Especialista da ONU pede que países busquem tratado para cibervigilância
Por Tom Miles
GENEBRA (Reuters) - O mundo precisa de um tratado internacional para proteger a privacidade das pessoas de uma ciberfiscalização irrestrita, medida que vem sendo defendida por políticos populistas que fazem uso do medo do terrorismo, de acordo com relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgado nesta quarta-feira.
O documento, submetido ao Conselho de Direitos Humanos da ONU pelo especialista independente em privacidade, Joe Cannataci, diz que mecanismos tradicionais de proteção de privacidade, incluindo regras sobre grampos telefônicos, estão desatualizados na era digital.
"É hora de começar a recuperar o ciberespaço da ameaça da supervigilância", disse Cannataci ao Conselho.
Com os governos em todo o mundo exigindo dados de empresas como Microsoft, Google, Facebook, Apple e Twitter, não faz sentido depender inteiramente das salvaguardas jurídicas dos Estados Unidos, afirmou o especialista. Na avaliação dele, criar um "mandado internacional" para o acesso a dados ou vigilância unificaria os padrões globais.
"O que o mundo precisa não são mais manobras patrocinadas pelo Estado para Internet, e sim um acordo civilizado e racional sobre um comportamento apropriado do Estado no ciberespaço", disse Cannataci. "Isso não é utopia. É a fria e dura realidade."
O especialista foi nomeado "relator especial sobre direito a privacidade" em 2015, após o tumulto causado pelas revelações de Edward Snowden, ex-funcionário de segurança dos EUA, que havia trabalhado na missão do governo norte-americano em Genebra.
O relatório foi submetido na semana passada, antes da mais recente publicação por parte do Wikileaks do que seriam milhares de páginas de discussões internas da CIA sobre técnicas para grampear smartphones e outros dispositivos.
Os EUA não reagiram ao relatório de Cannataci, mas muitos países receberam bem o documento e concordaram que padrões para privacidade online devem ser tão rigorosos quanto para offline.
O representante chinês no Conselho da ONU afirmou que os rápidos avanços tecnológicos e o "drástico aumento em todo o mundo da violação de privacidade" indicam a urgência em melhorar os mecanismos de proteção. Já o diplomata russo avaliou o documento de Cannataci como "extremamente tópico".
Venezuela, Irã e Cuba também se mostraram favoráveis ao relatório e criticaram os esforços de vigilância internacional.
Conforme o especialista da ONU, um texto jurídico vem sendo discutido por ativistas e "algumas das maiores corporações internacionais" e deve ser publicado dentro de um ano. Cannataci ainda criticou em seu relatório a adoção de leis que comprometem a privacidade em nome do combate ao terrorismo.
"O medo impede o eleitorado de avaliar objetivamente a eficácia das medidas intrusivas à privacidade propostas", escreveu ele, citando a ordem executiva do presidente Donald Trump impondo restrições a imigrantes de seis países de maioria muçulmana: Irã, Líbia, Síria, Somália, Sudão e Iêmen.
"Tentar parecer rígido em segurança ao legitimizar medidas amplamente inúteis, muito caras e totalmente desproporcionais, que são intrusivas à privacidade de tantas pessoas - e outros direitos - certamente não é o caminho que os governos deveriam seguir", afirmou Cannataci.
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