia passou a cortar custos em algumas áreas. Só no último mês de setembro foram demitidos mais de 400 funcionários no mundo das equipes de produto e engenharia, em uma segunda rodada de demissões neste ano.

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Ações em baixa

As ações da Uber foram abertas ao público já com um preço que decepcionou parte dos analistas e, mesmo assim, não mantiveram um bom desempenho. As vendas foram iniciadas a valores acima de US$ 40 em maio e, após poucos meses, já figuram abaixo dos US$ 30.

Lucro só a longo prazo

Tilt: A Uber tem a plataforma Movements, que compila dados de viagens para as cidades e são disponíveis de forma gratuita. Analistas dizem que para tornar a Uber lucrativa, esses dados coletados seriam o caminho. Futuramente pode ser uma coisa negociada?

Claudia Woods: Vou te responder de uma forma mais macro, com minha visão sobre dados. Cada vez mais eles serão limitados em seu uso. Tem todo um movimento de privacidade e proteção ao usuário, em que as empresas cada vez mais são obrigadas a usar esses dados só para suas próprias necessidades e desenvolvimento de produto interno. É difícil dizer. Estamos em um momento em que as novas normas estão sendo desenvolvidas para o Brasil e mundo inteiro —a Europa tem as mais avançadas. A gente vai ter que entender como isso fica e quais são as possibilidades para ver se isso vira um business ou não.

No caso da Movements, eu não tenho o menor interesse em rentabilizar isso. Meu interesse é estabelecer um elo de parceria e construção conjunta com as cidades. Quanto mais a gente melhorar a mobilidade da cidade, mais eu vou fazer dinheiro com meu negócio principal, que é locomover pessoas e coisas. O mais importante para nós é usar esses dados para desenvolver relações muito estreitas e ajudar as cidades no desafio de mobilidade, que não é só nosso, mas de todo mundo.

Tilt: Ainda nessa questão financeira, há uma expectativa de ganhos futuros para a Uber. Ela pode ser lucrativa no curto prazo ou só a longo prazo mesmo?

Claudia Woods: Lucratividade da Uber é uma coisa complexa. O que é a Uber? É desde o carro voador, o freight (serviço de frete) até o compartilhamento de corrida, que talvez seja o mais maduro e estabelecido. Então, nossa visão é de longo prazo. Temos cada negócio evoluindo no seu tempo, cada um com um objetivo diferente. Alguns são muito pesados em termos de pesquisa e desenvolvimento e têm uma trajetória diferente, mas quando pensamos em lucratividade pensamos em longo prazo. Seria quase irresponsável da nossa parte fazer um ganho de curto prazo. Como você constrói essa plataforma de forma sustentável sem visão de longo prazo?

Tilt: E a concorrência acirrada atrapalha a busca pelo lucro?

Claudia Woods: Concorrência sempre tem os dois lados. Parece uma resposta clichê de entrevista, mas a verdade é que a concorrência é boa. No nosso caso, o que a gente enxerga no Brasil é que a entrada de novos players trouxemos muito mais gente para o modelo. O poder de comunicação e impacto na população se multiplica. Não é só você falando de você, naturalmente surge uma comunicação da categoria. O que a gente tem como player mais consolidado e o primeiro a chegar é esse equilíbrio do nosso ecossistema.

O segredo do nosso negócio é ter um equilíbrio muito forte em demanda e oferta. Se nossa plataforma não tiver parceiros suficientes para que um carro chegue na sua casa em 3 ou 4 minutos, haverá um problema de entrega de serviço. Ser o primeiro e mais consolidado nos dá uma vantagem de ser o maior.

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